
A Guerra dos Satélites é uma obra que mistura os gêneros de terror e ficção científica, dirigida pelo mestre do cinema B Roger Corman.
Lançado em 1958, esse é um filme que surfa na onda da corrida espacial, mostrando uma união de países que se vê obrigada a lidar com mensagens interplanetárias hostis, que tentam enquadrar a humanidade em um comportamento domesticado e restrito ao próprio planeta.
Para isso, a trama traz à tona uma versão da ONU - a Organização das Nações Unidas - que delibera a respeito do comunicado alienígena, que foi estabelecido a partir de um grupo de peças metálicas que caíram do espaço.
A história acompanha um grupo chamado de cientistas, que se intitulam grupo Sigma.
Esse é liderado por um cientista renomado, que tenta arrumar recursos para financiar uma saída do planeta, seguindo assim o ideal expansionista do país onde vive, os Estados Unidos.
Aqui ele mira ganhar o espaço e as estrelas, tal qual o país norte-americano fez com diversos dos territórios que fazem parte dos seus cinquenta estados, no entanto, como dito antes, as autoridades recebem um comunicado para não avançar.
Dirigido e produzido por Roger Corman, o longa-metragem tem argumento de Irving Block e Jack Rabin, roteiro de Lawrence L. Goldman, que assinava Lawrence Louis Goldman. Block e Rabin foram coprodutores
Concebido em cima de Sputnik
O filme foi concebido, filmado e lançado para explorar o buzz e o frenesi da mídia internacional em torno do satélite soviético Sputnik, o primeiro objeto desse tipo a ser enviado ao espaço.
Em outubro de 1957, a URSS surpreendeu o mundo com o lançamento do primeiro satélite artificial a orbitar a Terra, o Sputnik I.
Detalhes de produção
No momento histórico em que todos os jornais relatavam a propulsão do satélite e a vitória dos russos na corrida espacial (e na Guerra Fria, consequentemente) Corman teve sinal verde para um orçamento referente a um filme que estava financiando.
Recebeu o necessário à produção de seu longa e prometeu aos executivos que colocaria a obra nos cinemas em apenas doze semanas.
Parte do acordo era incluir a palavra “satélite” no título e quando ele conseguiu o tal cheque em seu nome, o fez mesmo não tendo escrito ainda uma linha do roteiro.
A questão dos satélites:
Como bem se sabe, satélites são corpos espaciais não tripulados.
São definidos como um corpo que orbita um planeta ou outro corpo celeste. Satélites podem ser naturais, como a Lua terrestre ou artificiais, como Sputnik ou como os satélites de comunicação e meteorológicos.
Normalmente são usados para transmissão de dados, navegação e observação da Terra.

Já no filme são apresentados de forma bem diferente, inclusive com passageiros dentro deles.
Não fica claro se optaram por isso por ignorância ou se só escolheram esse aspecto como uma desculpa para mostrar gente dentro de naves.
Satélite era uma palavra da moda, chamaria a atenção e a trama chamaria a atenção para esse aspecto. Até a espaçonave Sigma, que é mostrada na parte final do filme é chamada de satélite.
O foguete que os adolescentes descobrem com a mensagem alienígena - e que mencionam o Sputnik - também é chamado de satélite, mesmo claramente não sendo um.
A rápida estreia
A produção foi bastante célere. Entre o momento em que o longa-metragem foi idealizado, depois anunciado, rodado, editado e finalizado correram 8 semanas e não 12 como havia sido acordado.
A estreia em seu país natal foi no dia 18 de maio de 1958. Chegou em 1960 na maioria dos outros lugares. No México estreou em abril, na Argentina em agosto. Já no Peru só chegou em 1961 enquanto na Alemanha Ocidental chegou em 1963.
Nomenclatura
Tem poucas variações de nomenclatura. Sua alcunha original é War of the Satellites, na Argentina é Guerra de los satélites, na França é La Guerre des satellites, enquanto na Itália é Guerra dei satelliti. No Peru e Venezuela é La guerra de los satélites, já na Alemanha Ocidental é Planet der toten Seelen.

Os valores dos estúdios
Os estúdios Allied Artists Pictures e a Santa Cruz Productions Inc produziram o filme. A distribuição ficou com a Allied Artists Pictures nos Estados Unidos e da International Film Distributors no Canadá.
As companhias acabaram arrecadando muito dinheiro com publicidade gratuita graças a URSS, que através do avanço na exploração do espaço, acabou tornando termos relativos a espaço em palavras muito populares.
A falta de efeitos de gravidade:
Ao contrário do que normalmente ocorria em Space Operas ou em produções sci-fi, essa não se vale dos jargões do gênero, como os cuidados com a utilização do vácuo do espaço ou da falta de gravidade.
Os astronautas não sofrem os efeitos da saída da Terra quando a nave é lançada.
Eles apenas sentam em poltronas confortáveis de couro, sendo seguros apenas com um cinto de segurança em torno da cintura, que não servem nem para que eles não flutuem. A ideia aqui é protegê-los do esmagamento.
Os trajes espaciais são minimalistas, com vários zíperes. A comunicação interna dos astronautas ocorre por meio de microfones, acionados pressionando o colarinho.
Tal qual ocorreu com séries de Jornada nas Estrelas, esse antecipou uma série de tecnologias de comunicação.
O visual é bastante criativo e classudo, a arquitetura é bonita, os figurinos são legais, tão diferenciados que parecem ter inspirado obras como Planeta dos Vampiros, a ficção científica/terror de Mario Bava que foi uma das fontes de inspiração de Alien: O Oitavo Passageiro.

Quem Fez:
Corman dirigiu O Destino de um Gângster, Um Balde de Sangue, O Dia do Fim do Mundo, A Loja dos Horrores, O Solar Maldito, O Homem dos Olhos de Raio-X. O Insaciável Marquês de Sade onde não é creditado, além de Frankenstein: O Monstro das Trevas.
Produziu Os Devoradores de Cérebro, também participou da produção de A Pequena Loja dos Horrores, Carnossauro entre outros. Fez aparições breves em filmes famosos, como O Poderoso Chefão Parte II e O Silêncio dos Inocentes.
Rabin escreveu Mulheres-Gato da Lua, Minha Noiva é um Colosso e O Submarino Atômico, trabalhou nos efeitos de filmes como O Mensageiro do Diabo e O Grande Golpe.
Goldman escreveu Kronos, O Monstro do Espaço, além de seriados como Rawhide, Perry Mason e O Fugitivo.
Block escreveu Planeta Proibido, Kronos, Minha Noiva é um Colosso. Também trabalhou com efeitos visuais, em obras como Da Terra à Lua, Um Mundo Desconhecido, Voando para Marte e 3000 Anos Depois de Cristo.
O tamanho dos satélites:
O filme hoje é considerado infame graças a manobra de chamar qualquer veículo espacial de satélite.
Ele é visto dessa forma também graças ao fato de que Corman exagerou no tamanho dos corpos celestes.
Para aumentar a sensação de grandiosidade dos satélites, ele encenou cenas de perseguição no interior da nave Sigma, de forma que os cômodos e corredores parecem intermináveis.
Conseguiu isso filmando Dick Miller (ator que um parceiro contumaz de Corman) percorrendo alguns cenários em sequência, reconfigurando o piso e as paredes depois, colocando mudanças ligeiras para parecerem outras partes do veículo.

Corman editou as filmagens juntas para fazer parecer como se Miller estivesse passando por um labirinto enorme.
Os painéis e o design da nave
O painel de controle com interruptores de comutação utilizados pelo controlador de solo (personagem interpretado pelo próprio Corman) e pela tripulação é o piloto automático de um bombardeiro da II Guerra Mundial B-17.
Ainda sobre o design e qualidades da nave espacial do Project Sigma, foi reutilizada em várias produções do Irwin Allen, incluindo Perdidos no Espaço e Túnel do Tempo.
Narrativa
A exibição começa após um anúncio de censura, do British Board.
Antes de aparecer as cenas de fato, se nota uma música alta, conduzida por Walter Greene. Se destacam os metais, que anunciam o início da trama de uma maneira sensacionalista.
Não demora a aparecer uma reunião de engravatados, com homens conversando em um lugar que aparenta ser uma base do governo.
Eles observam uma movimentação no espaço, são 6 homens e uma mulher, entre eles.
As pessoas estão nervosas, se destacando ali Dave Boyer, personagem de Miller, o reclamão sr. LeMoine (Bruno VeSota, o cineasta que fez Os Devoradores de Cerebros) o crédulo sr. Akad (Michael Fox) e o cientista e doutor Pol Van Ponder, o brilhante e inspirador personagem de Richard Devon.
O possível engavetamento do projeto
Desde o primeiro momento fica claro que a operação do doutor Van Pont é muito custosa e cara.
LeMoine não acredita que as pessoas que estão no satélite sobreviverão e ele não está errado, já que ele explode, como todos os anteriores.
Esse e o décimo teste com satélite.
Os fragmentos encontrados
Em outro ponto de cenário, os adolescentes com hormônios borbulhando Jay e Mitz (Jay Sayer e Mitzi McCall respectivamente) acham um objeto na floresta, que parece um míssil.
Em um primeiro momento, fica a sensação de que aquilo pode ser um fragmento do satélite Sigma, mas não, é algo completamente diferente.

Um dos fatores que mais chama a atenção é que claramente os jovens não tem idade juvenil. Além disso, há uma mensagem que eles leem, cuja frase inicial é Asnasiunum unitum planetae.
Apesar do filme citar que a carta está escrita em latim, esses termos não são exatamente da língua morta que originou o espanhol, português e italiano.
Ainda assim a mensagem contém palavras latinas, que se traduzidas, seria algo como União de Planetas.
Na sala das Nações Unidas
Em uma sala secreta de reunião, que parece a sede da ONU (Organização das Nações Unidas) com o representante de vários governos, inclusive com gente da presidência dos Estados Unidos presente, ocorre uma reunião extraordinária, de emergência.
Eventualmente, até o próprio comandante em chefe aparece, feito por Roy Gordon.
Além desses, aparece uma bela mulher, a especialista e auxiliar do doutor Sybil Carrington (Susan Cabot) que é parte do Sigma.
Ela lê um recado educado, porém hostil, dos mestres da nebulosa espiral Ghana. No comunicado, dizem para os terráqueos não lançarem nada no espaço, ainda assumem que as tentativas de explorar o exterior do planeta deram errado graças a eles, que frustraram lançamentos propositalmente, mesmo que a técnica humana fosse rudimentar e de baixo perigo para eles.
Os políticos se dividem, ao ter ciência do tal aviso. Há quem defenda recuar, por conta do dinheiro e das ameaças, há quem retruque, achando que o projeto de expansão deve continuar.
Nessa defesa, aparece Van Ponder, que cita que os homens não são uma praga, como a carta tenta fazer acreditar. Ele diz que o projeto Sigma seguirá em frente, independente de recados externos.
Para ir na direção do avanço espacial, ele ousa.
Decide se colocar como cobaia, como comandante de uma expedição que reuniria ele, Dave e Sybil, além de outros alistados. Dave e Sybil se propõe a ir com ele em um sinal de gratidão.
Os anúncios nos jornais
A decisão de Van Ponder invade o noticiário, nas capas de jornais se anuncia que a tal mensagem em latim era falsa.
A imprensa também cita que o Projeto sigma foi aprovado e que o chamado Plano de Hotchikiss recebeu ok do setor de segurança.
Hotchikiss ou Hotch é o financiador do projeto, vivido por Robert Shayne. Ele liga para dr Van, avisando que o projeto deverá ser embargado, na reunião entre políticos.
O sujeito decide então dirigir rumo o local de reunião das Nações Unidas, para tentar impedir a moção da verba do projeto, mas sofre com uma estranha interferência, no caminho para o seu destino.
Uma luz vem do céu, causa um acidente de carro que dificilmente teria uma sobrevivente, ainda mais se o motorista fosse humano.
O roubo dos efeitos sonoros
Os efeitos sonoros utilizados durante essa cena (mais tarde, reprisados na comunicação das criaturas) são os mesmos utilizados em A Guerra dos Mundos, a versão de 1953.
Seria um duplo:
Na reunião, chegam a anunciar a morte do cientista, mas ele então surge no fórum de pé, calado e estranho, mas vivo.
Não parece ser surpresa que Van Ponder não é o mesmo cientista antes mostrado em tela. Não há qualquer tentativa da parte da trama de disfarçar que ele foi substituído.
Vale lembrar que esse é um filme B, dos anos 1950. Sutilezas não eram uma prache nesse tipo de produção.
Qual não é a surpresa quando após conversar com Hotch, o doutor simplesmente se despede, para fazer gráficos. Uma vez que está sozinho, ele se duplica, tendo dois corpos iguais, um do lado do outro.
Os poderes:
A extensão dos poderes dessa versão de Van Ponder jamais é explicada. Claramente Corman e sua equipe não pensaram em uma explicação plausível, mas a falta de resposta ajuda a melhorar o mistério.
As forças de Ghana seguem dando sinais para a humanidade não avançar.
Seja lá o que for Van Ponder, parece ir na contramão do que querem os seres de fora da Terra. Ao menos é assim, até esse momento.
O discurso de Boyer
Dave então faz um discurso surpresa, defendendo uma não rendição.
Sua fala é boa, mira o espirito norte-americano estadunidense, de jamais desistir e de repetir clichês e jargões.
Dessa forma ele motiva a todos, convence as pessoas que precisavam entender a ideia da expedição.
Esse ponto trama serviu bem ao ideal simbólico dos Estados Unidos, é uma boa visão de como é o comportamento intervencionista dos egressos norte-americanos.
Dave é como seus pares. Apesar de parecer alguém bonzinho, em não restando lugares no mapa terreno para ocupar, resta agora apenas no espaço.
Maçarico:
Em determinado momento da pesquisa pré-lançamento, um jovem cientista chamado John (Jered Barclay) chama Van Ponder para ver os resultados de alguns laudos químicos.
Como é inexperiente, acaba acidentalmente deixando um aparelho de chamas ligado. O doutor não percebe e a chama pega sua mão direita.

A medida que ela escurece, John se desespera e corre para chamar ajuda. Quando volta, Ponder já sarou o membro, esfregando a outra mão até ficar clara e boa de novo.
O personagem faz tudo isso calma e friamente, sem exaspero. Já o cientista, sem provas do que ocorreu, é afastado brevemente, por stress, mas ele entende que algo está errado e que Ponder não é quem diz ser.
Também é curioso, que nesse momento, Dave vai atrás de respostas, inclusive no ferro velho, onde encontra a placa do carro de seu chefe.
Ou seja, o acidente não era uma mentira. O texto é bem óbvio e conveniente nesse ponto.
Na missão:
Durante a missão, não demora até que Van Ponde se revele. Quando faz isso é munido de um grande senso de ironia, debochando do mesmo John que foi prejudicado por ele.
A criatura parece ter senso de humor. Ela diz ser além do humano. Seu discurso se torna igual aos membros da união de planetas.
Diz que os humanos não devem subir, já que são crianças em um campo se adultos. Sua missão é acabar com o projeto Sigma, ou seja, ele é sim um infiltrado de Ghana, um agente duplo, que brincava de fingir algumas intenções, a fim de cumprir os seus intentos.
Ele fez parecer estar do lado oposto dos extraterrenos, como se fosse uma terceira via, um terceiro tipo de alinhamento, só para ludibriar os humanos.
As brigas
Depois de se livrar do corpo de John, o capitão/doutor tem algumas crises. Aparentemente, seu disfarce está para a acabar, ainda assim, ele usa sua aparência para seduzir a menina Sybil.
Mesmo que o equivalente ao capitão consiga tomar a nave, ainda há resistência,
Dave tenta combater ele. Acaba não sendo transformado e ainda cerca o doppelganger de seu antigo mentor de maneira estratégica, mesmo sendo menos forte que o alien.

Os quinze minutos finais viram um jogo de caça, tal qual gato e rato, onde a equipe tenta contra-atacar a intenção maligna do inimigo.
Esse momento é bastante inspirado. Há elementos de perseguição do ser monstruoso, como no clichê do slasher espacial Alien de Ridley Scott e um pouco da paranoia típica do horror sci-fi O Enigma de Outro Mundo de 1982.
Na questão da dubiedade e paranoia esse parece ser uma maior inspiração para John Carpenter até se comparado a O Monstro do Ártico, obra lançada 7 anos antes, em 1951, mas que não carrega em si a mesma carga de desconfiança e duplicidade que essa possui.
Problemas com a pesquisa sobre viagens para o espaço
Na briga entre os personagens, Dave atira.
A falta de pesquisa é observada nesse ponto, já que se fosse em uma nave real, jamais poderia, destruiria o módulo, despressurizando. Há uma clara ausência de conhecimento sobre como funciona uma viagem espacial, especialmente quando o personagem principal "salva" a sua colega, colocando-a em uma poltrona, para aguentar o impacto, completamente mal amarrada.
É tudo bem simples.
Vale lembrar que alguns escritos clássicos, como os de Julio Verne, mostravam personagens viajando para o espaço no exterior das naves, sem morrer.
Esses deslizes eram comuns em clássicos de ficção científica e não uma exclusividade nas obras de Corman.
A colisão e o final dúbio
A colisão é iminente, os pilotos seguem o plano do capitão, rumo a combustão e explosão do veículo, enquanto Dave corre pelo interior tentando achar Sybil.
No entanto, é sinalizado que ela também se tornou agente dos alienígenas, já que teve contato com Van Ponder antes dele se desintegrar, em cenas de efeitos especiais bem tacanhos, mas que funcionam, mostrando em tela que algo estranho ocorreu.
A Sigma passa, atravessa a linha de Andrômeda, tendo o universo como a sua fronteira.
A humanidade conseguiu entrar no espaço, mas não sem algumas incertezas.
A Guerra dos Satélites surpreende por ser bem construído em matéria de roteiro e trama. É uma boa demonstração do cinema inventivo e especulativo de Corman, com cenários maiores que os que costumava fazer, mas com igual oportunismo temporal, aspecto esse que caracterizaria toda a carreira do cineasta e que é bem demonstrado aqui.