Crítica: Ajuste de Contas

21054485_20131031194312073.jpg-r_640_600-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxxBalboa x LaMotta

Assumo ter certa afeição pelas comédias escapistas do cineasta Peter Segal, pois, de alguma forma, além de entreterem, provocam sensações de conforto e bem-estar. Ora com o inusitado e divertidíssimo Tratamento de Choque, que trouxe Jack Nicholson no papel de um psicólogo maluco, ora com o encantador e apaixonante Como se Fosse a Primeira Vez, detentor de uma situação realmente curiosa; ou até mesmo com a distinta refilmagem Golpe Baixo, um dos poucos trabalhos de Adam Sandler, dentro do gênero, que se pode dizer eficiente, abrindo ainda margem para um arco dramático.

Por isso, quando soube que o diretor estaria envolvido num projeto que traria duas lendas vivas, como Sylvester Stallone e Robert De Niro, para uma luta de Boxe – esporte que foi plano de fundo dos respectivos clássicos Rocky - Um Lutador e Touro Indomável, obras que consagraram ambos os atores –, obviamente recheado de humor, fiquei curioso pelo resultado.

Com um roteiro assumidamente simplório, assinado pela dupla Tim Kelleher e Rodney Rothman, a fita tem como principal objetivo homenagear, ainda em vida, esses figurões que já estão marcados na história da sétima arte, com sombras de seus personagens mais icônicos. Henry 'Razor' Sharp (Stallone) e Billy 'The Kid' McDonnen (De Niro) são boxeadores rivais aposentados, que recebem uma proposta tentadora do aproveitador Dante Slate, Jr. (Kevin Hart – uma espécie de Chris Tucker sem graça), para uma última luta que promete definir quem será o verdadeiro campeão. Para isso, terão que entrar em forma e recuperar algo mais que o próprio vigor físico: sua autoestima.

As inúmeras homenagens começam a ser claramente expostas quando vemos suas atuais profissões após o afastamento do esporte: enquanto Razor é um lutador da vida real, que tem um emprego industrial ralé, e está sempre preocupado em não ser demitido; Kid curte sua aposentadoria fazendo talk shows decadentes em bares, sem ter um mínimo reconhecimento pelo que era. Uma óbvia alusão de Balboa e LaMotta, quando mais velhos. Ou mesmo em suas personalidades: um é consciente e tranquilo, o outro é cafajeste e entojado. Então, no treinamento: onde um é comandado por um velho, toma gemada, corre pelas ruas e bate em carnes; e outro tem um rígido treinamento de academia e parece mais duro em sua pegada.

Numa análise mais seca, é notável que o primeiro ato seja, de fato, terrível e não consiga prender, de pronto, a atenção do espectador. As gags são péssimas e a trama não atrai interesse. Porém, com o tempo, os protagonistas vão sendo aprofundados e começamos a nos aperfeiçoar e sentir, mais um pouco, o drama hodierno de cada um. Sacadas de humor começam a surgir e, sem que percebamos, somos finalmente fisgados. Talvez, Segal, erroneamente, tenha quisto passar esse aspecto morno, no intuito que pudéssemos ver, de perto, suas vidas. Todavia, ao fim do segundo ato, o que era indigesto torna-se orgânico, a história, aos poucos, vai ganhando tons mais instigantes e conquistando a plateia.

Na medida que o longa avança, vamos colhendo os amontoados de referências em relação à carreira dos atores, que parecem se divertir muito com tudo aquilo. Sly, com um físico de dar inveja a qualquer garoto, engendra sua atuação habitual, repleta de sutilezas e olhares. Assim como De Niro confere um ar biltre e ao mesmo adorável. O ponto negativo do elenco está mesmo em Hart, que por muito improvisar, com estilo extremamente caricato, parece nunca acertar e aparenta ser sempre uma figura de humor artificial. O que não podemos falar a respeito de Kim Basinger, que encanta e impressiona com sua Sally, a personagem mais humana do conto.

Assim, mesmo não sendo um grande filme, Ajuste de Contas cumpre bem sua tarefa de entreter e realizar um tributo deveras regular para com seus protagonistas. Provavelmente não será lembrado como as muitas obras destes já citados, mas fará muitos fãs recordarem de grandes momentos marcantes. Sinto-me afortunado por poder presenciar, contemporaneamente, os últimos trabalhos desses homens que marcaram uma geração e tornaram-se referências eternas. Vida longa a essas feras!

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