Assalto ao 13º DP é uma produção histórica pelo simples fato de ter chegado ao cinema. Conhecido por ser o primeiro longa-metragem sério dirigido por John Carpenter, o filme acabou sendo um marco do cinema independente, uma vez que foi feito com um orçamento baixíssimo e também por lidar com temas marginais.
Lançado em 1976, a trama gira em torno de uma delegacia que é atacada por um grupo de jovens arruaceiros, nas ruas de uma Los Angeles quase sem lei. É dito largamente que essa é a homenagem do cineasta ao western Onde Começa o Inferno, clássico de Howard Hawks, e boa parte da sua estrutura coincide de fato com os arquétipos de filmes de faroeste.
Esse é um grande esforço do seu realizador que além de assinar direção, texto, composição da música, ainda editou, fez os storyboards e até atuou em um papel pequeno e não creditado.
Essa era uma época anterior aos grandes sucessos de sua carreira como Halloween e Fuga de Nova York. Após ter lançado a comédia espacial Dark Star, Carpenter passou a trabalhar em dois textos, Assault (que depois evoluiria para Assault in 13 DP, que foi o nome no idioma original), e outro produto, chamado apenas de Eyes.
Ambos seriam produções de baixo orçamento, conduzidos pelo próprio, e com financiamento de J. Stein Kaplan. Carpenter então revisou Assault, modificou algumas coisas, e vendeu Eyes para Barbra Streisand e Jon Peters, mais tarde renomeado como Os Olhos de Laura Mars (aka Eyes of Laura Mars), então, Kaplan e o produtor Joseph Kaufman se concentraram em produzir esse thriller policial.
Reza a lenda que quem financiou a produção, foram os pais de Kaufman e Kaplan, e esse esforço ajudou a dupla a formar a CKK Corporation. De qualquer forma, o valor foi ridiculamente pequeno, em torno de 100 mil dólares, aproximadamente.
A gênese do futuro clubinho de Carpenter já estava aqui, uma vez que haviam alguns profissionais que acompanhariam ele ao longo do tempo, como Debra Hill, que escreveu e produziu com ele alguns filmes como Halloween e Bruma Assassina, e aqui foi supervisora do roteiro e assistente de edição.
A trama se passa basicamente em um dia, vindo do início da madrugada de sábado, as 3:10, passando pelo amanhecer, terminando na noite. A trama quase inteira se passa no gueto de Anderson, Califórnia. É nesse lugar em que a delegacia do 13º distrito, que está prestes a ser fechada, se localiza.
Ainda na introdução ocorre uma cena de tiroteio bem teatral, com a câmera cortando a cabeça do atirador que usa escopeta, e que assassinou seis rapazes.
Ali perto, jovens de 30 poucos anos, membros de gangues, se cortam e jogam sangue em uma bacia, estabelecendo visualmente que tem um pacto. Curiosamente não se explica exatamente o que eles combinaram.
A música dos créditos iniciais lembra a trilha de games de porrada da era 32 bits. A estética empregada por Carpenter guardaria ainda semelhanças com outras produções que também inspiraram os games onde os personagens basicamente andam e batem (Beat'n Up) a saber Os Selvagens da Noite e Ruas de Fogo, ambos dirigidos por Walter Hill, fora evidentemente filmes que referenciavam gangsteres latinos, como Scarface e Pagamento Final, de Brian De Palma.
Curiosamente, entre os filmes citados o mais velho é Warriors, de 1979, ou seja, todos eles são mais novos que esse. Possivelmente Carpenter ajudou a formar parte do ideal visual dessas produções, especialmente graças ao trajar estiloso dos bandidos. O banditismo peculiar dessa obra seria reprisado e referenciado no futuro Fuga de Nova York, mas de um modo ainda mais caricatural, claro, já que se passaria num futuro pós-apocalíptico.
O protagonista do filme é o tenente Bishop, um sujeito comum, que acorda de manhã e vai ao seu trabalho como agente policial. Interpretado por Austin Stoker, ele vai ao serviço esperando já não ter muita agitação ao longo do dia, dado o tédio que foram seus últimos momentos.
Parte da natureza do seu trabalho é enxugar gelo, já que ele quase não faz nada, e no meio do dia, é convidado a assumir a 13ªDP, que será desativada nas próximas horas.
Mesmo a contragosto, ele vai até o local, e lá recebe o auxílio da auxiliar Leigh (Laurie Zimmer), e da telefonista Julie (Nancy Loomis ou Nancy Kies), e elas avisam que as linhas de telefone serão cortadas, na parte da noite.
Em paralelo com a missão ingrata de Bishop, corre o transporte de um criminoso, no caso, Napoleon Wilson (Darwin Joston), que é escoltado pelo oficial Staker (Charles Cyphers), para Cenola, onde será executado. Junto a ele há outros presos, que apesar de ter um comportamento suspeito, vão obedientemente rumo ao seu novo local de cárcere.
Graças a uma infeliz coincidência, os destinos do ônibus de transporte, do policial citado e da tal gangue, se cruzam, e claramente é só o acaso mesmo, a entropia que faz essas pessoas completamente diversas se cruzarem. Um dos rapazes transportados passa mal, e a viatura tem que parar o mais rápido possível, para socorrer o sujeito, e isso ocorre justamente perto da delegacia de Anderson.
Pouco antes, o bando criminoso liderado por White Warlord (Frank Doubleday), que assassina a sangue frio um sorveteiro e uma menininha. White utiliza uma arma estilosa, uma handgun Mauser C96 semi-automática, e não fica muito claro o motivo dele pegar o sujeito.
Possivelmente ele só fez isso porque achou que podia, por acreditar na impunidade e também pelo pacto entre eles, cujo conteúdo não foi dito para o espectador.
Não fica claro se há ligação com a cena de introdução, ou se foram eles que mataram gente, o que é patente é que a violência não é um tabu para White e seus amigos.
Depois de trocas de tiros, mortes inesperadas e uma tentativa de fuga do sujeito que acerta as contas com o líder dos contraventores, o grupo de marginais vai até a delegacia, para acertar as contas com o sujeito que deixou a organização acéfala, e faz um cerco ali.
Essa sequência é esquisita até de descrever, e é tensa, uma vez que vai de zero a cem em instantes. De carros do lado de fora, eles atiram em quem está na fachada, meio a esmo, e como disparam com silenciadores, o ataque se torna algo meio escondido dos policiais distantes da 13ª.
Para quem está de fora, nada está ocorrendo.
O roteiro brinca o tempo todo com elementos que se aproximam de clichês, mas que por não concretizarem seus chavões, acabam sendo pervertidos. As conclusões mais fáceis para esse tipo de história parecem ser deliberadamente dribladas e ignoradas.
A artimanha de um prisioneiro doente é um velho plano de fuga, que não resulta em nada aqui, de fato o personagem passa mal e é uma coincidência que ocorra isso perto de Anderson.
Outra oportunidade de abraçar arquétipos seria associar Wilson, que está no corredor da morte a tal gangue invasora, mas isso não prospera, ao contrário, já que ele se une a Bishop para enfrentar essas pessoas, ganhando então espaço para se redimir, se tornando um quase mocinho.
O filme possui então uma fórmula própria e que seria reutilizada algumas vezes tanto em fitas de horror quanto policiais.
A cena do tiroteio na delegacia é ao mesmo tempo simples e tensa. A espera dos protagonistas por entender como e porque estão sendo alvejados é assustadora, assim como os sons dos tiros, que tem seu volume diminuído graças aos instrumentos abafadores de ruído.
O tom grave e os vidros quebrando geram uma sensação atroz de terror e desesperança, que só aumenta à medida que não fica clara a intenção do bando, que ao longo do ataque, só aumenta.
Para os que estão cercados, há poucas vantagens. Eles estão sem luz, sem gente, sem comunicação e tem que se unir e fazer da delegacia uma fortaleza.
Os opositores recolhem seus cadáveres, agem de maneira silenciosa, fazem sumir os corpos de maneira quase espiritual. Há bastante semelhanças entre esse e Bruma Assassina, não só no horror de confinamento, mas também na inspiração fantasmagórica por parte dos vilões, que somem e se dissipam no vento.
Outra sequência que não tem nada demais do ponto de vista da realidade, mas que guarda semelhança com filmes de horror é a batalha que ocorre próximo do minuto 85, entre os defensores da delegacia e os invasores, em uma área de vulnerabilidade subterrânea do local.
Bishop e Wilson fazem uma barricada, e lutam por cima de um muro improvisado, com machados, ferramentas e o que conseguem carregar em mãos. Somente um dos sobreviventes tem uma espingarda, que ainda assim, possui um limitado número de projéteis.
Esse trecho lembra as encarniçadas batalhas entre os sobreviventes humanos e os mortos vivos das produções que George A. Romero conduziu por essa época.
Curiosamente, nessa época só havia sido lançado A Noite dos Mortos Vivos, em 1968. Possivelmente o longa de Carpenter influiu em O Despertar dos Mortos, que é de 1978, e até na cinessérie italiana Zombie, de Lúcio Fulci, iniciada em 1979, e que buscava ser uma sequência do Dawn of the Dead original.
Assalto a 13 DP é tenso, assustador e assertivo por conseguir lidar bem com a quebra de estereótipos e com a união entre pessoas bem diferentes entre si. Dado seu orçamento, é louvável o que Carpenter e sua equipe fizeram, especialmente pela referência que se tornou e por ter ensinado o diretor como fazer produções com custo ridiculamente pequeno.
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