Joe Hill é um escritor que se notabilizou dentro do gênero do terror e horror independentemente de ser filho de quem é. A busca dele enquanto romancista e contista sempre foi a de encontrar o seu próprio caminho, tanto que abdicou do nome famoso de seu progenitor, utilizando o sobrenome da mãe.
Eis que foi anunciado que Scott Derrickson, diretor de A Entidade, O Exorcismo de Emily Rose e Hellraiser: Inferno traduziria em tela Telefone Preto, uma de suas histórias curtas mais famosas, e que não por acaso, guarda semelhanças com algumas das histórias de Stephen King.
O Telefone Preto é curto e grosso, mostra a história de Finney, um garoto que estava com seu pai em um mercadinho, aguardando ele do lado de fora, mesmo com o frio congelante que fazia ali.
A partir daqui haverá spoilers do conto. Avisados estão:
De longe ele observa um homem grotescamente obeso (essa é a descrição presente na tradução brasileira) tentando colocar as compras que fez na parte de sua van. Depois de debochar do senhor, ele decide ajudar o sujeito e acaba sendo raptado pelo mesmo.
A história foi publicada em duas compilações brasileiras, a mesma que está na capa desse post chamada O Telefone Preto e Outras Histórias e Fantasmas do Século XX. Na gringa foi publicado na revista The Third Alternative #39, em 2004.
Hill brinca com a condição de castigo pelo menosprezo, colocando seu protagonista infantil como alguém esperto o suficiente para ficar de olho no noticiário, que dava conta de vários raptos, e ingênuo o suficiente para ser ludibriado por um sujeito que não tem muito o que oferecer enquanto vilão sedutor, a não ser balões de cor negra.
O “vilão” é conhecido popularmente como O Gatuno de Galesburg e de perto, ele não é tão assustador quanto os noticiários faziam parecer. Ainda assim há um trabalho no texto para equilibrar a condição patética dele com a aura de um predador de gente “inocente”, que usa até substâncias para dopar suas vítimas na hora da captura, com uma espuma branca e tóxica que obviamente, derruba o menino.
A droga foi tão forte que impressão de Finney é que ele caiu direto no porão onde ficaria preso. O rapaz tinha ciência do perigo do Gatuno, até conhecia um dos desaparecidos, um colega seu do time de baseball, Bruce Yamada, mas ele se achava imune a esse perigo, já que tinha 13 anos pensava-se velho demais para ser capturado.
No cômodo onde Finney está, não há nada que possa ser utilizado como forma de ataque ao raptor. Há sim um telefone preto que segundo Al (nome pelo qual o Gatuno manda Finney chama-lo) não funciona, embora o sujeito já tenha tido a impressão de que ele tocou, provavelmente por conta de um pico de luz. O objeto está quebrado desde que ele era menino.
O quarto tem isolamento acústico, não importa o barulho que for não será ouvido, e o protagonista, mesmo com receio de morrer, consegue apelidar o lugar de “compartilhamento submarino”. Essa é uma das diferenças cabais entre as versões, já que o Finney literário é mais seguro, mesmo quando o imponderável acontece. Quando o telefone toca ele segue um plano de fuga bem pensado e bem engendrado. Quase dá para chama-lo de prodígio.
Outra boa diferença é que o raptor dá mais sinais de ser um abusador pedófilo, ratificando algumas vezes que o rapaz não fará "nada que ele não queira", dando ao menino a chance de escolher se entregar para o que quer que ele proponha. Diante disso, a possibilidade de violação sexual é bem mais assustadora que qualquer interferência sobrenatural.
Por ser uma história curta não há muito aprofundamento dos personagens, e as lacunas deixadas por Hill favorecem o conto, já que o leitor é quem preenche alguns dos detalhes que não são dados, entre eles, a possibilidade se Susannah, a irmã do rapaz, estar buscando ele, já que ela é metida a esotérica, e acha que tem poderes psíquicos.
A sequência final é eletrizante, mostrando personagens interagindo com Finney, enquanto ele põe em prática seu plano de golpear o sujeito com o telefone, aproveitando que é fisicamente mais atlético que o sequestrador. É curioso como há algumas semelhanças do rapaz com Paul Sheldon, protagonista de Louca Obsessão, tanto no sentido de ser dopado pelo antagonista, quando na utilização do objeto de cena para encerrar a vida do vilão.
O Telefone Preto acerta especialmente pelo não dito e pela atmosfera de obra pequena, pontual e esperta em abordagem. Sua ironia é igualmente assertiva e deixa patente a sensação de que sua melhor tradução seria em algo menor, um episódio de uma série antológica ou um filme em curta-metragem, e mesmo para quem não curtiu o filme, vale a pena apreciar a leitura.
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