Sexta-Feira 13: O clássico filme de matança

Sexta-Feira 13: O clássico filme de matançaSexta-Feira 13 é um misto de filme caça-níquel sem vergonha com clássico absoluto do cinema de gênero. O longa-metragem de Sean S. Cunningham ajudou a estabelecer os Filmes de Matança como um dos principais segmentos do terror e entrou para a história como um expoente da valorização de efeitos especiais práticos.

Em contraponto ao valor histórico, há o fato de que o longa não possui nada de original, já que sua gênese claramente sempre foi a de repetir o êxito do famigerado Halloween: A Noite do Terror, estabelecendo até um horror ligado a data específica.

Lançado em 1980, o drama explora a métrica moralista do assassino serial incógnito, pegando a estética dos filmes italianos conhecidos como Giallo, um pouco do mistério gótico retirado da literatura de horror, além de possuir um plot twist ligado a identidade da pessoa que mata.

Depois de fazer Aniversário Macabro, Sean e Wes Craven ficaram com uma fama de serem produtores de um cinema barato. Sexta-Feira 13 mesmo só foi financiado graças a exibidores de Boston que deram dinheiro para o filme de 1972 e para outras produções infantis de Cunningham, como Here Come the Tigers, que é uma imitação de Garotos em Ponto de Bala.

A dupla de diretores/produtores também trabalhou em filmes educativos sobre sexo e outros pornográficos, soft core.

A ideia era fazer algo fácil de rodar, baseado em fórmula, algo que trouxesse sucesso. O roteirista Victor Miller assume sem medo que copiou elementos de Halloween: o mal no passado, reunião da pós-adolescência, quem transava era sentenciada a morte.

Sexta-Feira 13: O clássico filme de matança

Mas nessa obra, resolveu acrescentar algo a mais, no caso, muito sangue, como em outra inspiração para a construção mítica da saga, o italiano Banho de Sangue, de Mario Bava.

O roteiro era modificado ao longo dos dias de filmagem, sem pudores, inclusive com anotações de Ron Kurz, não creditado aqui, que viria a roteirizar Sexta Feira 13: Parte 2.

A sinopse lida com uma morte trágica no passado, do pequeno Jason, nascido em 13 de junho de 1946, uma sexta-feira. Por conta do descuido dos monitores de um acampamento, que preferiram trepar a cuidar do lago, o rapaz acabou se afogando, em Cristal Lake, no ano de 1957.

A câmera acompanha a história de fato a partir de 1958, onde alguém aparece matando um casal que antes de fornicar, curiosamente, estava tocando louvores cristãos. É a crítica moralista contra a falsa santidade desses jovens.

A câmera em primeira pessoa é um bom artifício, já muito utilizado no cinema de horror, inclusive em Tubarão, e como no clássico de Steven Spielberg, aqui também há um ótimo acompanhamento musical, com o tema que Harry Manfredini compôs, além da trilha sonora geral.

O epílogo termina com o assassinato dos jovens e com o letreiro quebrando o vidro.

O filme foi rodado em uma cidade pequena no interior de Nova Jersey, chamada Blairstown, em um acampamento de escoteiros, chamado North Burgon Boyscouts. Esse foi o ponto de partida para tornar o Crystal Lake um lugar crível, e fácil de associar com a realidade.

Outro bom fato é o trabalho de Virginia Field, a diretora de arte e design de produção. Ela afirmou que precisavam criar um lugar que aparentava ser seguro, acolhedor e agradável, mas que pudesse se tornar assustador depois de acontecimentos simples.

As cabanas de Crystal Lake parecem isso, especialmente pelos vários detalhes em vermelho, reforçado por ela, que se deu ao trabalho de pintar tudo, mesmo com a pouca verba. Dá para notar que alguns locais foram só parcialmente cobertos com tinta, e isso acaba dando um aspecto mais realista.

Foi Steve Miner, produtor associado e diretor de segunda unidade (na época, assinava Stephen Miner) que indicou Tom Savini, graças ao trabalho dele em Despertar dos Mortos.

Ele então fez os efeitos de maquiagem, junto ao seu auxiliar Taso Stavrakis, que normalmente assinava a coordenação de acrobacias e dubles. Foi ele que lidou com os mecanismos que bombeavam sangue, inclusive passou mal ao engolir sangue falso, na morte do personagem de Kevin Bacon.

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Há um montante de personagens completamente mal pensados.

Annie por exemplo, é uma mochileira andarilha, interpretada por Robbi Morgan que conversa com um cachorro. A liberdade era tanto que os atores iniciantes vivam improvisando diálogos, inclusive esses, que não fazem sentido.

Annie estava lá basicamente pelos dotes de ginástica, uma vez que conseguia cair do carro em movimento. A dramaticidade é nula. Os personagens são todos derivativos.

Kevin Bacon certamente é o mais famoso do elenco. Se junta a figuras como Crispin Glover de e Corey Feldman - Sexta-Feira 13- Parte IV: O Capítulo Final – como um dos nomes mais famosos da saga.

Há o velho clichê dos caipiras estranhos que são solícitos e cheios de segundas intenções (um inclusive empurra a bunda de Annie para um caminhão), um caipira profeta do caos, chamado de Crazy Ralph (Walt Gorney), que fica vociferando contra os jovens, afirmando que todos morrerão.

Outra figura estranha é Enos, personagem de Rex Everhart, que hoje é mais lembrado por parecer o sujeito da propaganda "pergunta lá no posto Ipiranga" conta que Steve (Peter Brouwer) e os Christys, sua família, já investiram muito dinheiro ali, mas o lugar sempre sofre incêndios ou tem pragas bizarras.

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Ele fala de uma suposta maldição, cita a morte do menino em 57 por afogamento, o assassinato dos monitores em 58, a tentativa de reabrir em 1962, onde a água deixou de ser potável misteriosamente. Se acredita mesmo que aquele é um lugar inabitável, mas Steve investiu mais de 25 mil em um ano para levantar o lugar.

Claramente há uma ciência dos habitantes do vilarejo com o que ocorre no espaço do antigo acampamento, não de forma deliberada, mas há uma suspeita de que alguém ou algo sabota as tentativas de reerguer o local.

Da parte das mortes, os efeitos impressionam. O corte no pescoço de Annie é bem-feitinho, ainda mais se considerar a pressa, já que Savini diz que fez esse efeito de improviso.

O mago do splatter (como é chamado) levou Morgan de moto as 16 horas, voltando com ela antes das 16:30 com o pescoço falso feito a partir do zero, e fez tudo de maneira apressada, para não perder a luz do sol nas filmagens.

Se o Glen de Johnny Depp usaria camisa cropped em A Hora do Pesadelo, Steve usa um short jeans curto, acompanhado de um lenço bandana no pescoço e um bigode que o faz parecer membro do Village People, com o peito a mostra: outros tempos e outros modelos de masculinidade.

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Adrienne King se superou para ganhar a vaga da sobrevivente Alice.

A atriz queria migrar dos filmes publicitários e comerciais de TV para o cinema, e conseguiu. Seu destaque foi grande, apesar de não ter feito tanto sucesso após esse, mesmo que tenha feito uma aparição também em Os Embalos de Sábado a Noite em 1977.

Para quem há menos de um ano trabalhava em uma rede de fast food, houve sucesso, obviamente.

Betsy Palmer foi escolhida por seus trabalhos anteriores em programas matinais da TV americana. Quando jovem fazia a perfeita "garota ao lado", era como uma versão mais angelical de Doris Day, a pessoa perfeita para ser a dócil mãe de Jason, a senhora Pamela Vorhess.

Ela aceitou o papel para poder comprar um carro...é tudo por dinheiro, e por um Shiroko. A atriz imaginava que jamais aquela obra seria um sucesso. Imaginava que ninguém veria aquilo, não se imaginou imortalizada num clássico do gênero.

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Quando as filmagens terminaram, Cunningham tinha um pepino na mão, já que não conseguia salvar nada na ilha de edição. Ele até pediu ajuda a Wes Craven, que afirmou que aquele era algo chato, monótono, muito lento. O fator que salvou foi a música de Manfredini.

O compositor diz que o clichê da música veio por acaso. Ele quis repetir a fala de Betsy Palmer, kill her mommy, e ao falar a primeira sílaba, "Ki", o microfone reverberou quatro vezes, daí ele fez o mesmo com "mo" (som de "ma") e funcionou, ficou sonoro.

Além disso, para reforçar a ideia de perigo, sempre que havia o assassino, o perigo ou simplesmente uma lâmina em tela, a música aguda vinha. Em todos os outros momentos, o silêncio ou o som ambiente imperava. Os acordes previam os passos do malvado, e isso adicionou ritmo ao vilão.

Entre os corpos espalhados pelo camping, se destaca primeiro a cara de pau em repetir o desfecho de Halloween, mas também vale uma honrosa menção ao trabalho de Savini em fazer versões dos atores ensanguentadas e destruídas. Por mais que não pareçam reais, há um trabalho que evoca perfeitamente o pitoresco, o fantasioso e o assustador.

Pamela é introduzida faltando muito pouco para acabar o filme, e sua lembrança de Jason na imensidão azul da água é bela e poética, tão grandiosa que faz perguntar se aquele espaço era de fato um espaço curto de água.

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Embora não faça sentido, a cena faz perguntar se ali não há uma ligação com o oceano. Curiosamente na parte 8, Crystal Lake tem intersecção com o mar.

Pamela viveu a odisseia da mãe ocupada, incapaz de vigiar seu filho que necessita de atenção o tempo inteiro, tentando compensar a morte dele matando outros

Vorhess ainda olha por uma fresta improvisada na madeira, tal qual em O Iluminado de Stanley Kubrick, lançado no mesmo mês de maio do ano 1980.

Há um pouco de Stephen King nesse conto de mãe assassina, inclusive na força que a Alice de King tem, contendo em si uma das melhores garotas finais do cinema de horror.

O baby Jason que Bill Bailey faz também é icônico, sendo um dos tentos mais exitosos de Savini até hoje, além de outra peça de improviso, já que foi pensado nos últimos momentos de filmagens, se valendo do fato de Bailey ter orelhas protuberantes e um olho mais caído que o outro, dito isso pelo próprio maquiador, que o conhecia de longa data.

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A briga entre Pamela e Alice também é visceral. Palmer assume que perdeu a linha na atuação, batendo de verdade em Adrienne King tanto que o diretor teve que pedir para ela ir devagar, pois no cinema não se faz isso.

Mesmo que a preocupação de Cunningham fosse de deixar esse filme com uma classificação para todos os públicos, a morte de Pamela é bem gráfica e sanguinolenta.

Já a ideia do sonho de ressurreição é a trama tendo contato com o metafísico, Jason seria renascido pela partida de sua mãe do mundo dos vivos. Se não tivesse falecido, já seria um adulto, considerando que o filme se passa em 79 ou 80 teria entre 33 e 34 anos, mas no devaneio de Alice, é enxergado como um menino ainda.

O que se tornou a saga depois obviamente dilui boa parte das qualidades do filme, mas dado que bons diretores como Joseph Zito e Tom McLoughlin embarcaram na franquia, não há muito o que reclamar, especialmente pelos eletrizantes múltiplos finais, que seriam claro pervertidos em nome do lucro fácil de Cunningham e companhia.

Sexta Feira 13 é um clássico do cinema, mesmo com todas as críticas (justas) de Roger Ebert, que afirmou que o longa é banal, sujo e acéfalo, mas tem bons tentos visuais em seus efeitos e maquiagem, e o fato de ter atuações tão podres faz com que ele soe charmoso.

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