Benção Mortal: A Primeira Tentativa de Craven de furar a bolha

Benção Mortal foi uma das primeiras tentativas do diretor Wes Craven com intuito assumidamente comercial. Lançado em 1981, ele lida com temas como religiões extremistas, seitas e mortes misteriosas, utilizando um mistério envolvendo um casal como força motriz de sua história.

O longa lida bem com esses temas espinhosos, especialmente no tom de denúncia aos religiosos extremistas e em como o modo de vida deles pode ser hipócrita e preocupado quase sempre apenas com as aparências.

O elenco que Craven tem a mão é bem mais recheado e pomposo que o habitual em sua filmografia. Estrelam o filme atores de ação como Ernest Borgnine, além do contumaz parceiro de Craven Michael Berryman.

No entanto a presença mais notada  certamente é a Sharon Stone, que faz aqui sua primeira personagem com nome para além da figuração, ao menos em longas metragens.

A trama central mostra um casal que vive em uma comunidade repleta de hititas, até que o marido Jim (Douglas Barr) sofre um atentado e deixa Martha (Maren Jansen) viúva. Ela se sente desamparada, mas segue no lugarejo, a fim de tentar descobrir quem cometeu esse crime.

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Após o homicídio uma tímida investigação policial se inicia, e nesse ínterim os fanáticos religiosos afirmam que a morte foi causada por motivos sobrenaturais.

Os hititas afirmam que o responsável foi um demônio de forma masculina chamada íncubo, um pesadelo que segundo o credo popular místico, se apodera das mulheres adormecidas, levando-as a pecados carnais.

Curiosamente isso não ocorre no primeiro caso fatal já que Jim era homem. Ainda assim a fala dos habitantes do povoado mira esse sentido místico, com as incongruências. Se o leitor forçar um pouco o argumento, pode enxergar um paralelo dessa sentença com a fé cega, que vem a ser uma das grandes causas de males na humanidade, mas o roteiro de Craven (baseado no argumento de Glenn M. Benest e Matthew Barr) não parece ser tão esperto ou inventivo para chegar nesse tipo de comentário.

Para o espectador desavisado, esse pode parecer um filme de época, já que os membros da ordem religiosa têm o hábito de se vestir tal qual os antigos colonos. Os hititas são saudosistas até com as vestimentas e sua economia é baseada em uma agricultora forte, tal qual era hábito nos séculos passados.

Não é incomum haver correção física quando se pretende punir os erros das pessoas da comuna e essa última questão está dentro do filme propositalmente, para registrar em imagens o quão retrógrados são os personagens do culto.

Craven abusa demais de cenas de nudez de Jansen, há vários momentos em que ela é exposta parcial ou completamente nua, de um modo que incomoda já que é completamente gratuita.

DIÁRIO DE UM CINÉFILO: BÊNÇÃO MORTAL (Deadly Blessing)

Cenas de sexo são comuns a filmes de terror, mas aqui a repetição do clichê parece existir exclusivamente para acrescentar tempo de duração e claro, apelo ao espectador onanista.

Os pontos altos do filme são as escatologias envolvendo animais. Há um ataque de serpente em uma banheira, momento esse bastante inusitado e que termina de forma surpreendentemente favorável a protagonista, que parece preparada para qualquer momento de ação.

Essa cena foi de certa forma refilmada em A Hora do Pesadelo, com uma variação que troca a serpente pelas garras do assassino dos sonhos Freddy Krueger, momento esse ainda mais onírico que nesta versão.

O filme tem alguns outros bons momentos, envolvendo rituais onde a pessoa é desacordada, como em hipnose, e em uma delas, Sharon Stone tem uma aranha de verdade colocada na boca. A única exigência que a moça fez é que o animal não tivesse presas, e de fato o aracnídeo entrou na boca da moça, provocando um dos trechos mais icônicos e incômodos do filme.

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A trilha sonora assinada por James Horner é bem empregada, de longe a melhor entre esses primeiros filmes de Craven enquanto diretor, acrescenta gravidade e receio ao espectador.

Há também uma boa intenção de mostrar o homem como causador do mal maior que criaturas sobrenaturais, mas os bons tentos ficam só na premissa, já que essa humanidade maléfica  envelhece mal e esbarra em um preconceito ligado a identidade de gênero que certamente não representam o pensamento de seu diretor, que claramente não considerava o transexual como vítima de uma parafilia - termo esse em ao que os antigos terapeutas consideravam distúrbios psíquicos por preferência ou obsessão por práticas sexuais não   socialmente aceitas.

Possivelmente, essa obra influenciou a ideia de Robert Hiltzik em confeccionar o final de Acampamento Sinistro, filme slasher de 1983, que guarda algumas semelhanças com o plot do assassino.

Isso por si só depõe a favor da obra de Craven, já que pode ter influenciado na fabricação de um Filme de Matança bastante curioso, infame e bizarro, mas na análise dele somente como obra, fica difícil relevar essa questão.

Benção Mortal tem uma carga de tensão crescente e regular, causa incômodo em quem vê. É bastante crítico ao modo de vida ultra conservador que permeia a comunidade rural dos Estados Unidos. A sequência final parece confusa e faz perguntar se os momentos anteriores a subida de créditos não foram feitos para parecer um sonho, e essa falta de resposta soa com um artifício para chamar a atenção gratuitamente, soando menos como algo pensado para ser misterioso espiritualmente.

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