Yellowjackets: um presente da Showtime para os fãs de mistério

Yellowjackets é um seriado do canal Showtime que ganhou uma certa popularidade no final do ano de 2021, quando estreou sua primeira temporada. A trama lida com duas linhas temporais: a primeira em 1996, com um grupo de meninas que jogam futebol/soccer em campeonatos escolares e que sofrem um acidente de avião ao ir para a final nacional, e a outra em 2021, com algumas das sobreviventes vivendo suas vidas.

Idealizado por Ashley Lyle e Bart Nickerson, essa primeira temporada tem como diferencial a aura de mistério e é claro, um elenco repleto de rostos famosos e talentos.

Na fase pretérita, o enfoque se dá especialmente nas duas melhores amigas Jackie, de Ella Purnell, e Shauna, interpretada por Sophie Nélisse. Aqui, desde o início, se percebe uma grande tensão entre elas, até com desenrolar de paixões proibidas, ciúmes e inveja no passado, mas também se alude a uma culpa grande da parte de Shauna já em sua versão adulta feita pela icônica e belíssima atriz Melanie Lynskey, que lamenta a perda de sua amiga no pós acidente e aceita participar de inúmeros rituais de louvor a memória de Jackie, inclusive comemorando o aniversário dela com os pais da antiga capitã do time.

Were Shauna and Jackie in Love? 'Yellowjackets' Actors Weigh In

Além das duas há também Taissa, vivida jovem por Jasmin Savoy Brown e adulta por Tawny Cyrpress, Nathalie que é executada por Sophie Thatcher primeiro e Juliette Lewis depois, além da peculiar Misty, que não era jogadora, mas ajudava a comissão técnica, interpretada como criança por Samantha Hanratty e depois pela icônica Christina Ricci.

O elenco vai obviamente além destas cinco personagens, mas como pelo menos essas quatro tem contrapartes no futuro - em falas baseadas nos relatos dos showrunners, é dado que possivelmente 8 pessoas sobreviveram - é válido destacar o trabalho das atrizes, e não só delas, uma vez que a caracterização das interpretes é ótima, com uma maquiagem e estilização bem-feita pela equipe capitaneada por Patricia Murray.

Yellowjackets temporada 2: enredo, elenco e tudo o mais que sabemos

Uma questão curiosa é que livre da "caracterização juvenil" e dos uniformes escolares, as atrizes pouco parecem com suas versões mais velhas. Cypress e Savoy Brown até se parecem um pouco, mas Hanratty e Nélisse não lembram em nada nem Ricci e nem Lynskey. O trabalho de maquiagem é muito bom, mas o cuidado de Jeannie Chow com o design de cabelos é igualmente primoroso, já que serve de ponte entre as duas gerações, mesmo que em alguns casos, como com Nat, as versões não lembrem tanto uma a outra, o que é até esperado, dada a rotina castigada de abuso de drogas que a o personagem teve.

Da parte dos criadores e showrunners, Lyle e Nickerson são conhecidos por trabalharem juntos há muito tempo, desde as colaborações em roteiros pontuais em Narcos e Despachos de Outro Lugar, até a condução e criação de The Originals, na CW, série derivada do sucesso teen The Vampire Diaries.

Fato é que mesmo com experiência, os dois não haviam trabalhado com um orçamento tão alto, nem com um elenco tão recheado de estrelas, e para ajuda-los, foi chamada Karyn Kusama, a diretora do divertido Garota Infernal, que além de dirigir o piloto que deu todo o tom do seriado, também assina como produtora executiva.

Um dos motivos que fez de YJ a queridinha do público em 2021 é o fato de cada capítulo conter um ótimo gancho para o próximo, provando mais uma vez a força do formato de lançamento semanal de capítulos. A exibição original é no canal a cabo Showtime, mas aqui no Brasil ela está disponível no streaming da Paramount Pictures.

Já nos primeiros momentos é estabelecida uma aura de mistério ao redor do que ocorreu no lugar onde o avião caiu e de como adolescentes conseguiram sobreviver por 19 meses até serem resgatados, claro, com algumas situações emergenciais impossíveis de driblar, além de algumas perdas ao longo dos episódios.

Para quem se importa com spoilers, é recomendável primeiro assistir e depois ler o texto, uma vez que falaremos de maneira franca sobre os mistérios (e são muitos) e sobre teorias a respeito do desenrolar dos relacionamentos, plots além do que rolará nas próximas temporadas.

Estejam avisados!

Crítica: Yellowjackets - 1ª Temporada - Infinitividades

Pelo que se diz no além série, há uma promessa de que o programa terá cinco temporadas, e dado o estilo dos episódios, de idas e voltas temporais, fica no público o receio de que se estique demais a história, perdendo o foco. Como a série tem semelhanças narrativas com Lost, fica o receio de que seu desfecho seja controverso igual.

Para além de comparações banais, o que se enxergar em Yellowjackets são paralelos óbvios com os clichês de Senhor das Moscas, no sentido de que uma vez que elas se estabelecem no lugar, toda a liderança da equipe é demolida para novas regras sociais existirem.

Ainda na escola, o treinador do time conversa com Jackie, a capitã do time, e assume que ela não é a melhor do time. Para ele, Shauna é mais rápida, Lottie (Courtney Weaton) é a mais habilidosa, e quando ele vai definir Taissa, é interrompido - possivelmente de maneira proposital, uma vez que o roteiro gosta de plantar minhocas na cabeça do espectador - o que se nota então é que Jackie é como a "rainha abelha" delas basicamente por sua popularidade escolar, uma vez que elas estão no High School e na educação dos Estados Unidos essa é uma fase importante, não só no aprendizado factual, mas também na vida social dos americanos médios.

Jackie não é especial, é apenas popular e respeitada por isso, e isso é dado já no piloto.

Dentro das moças citadas pelo técnico Martinez, está Lottie, que em um primeiro momento parece apenas uma coadjuvante sem brilho, mas ao longo dos capítulos desenvolve questões bastante... peculiares.

Ela é tratada de maneira diferenciada, uma vez que toma remédios para lidar com problemáticas de saúde mental. Essas por sua vez não ficam exatamente claras, se entende que ela possivelmente é esquizofrênica em início de estágio.

Yellowjackets: Lottie's Medication Explained (Is It Real?)

Fato é que por estarem isoladas da civilização, seus remédios acabam rapidamente, e ela está livre para agir e pensar conforme sua mente e espírito permitirem.

A possibilidade de esquizofrenia aqui é facilmente confundida com clarividência. Em um dos episódios, ela é mostrada criança, e só parece para basicamente antecipar um acidente na estrada que poderia ter matado ela e seus pais, que só não pereceram graças aos gritos dela no banco de trás, seguidos de uma calma bem estranha.

Ao longo da história ela ganha camadas de importância e liderança também, fato que a torna suspeita óbvia de alguns momentos desenrolados na faixa de tempo de 2021.

Yellowjackets' Episode 9 Recap And Review: 'Doomcoming'

Vale lembrar que o jatinho que levaria as moças até o local da final nacional era propriedade do pai de Lottie, e segundo ela, era uma compensação pela ausência parental do mesmo, mas a motivação dessa distância também fica obscura.

Como são dez episódios, não falta espaço para explorar a intimidade de cada uma delas. Misty mesmo é mostrada como estranha desde criança. Sua ação de primeiros socorros graças ao curso que ela fez mais de uma vez - não se sabe se isso ocorreu por reprovação ou por obsessão da mesma - é basicamente o motivo da maioria das pessoas ter conseguido viver, além de ter garantido a ela algum nível de gratidão das atletas, já que ela era claramente excluída do resto da turma.

Adulta, ela trabalha cuidando de idosos, e segue tão incrivelmente problemática quanto sua contraparte. Claramente ela não mudou, seguindo uma pessoa complicada, complexada e solitária.

Chega a ser bizarro ver uma menina de menos de 18 anos arrancar a perna de um adulto com uma machadada, imediatamente após notar que o membro do mesmo foi esmagado. Esse momento é uma boa abertura para falar que o gore é bem empregado, especialmente quando se usa efeitos práticos.

The 22 Wildest Moments From Yellowjackets Season 1

Há vísceras, pedaços do corpo espalhados por todo canto, não se poupa nem personagens e nem o público de cenas dantescas, sujas e sanguinolentas.

A estrutura dos episódios é bem pensada, pois ao mesmo tempo em que se mostra a mudança da "coroa" entre as Yellowjackets no passado, se desenrolam tramas dignas de teoria da conspiração no presente, com uma tentativa de suborno que ameaça contar tudo o que ocorreu na Ilha através de um vazamento de informações supostamente confiáveis e até assassinato de alguns dos sobreviventes.

Isso é algo digno de nota uma vez que Taíssa busca um cargo eletivo em Nova Jersey, e ter um passado escrutinado seria péssimo, ainda mais pelo fato de que se especula fortemente que houve canibalismo no período de espera de resgate.

Não é à toa que a personagem se preocupa, já que além da tal campanha, que exige de si um esforço hercúleo, sua família também sofre com suas particularidades.

Sendo ela uma mulher preta e LGBT, claramente há mais dificuldades que o normal para basicamente viver e fora as questões "sociais", ela ainda tem que lidar com um comportamento suspeito de seu filho, que apresenta sinais de possível insanidade, tanto pregando travessuras quanto afirmando que enxerga estranhas aparições na casa.

Para quem assistiu, é fácil perceber que possivelmente o garoto herdou algumas questões da mãe, que pode ter de fato um vínculo com o sobrenatural - como Lottie poderia ter também - ou sofre ela com alguma questão mental.

Fato é que além de ter visões desde que era pequena, Taissa também parece sensível a possessão, servindo de canal possivelmente para mediunidade nas duas principais linhas temporais.

Yellowjackets: Why Taissa Eats Dirt – Real-Life Phenomenon Explained

Já Natalie é tratada sempre como a pessoa digna de pena. Seu passado é trágico, envolve violência doméstica e até (possíveis) abusos.

Ela é encarada pelas colegas como sexualmente atirada, já que é uma das que é assumidamente não virgem no time dentro da linha de 1996.

Boa parte do drama de Shauna se baseia na culpa do passado, já que ela costumava dormir com o namorado da amiga, Jeff, que adulto é executado por Warren Kole.

Fato é que adulta ela é bastante resoluta, inteligente e fria.

Não dá para perceber (ainda) se ela sempre foi assim, se ela se tornou desse jeito na ilha ou se é um misto dos dois. O fato dela usufruir do namorado da amiga dá indícios de que essa é uma característica sua desde sempre, e que o isolamento fez evoluir esse instinto, mas sua personagem é tão complexa, bem escrita e bem interpretada que lê-la também é um bom mistério do programa.

Yellowjackets' Review: A Girls' Soccer Team Goes 'Lord of the Flies' - Rolling Stone

Seu papel "tribal" como a responsável por cortar a comida faz pensar que ela desenvolveu a capacidade de se manter calma durante os eventos pós queda. Lá ela descobre que estava grávida e esse é outro mistério: Onde está o bebê. Vale lembrar que sua filha Callie (Sarah Desjardins), não tem idade que bateria com um nascimento entre 1996 e 97.

Aos poucos os sobreviventes vão decidindo o que fazer, passam por condições climáticas extremas, passam a caçar, tem escassez de comida, encontram uma cabana, tentam sair daquele lugar. Fato é que todas as ações são pensadas pelas meninas, como é a liderança entre os insetos tipo abelha e vespas, já que as Yellowjackets que dão nome a série e ao time são desse grupo de insetos.

Nesse cenário elas enfrentam animais selvagens, encontram lobos, ursos, cervos, e em alguns desses encontros há infortúnios, seja em ataques violentos, ou meramente momentos nojentos, com direito até a um cervo que está podre por dentro, mostrando que possivelmente o lugar está amaldiçoado.

Was the Rabbit in 'Yellowjackets' Real? (And More Animal Questions About the Trippy Showtime Series) | Movie Paws

Até agora não ficou explicito se existe interferência espiritual nesse universo. Algumas personagens têm fé, e até ocorrem momentos semelhantes a cultos, com direito a um batismo evangélico improvisado, que abre possibilidade para a entrada do mal em uma das personagens, até referências a um baile pagão, no penúltimo capítulo.

Aliás, o capítulo nove denominado Doomcoming é o que mais conta movimentações da trama, o que mais aproxima as duas linhas temporais.

É nele que as meninas resolvem fazer o baile que não teriam, já que estão desaparecidas, e onde se entorpeceriam com os cogumelos que Misty colheu.

Também é neste episódio onde a Shauna adulta se estabelece como a mestra do autocontrole, ao expor calmamente a sua filha que se ela tentar contar sobre a infidelidade conjugal dela, quem irá perder é ela própria, já que as poucas economias da família, que deveriam pagar a faculdade da menina, seriam gastos em trâmites do divórcio.

Nesse interim, as idas e vindas entre passado e presente se tornam mais intensas, e intoxicadas pelos cogumelos, as mulheres agem como predadoras, deixando de lado a inocência e ingenuidade de colegiais para apresentar uma face de caçadoras de machos, variando entre o inseto abelha migrando para o aracnídeo viúva negra.

Ainda no torpor, Lottie ascende como liderança, e diz que elas não terão fome, e de fato a sorte delas muda, não se sabe se foi por interferência de algo maior que elas, por coincidência ou porque a moça se tornou uma profeta de fato.

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Toda a sequência após as brincadeiras nasce de uma experiência coletiva de transe, de vingança e de realocação política do poder. A mera descrição dessa movimentação pode soar piegas, mas a abordagem aqui é bem madura e pontual.

O personagem masculino com maior destaque em 1996 é Travis, interpretado por Kevin Alves, é sabido que ele teve um relacionamento longo com Nat, que é claro aludido aqui, e seu fim, em 2021, é trágico. Sua morte quase foi antecipada nesse momento, uma vez que as garotas vão em sua direção, possivelmente para sacrifica-lo, mas são interrompidas, pouco antes disso.

A Natalie adulta diz que Travis não fazia parte do tal culto, seja lá o que isso signifique, fato é que ele teve parte no transe coletivo, e possivelmente por ter tido essa experiência, buscou estar longe disso.

Em uma eventual segunda temporada, possivelmente esse culto ou seita será melhor explorado, assim como a necessidade de um sacrifício, para que a floresta ou a natureza dê chances a todos eles de viver.

Para atiçar a curiosidade do leitor, separamos também alguns mistérios a serem respondidos na segunda temporada, listados abaixo.

Visões no espelho

Yellowjackets Season 1: 10 Biggest Questions Season 2 Needs To Answer

Ao longo da exibição, duas personagens têm "visões" no espelho. A primeira revelada ao espectador, é Natalie, que enxerga Travis na casa dele em 2021 enquanto o mesmo estaria no trabalho (ou possivelmente morto, não fica claro).

Já Taissa, ainda criança, antes até de jogar futebol, vê o Monstro sem Olhos, no leito de morte de sua avó, que supostamente, tinha visões. Fica a dúvida se ambas tinham algum tipo de sensibilidade ao metafísico, se eram manifestações sobrenaturais ou se ambas tem algum nível de insanidade que se comunica entre elas, visto que após saírem do local do acidente, elas mantiveram algum contato.

Referências nas páginas Caderno dos Sonhos

All of Jackie's Journal Pages : r/Yellowjackets

Na antiga casa de Jackie, Shauna acessa um "caderno dos sonhos", um objeto comum as meninas dos anos noventa, que reunia anotações da sua melhor amiga. Entre essas havia uma lista de personagens de filme que Jackie enxergava como iguais a ela.

Dentro da lista há personagens como Mia Wallace de Pulp Fiction, Sidney Prescott de Pânico, filme esse de 1996, mas também há referências a Titanic (1997), Beleza Americana (1999) e As Apimentadas (2000), todas obras pós 1996.

Teria a mãe de Jackie invadido a privacidade da filha morta e completado aquilo? Difícil, uma vez que ela montou um verdadeiro altar em homenagem a memória da garota.

Fato é que os produtores disseram que isso não foi à toa.

Lottie está viva?

As cenas finais envolvendo Natalie deixam uma pulga atrás da orelha, já que a conta bancária de Travis foi limpa após ele supostamente se suicidar.

A mulher que Natalie contrata, diz que tem a ver com Lottie Matthews, e fica a dúvida se ela estaria viva, ou se o culto seguiu com seu nome, já que claramente ela foi uma das primeiras líderes ali.

O destino e vitória eleitoral de Taissa também fazem com que ela seja olhada como suspeita de alguma ligação com Lottie, especialmente por ela ter feito um despacho muito semelhante a um rito de bruxaria, e se imagina que esse será um elemento a mais de desenvolvimento no segundo ano.

As Yellowjackets perdidas

Why are you loving the show Yellowjackets? - Quora

Algumas garotas não foram citadas neste review, mas é dado que há um número limitado de personagens na ilha. Entre os homens vivos, há Javi, irmão de Travis, o auxiliar tecnico Ben Scott e entre as garotas não citadas há Laura Lee (que faleceu tentando fugir de avião), Mari, a goleira Vanessa e Akilah.

No entanto, nos momentos finais, mais duas aparecem, sem nome tanto nos créditos quanto no IMDB. São personagens feitos por Mya Lowe e Princess Davis.

Seriam elas 2 yellowjackets não citadas mesmo, ou apenas miragens? Algumas delas foi a moça "jantada" no início do primeiro capítulo? Fica a dúvida.

Conclusão:

Yellowjackets tem um clima de mistério e é temperado com um humor mórbido e ácido. O maior mistério a ser respondido em seus novos anos certamente tem haver com o canibalismo e a cena "tribal" do epílogo no piloto e claro, nos momentos finais dentro da linha de 1996. Se houve canibalismo ou não ainda não se sabe, mas claramente há mais podridão a ser explorada na vida e rotina de Nat, Misty, Shauna e Taissa e mais quem puder estar vivo. A próxima temporada está para chegar no final de 2022 e será obviamente acompanhada por afinco.

 

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