Review: Arrow S02E13 - Heir to the Demon

Este texto contém spoilers da série.

Heir to the DemonNinguém elogia uma série do CW por suas sutilezas. Com roteiros repletos de exposição por parte dos diálogos, todos os programas da emissora, uma hora ou outra, acabam sendo criticados duramente por não deixarem muito para o espectador pensar. Eis que Arrow surge como uma das melhores coisas que o canal já exibiu e consegue até quebrar alguns desses conceitos. Sim, o seriado não perde sua natureza expositiva, o que incomodou muito, especialmente na primeira temporada, mas por outro lado, os roteiristas tem se mostrado coerentes criando situações que dispensam explicação e até exigem um pouco de atenção do espectador. Seja quando referencia a si mesma, como o início do treinamento de Roy no episódio anterior, que começa com o personagem dando tapas em uma tigela de água, repetindo a situação que Oliver passou na ilha, ou quando, para surpresa dos fãs, inclui uma relação afetiva entre pessoas do mesmo sexo. Sim, o que a novela da Globo precisou de 221 capítulos para fazer, Arrow fez em 45 minutos, de forma mais convincente e, quem diria, sutil, ao menos no que diz respeito à reação de alguns personagens.

Heir to the Demon começa com a chegada de Nyssa Al Ghul (Katrina Law) em Starling City. A filha de Ra's vai a cidade para dar um fim a busca por Sara, iniciada meses atrás no começo da temporada. A Liga dos Assassinos falhou em suas tentativas de levar a moça de volta a Nanda Parbat e só mesmo Nyssa seria capaz de ser bem sucedida na missão. Mas não porque é uma talentosa praticante de artes marciais, mas sim porque as duas estavam envolvidas em um relacionamento quando Sara fazia parte da Liga. Logo no primeiro encontro de ambas em Starling, elas se beijam, naturalmente, sem nenhuma preocupação da série em erotizar demais a situação. E, embora Oliver, que observa tudo à distância, demonstre surpresa, não é com nenhum tipo de sentimento de repressão. Mas é mesmo na reação de Quentin Lance que a série encontra sua maior força. O policial durão, que várias vezes já demonstrou não ter uma mente tão aberta, ao saber do relacionamento da filha, consegue dizer apenas um surpreso "oh!". E é isso. Lance percebe que nos cinco anos que Sara ficou fora, houve uma paixão que a segurou do outro lado do mundo e que, de certa forma, lhe fez feliz. Fica claro que se não estivesse cansada das mortes provocadas pelos asseclas de Ra's Al Ghul, Sara ainda estaria junta de Nyssa. Como julgar negativamente algo assim?

Obviamente que o roteiro trata a situação como plot twist, mas o faz com respeito e naturalidade, sem forçar nada. Mesmo quando as personagens estão sozinhas , em suas primeiras cenas, há um carinho entre ambas, mas sem apelação ou exploração do momento como chamariz de audiência. É uma das poucas vezes que o vilão (neste caso vilã) da semana, é mais que um simples elemento da trama e exibe nuances e uma certa tridimensionalidade.

O episódio foca também na subtrama da candidatura de Moira Queen, o que avança exponencialmente sua relação com Oliver. Mais pontos positivos aqui, já que a série não precisa dizer que o protagonista agora vestirá outra máscara, para manter as aparências. Há um grande desenvolvimento no caráter do personagem e é uma das evoluções mais significativas que o espectador já presenciou na série. E, tendo em vista as maquinações de Moira, o título do episódio, traduzido como "herdeiro do demônio", poderia muito bem se referir ao próprio Oliver também.

A fio condutor da semana, no entanto, é a família Lance. Até os flashbacks na ilha deram lugar a um momento distinto do passado de Sara, Laurel, Quentin e Dinah (River Song, ops, Alex Kingston). Tudo para que fique mais natural a explosão da irmã mais velha ao final do episódio. Em um primeiro momento, quem acompanha a série e precisava de mais um motivo para odiar Laurel, provavelmente não precisa mais. Por outro lado, é preciso parar para pensar um pouco no momento que a moça está passando e também no que já passou por conta de sua irmã mais nova. É o que todo mundo gostaria de ver na tela? Não, mas não é assim na vida também?

Para os fãs de Felicity, uma boa notícia. Finalmente um roteiro decide por dizer um pouco mais quanto ao passado da moça, o que torna sua decisão ainda mais impactante quanto a contar para Oliver o segredo de Moira. Sua lealdade para com o protagonista é tanta que vai além da própria amizade e da provável esperança de um futuro relacionamento. A personagem já tem uma empatia enorme com o público, em boa parte por conta da interpretação de Emily Bett Rickards, mas também graças aos roteiros, que sempre a mostram com enorme sensatez e maturidade.

Heir to the Demon

Mas, como nem sempre se pode ter tudo como se quer, Heir to the Demon tem alguns problemas de direção e montagem. O primeiro confronto entre o Arqueiro e a Canário contra Nyssa é muito bem coreografado, mas peca por acontecer sem que seja construído anteriormente. Como a dupla foi parar ali é um mistério que só seria resolvido com a inclusão de uma cena que foi cortada do episódio, envolvendo Roy Harper. Quando a filha de Ra's e seu capanga sequestram Dinah, o jovem parceiro do Arqueiro estava vigiando o hospital e tenta impedir o rapto. Acaba envenenado e, mesmo que seu metabolismo alterado não o deixe morrer, fica enfraquecido e perde a batalha. Aí, sim, haveria ao menos uma ligação entre uma coisa e outra. Roy teria chamado Oliver explicando melhor o encontro dos heróis com a vilã, logo em seguida.

Mesmo assim, o episódio da semana se destaca entre os melhores que a série já proporcionou. Um deleite para os fãs, já acostumados às excelentes sequências de ação e aos dramas envolvendo as famílias Queen e Lance. De quebra, mostra que é possível ser natural, sem precisar usar um relacionamento homoafetivo como panfletagem ou sinal de "conquista" do veículo que o exibiu. Mais ainda, com a cena final, coroa Sara como uma pessoa de espírito livre, que não se intimida por barreiras impostas por pensamentos retrógrados.

Alexandre Luiz

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8 comments

  1. Avatar
    Lukas 8 fevereiro, 2014 at 13:09 Responder

    Curti muito a crítica, só não curti muito a ênfase que o crítico deu à relação homoafetiva de Sara e Nyssa. Afinal, como ele mesmo falou, a série se esforçou tanto pra fazer isso de maneira natural, ai vem a crítica do episódio enfatizando o que não deveria ser enfatizado, estragando tudo. Mas enfim, fora isso (e referências à Globo) ótima crítica!

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      Alexandre Luiz 9 fevereiro, 2014 at 10:10 Responder

      Quer dizer que ao elogiar a série por não cair na armadilha que outras caem (como até mesmo Spartacus que tratava tudo de forma erótica pra atrair audiência) eu errei? Desculpe, mas como crítico minha função é apontar os erros e acertos. O maior acerto da semana foi esse, não tinha como não comentar, até porque muita gente viu o episódio e se sentiu "ofendido" pela cena, tal qual ocorreu com a da novela da Globo. Penso ser fundamental que, em uma época que as pessoas precisam de explicação pra tudo porque não conseguem ver além do próprio preconceito, existam textos que esclareçam os objetivos de determinadas escolhas de roteiro. Se não for pra fazer isso, faço como outros por aí, que resumem o episódio num post longo e chamam de review… e se for pra fazer isso, prefiro não fazer texto algum.

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        Lukas 9 fevereiro, 2014 at 16:19 Responder

        Tudo o que quis dizer é que o que tornou o roteiro do episódio tão bom foi não terem dado ênfase à essa relação, tornando-a natural como você mesmo disse. Mas a partir do momento que ela é enautecida como "o maior acerto da semana" (tal como o beijo do Félix da Globo), todas as atenções se voltam para algo que não foi feito para ter destaque sensacionalista, e assim, perde seu efeito. Entendeu?

        Mas repito, fora isso, ótima crítica, e não só desse, mas como dos demais episódios!

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