Uma das trilhas mais impressionantes e menos comentadas composta por Ennio Morricone foi seu trabalho para o longa “Navajo Joe”. O filme de um dos maiores autores do Western Spagetti, Sergio Coburcci, conta com Burt Reynolds como protagonista navajo (uma tribo de índios americana) e retrata uma das maiores trilhas de sangue que o cinema já teve, com aproximadamente 90 minutos, o filme só não faz escorrer sangue pelos cantos da tela por ser algo que sabemos ser impossível, traz praticamente nenhuma história, (tem um plot de vingança que impulsiona a trama) com o foco principal em mostrar a violência gratuita e doentia causada por um bando de pistoleiros.
O que Morricone faz aqui, e neste ele usou o pseudônimo de Leo Nichols, é algo simplesmente absurdo e empolgante. Traz uma música carregada de tensão crescente em seus temas principais, e quando preciso, arremessa com precisão épica cantos que impulsionam a alma do espectador/ouvinte ao nível de veracidade ideal para se experienciar a obra de Coburcci. O maior exemplo disto se encontra já na faixa de abertura, “Titoli di Testa”, que começa o filme da forma mais grandiosa possível, com uma espécie de gritos indígenas que permeiam o início da faixa por alguns segundos sem melodia alguma até que é chegada a guitarra estalando o peso da violência que acompanhará os personagem ao longo da película, no decorrer da música, os diversos gritos fantásticos da cantora italiana Gianna Spagnulo são acompanhados de um coral indígena que tem ao fundo apenas os barulhos ritualísticos de tambores.
A trilha é composta em sua grande parte por acordes de piano pesadíssimos, percussão que alterna esses acordes (o que mantém a composição com o tom pesado), e um crescente de instrumentos de cordas como violoncelos e violinos, que quando não são acompanhados pelos gritos, permanecem com um peso dramático tão bom quanto. Apresentando esses elementos está “Il Profilo Del Destino”, terceira faixa do exemplar, que é talvez a melhor faixa da trilha (junto da já citada música que abre o disco), e carrega consigo apenas um agouro sombrio que terá ecos durante toda a trilha dali para frente. A música é tão boa que inclusive foi usada por Quentin Tarantino em seu “Kill Bill Vol.2”, na famosa cena do duelo entre a noiva com Elle Driver. Um alongamento (ou eco) desta faixa é a também ótima “Il Bandito Prende Il Trene” que apresenta a mesma sonoridade pesada com apenas mais tempo de tensão gritante.
Outra faixa que também já foi usada por Tarantino é a, calmamente composta num crescente bonito, “La Fine Di Barbara, E Il Ritorno di Joe”, na cena já clássica onde a noive acerta as contas com seu ex marido, Bill. A faixa tem em seu início uma paz adversa do resto da trilha, que começa com os sons pesados da guitarra sendo tão calmamente tocados que os faz parecer saídos de um violão, até que com toda a preparação feita, uma explosão ocorre e todos os acordes munidos do canto indígena de Spagnulo são elevados ao tom necessário para o peso dramático desejado.
Músicas como “Guarendo Le Ferite” e “Addio a Fratello Jeffrey” alternam o tema principal do piano para a guitarra, e fazem isso da forma mais natural possível. Interessante observar é que toda vez que a música começa com o tema no piano a mesma não é acompanhada de cantores, mas quando o tema é tocado pela guitarra todos os gritos fortes e impactantes permeiam dentre a faixa continuamente.
Há também as faixas intermediárias, que carregam parte do tema ou apenas servem para ilustrar determinado momento de uma cena, como é o caso da quarta faixa, “Il Saloon Pyote”, que serve apenas para apresentar o Saloon que lhe dá título. Faixas intermediárias como é o caso da linda “Dopo La Fine” servem para ilustrar a quão grandiosa a composição é, já que nesta faixa temos o vocal mais calmo e mais distante da atmosfera indígena, mas que ainda sim, nos toca por ser claramente uma preparação para o final (é a penúltima faixa). É uma música de catarse, onde no filme, toca exatamente após o protagonista ter seu objetivo atingido. Por isso, se distancia de todas as demais, tendo um clima único dentro da trilha, separando tal momento da mescla de violência desnecessária que acontece durante todo o filme.
E no encerramento em “Titoli di Coda” os vocais permanecem mais distantes e calmos do restante da obra, inclusive a percussão, onde os tambores tocam em um ritmo puramente mais melódico referenciando um ritual alegre e de paz indígena, evidenciando a paz final que o personagem protagonista alcança, afastando toda a agressividade e potência de ataque que ocorre durante toda a projeção e aproximando o público de Navajo Joe, trazendo uma satisfação para ambos de que a missão foi cumprida e de que agora o momento de paz chegou.
É sem dúvidas, uma grande trilha, que serve não só para ser ouvida durante o filme, mas como cabe perfeitamente como disco isolado, trazendo diversas impressões e sentimentos ao longo de sua reprodução. É altamente recomendável para todos que puderem escutá-la.
Trilha completa:
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