Review: Sense8 - A 1ª Temporada

Sense8.2Empatia, por definição, é “a capacidade de compreender o sentimento ou reação da outra pessoa imaginando-se nas mesmas circunstâncias”. No entanto, a falta dessa característica - teoricamente humana - é o que nos coloca cada vez mais próximos dos animais dito inferiores. Uma involução, para ser mais claro. Assim, o fato de Sense8, a nova produção da Netflix, ter causado tanto burburinho nas duas últimas semanas, está ligado justo a força presente no diálogo com a ausência cada vez mais constante do “importar-se com o outro”. Os Wachowski (Matrix) e J. Michael Straczynski (Babylon 5) nos conduzem por oito histórias distintas em oito locais diferentes, tendo como condutores oito estranhos que descobrem partilhar um curioso dom: eles podem interagir entre si ao se colocarem um no lugar do outro, dividindo sentimentos e habilidades como se fossem um só organismo.

Will (Brian J. Smith), Capheus (Aml Ameen), Sun (Bae Doona), Riley (Tuppence Middleton), Nomi (Jamie Clayton), Lito (Miguel Ángel), Wolfgang (Max Riemelt) e Kala (Tina Desai) vivem vidas comuns, até o momento que recebem a estranha visão de uma mulher chamada Angelica (Daryl Hannah). Eles veem a moça cometer suicídio e, a partir daquele ponto, nascem como uma nova família de “sensates”. Aqui, o roteiro não toma saídas fáceis - a confusão causada pelo primeiro episódio é a maior prova disto - e apresenta todos os personagens que acompanharemos pelas próximas doze horas, sem nunca subestimar o espectador.

Sense8.3Logo de cara, o que chama a atenção em Sense8 é a edição que compõe os primeiros encontros entre aquelas pessoas. A força que a característica de cada um tem em tela é refletida sobriamente na nossa identificação com seus temores e dúvidas. Essas mesmas características também são organicamente colocadas como algo em comum ao passado de alguns dos interligados. Dos daddy issues partilhados por Wolfgang, Nomi e Sun ao aconchego familiar da casa de Will, Capheus, Riley e Kala, podemos ir pescando o ponto onde a história de um deles mimetiza o passado do outro e vice-versa. A catártica sequência no quarto episódio, onde todos os sensates cantam e dançam ao som de What’s Up do 4 No Blondes é só um exemplo de muitas das explosões de redenção que esse poder de compreensão e identificação tem no show.

Não falta espaço também para falar-se de tabus como transfobia, misoginia, auto-aceitação, fé e a ausência dela. O melhor é que não temos nada velado por ativismos baratos - mesmo que alguns venham alegar isto -, ou que se justifique apenas pelo velho e manjado shock value. Tudo em Sense8 tem função na trama, reafirmando o propósito do enredo quando enxergarmos diferentes gêneros sendo pincelados em vários momentos da própria série. O sci-fi quase asimoviano, representado pela figura do misterioso Jonas (Naveen Andrews) e do vilão Whispers (Terrence Mann), por exemplo, pode dar lugar à dramédia mexicana vivida por Lito e sua covardia, seguindo de perto a história de crime e vingança protagonizada por Wolfgang, ou mesmo a busca por independência de Sun, enquanto Capheus homenageia o mestre Jean-Claude Van Damme na luta diária pela saúde da sua mãe.

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Sense8 coloca todos os peões do mapa maior pensado pelos Wachowski e por Straczynski como peças de um jogo que, na falta de uma comparação menos piegas, podemos chamar de vida. Torna-se impossível, desta forma, não se pegar com lágrimas nos olhos ao assistirmos oito partos ao som de uma ópera, ou não se emocionar durante a conversa entre uma mulher trans e um gay enrustido, sobre o quão difícil é encarar o mundo quando não temos coragem de enfrentar as nossas próprias angústias.

Os roteiristas ainda ganham ponto por não hesitar em por o sexo como a forma de conexão mais duradoura entre os sensates, numa sequência que prima pela sensualidade sem soar como um artifício vazio para justificar a classificação. E aqui vale o elogio para o comando de Tom Tykwer, James McTeigue e Dan Glass que, junto dos Wachowski, programam um grafismo naturalista que surge impactante e impressivo tanto nas cenas de sexo como nos momentos mais violentos da série, tornando a experiência de estar no meio da trama tão sensorial quanto as habilidades que os personagens conseguem compartilhar.

Também feliz na escolha do elenco, Sense8 apresenta oito novos astros que, a partir de agora, deverão trilhar um caminho de reconhecimento merecidíssimo. Só para citar, temos a força da expressividade contagiante de Aml Ameene seu Capheus Van Damme, o comovente olhar de Jamie Clayton e sua Nomi, além da canastrice do mexicano Miguel Ángel como Lito, que é capaz de nos fazer rir com o mínimo esforço. Os apoios desses nomes não ficam muito atrás e é surpreendente como conseguimos nos importar com o destino do menor coadjuvante, mesmo que ele tenha sido apresentado há apenas um episódio.

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A Netflix consegue dar voz outra vez para uma série que nunca funcionaria no formato tradicional de TV. Sense8 surge como o primeiro grande exemplo do ano quando falamos no real significado do termo “binge-watching- a nova face da velha maratona – e, na verdade, não poderíamos ter ganhado um representante melhor para justificar tal evolução. Obrigado Wachowski! Obrigado Straczynski! Era desse sopro que estávamos precisando.

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3 comments

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    Douglas Couto 16 junho, 2015 at 00:09 Responder

    Eu tava ficando com a impressão que todas as críticas pra Sense8 estavam sendo feitas por pessoas que não viram a série. Não é possível. Só o Série Maníacos tinha salvado até o momento. E que felicidade ver já nas primeiras linhas tudo sobre o que a série representa e o que é importante. " Essas mesmas características também são organicamente colocadas como algo em comum ao passado de alguns dos interligados." será que é tão dificil perceber isso? Não é possível. Tão de parabéns Cine Alerta. Aguardando o podcast se tiver.

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      Zé Guilherme 16 junho, 2015 at 00:28 Responder

      Valeu Douglas!!! Eu também fico me perguntando se as pessoas viram a mesma série que eu, porque as críticas mais pesadas foram bem vazias e pegando no pé das mesmas coisas… Nenhuma crítica negativa que eu li, conseguiu justificar ou dar um motivo para tanto ódio. Estou feliz, que não fiquei sozinho, na admiração por Sense8. \O

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