Continuando o post da semana passada, sobre alguns exemplares de filmes (neo) noir lançados pós anos 70.
Corpos Ardentes(Body Heat, 1981)- Parte da retomada da estética noir que aconteceu nos anos 80 e 90, este filme de Lawrence Kasdan é uma competente refilmagem do clássico Pacto de Sangue, de Billy Wilder. Durante uma onda de calor na Flórida, um advogado sem escrúpulos (William Hurt) se envolve com a mulher de um rico investidor, vivida por Kathleen Turner, atriz que nasceu para o papel de Femme Fatales. Extremamente sensual, com Turner se benficiando da fotografia de Richard H. Kline e da trilha de John Barry, Corpos Ardentes não chega a ser nenhuma obra-prima, mas desempenha bem sua função, com o inevitável ponto de virada no terceiro ato e mantém o espectador atento aos acontecimentos. A tensão sexual entre os personagens no início do longa remete aos melhores momentos do gênero, como À Beira do Abismo e, claro, sua maior inspiração, a já citada obra de Wilder. Outro destaque é o uso do noir não apenas como estética, mas como parte fundamental da trama. Infelizmente, Copos Ardentes é um filme obscuro e dificil de achar. Foi lançado em Blu-Ray nos EUA, mas no Brasil é uma raridade até em VHS.
Homens em Fúria (Stone, 2010) - Já ouviu dizer de boas ideias desperdiçadas? Pois bem, este é um ótimo exemplo. Robert De Niro é um agente de condicional que, há poucas semanas de sua aposentadoria, aceita pegar um último caso. Edward Norton é o preso, que depois de cumprir 8 anos de um pena de 15, luta para conseguir sua liberdade. Milla Jovovich é a mulher do detento, que resolve, através da sedução, convencer o agente vivido por De Niro a dar um jeito de seu marido sair da prisão. Contando assim, um diretor com maior noção de ritmo e estética teria feito um excelente filme noir. Já um cineasta preocupado em estudos de personagens e disposto a fazer uma parábola sobre alienação (com discussões sobre os efeitos da religião, a vida apática e o direito de se julgar uma pessoa), poderia ter nas mãos um longa para disputar o Oscar. Infelizmente, o projeto foi comandado por John Curran, realizador que não consegue trazer nada para história, a não ser a excelente atuação de De Niro e Norton. Ambos carregam o longa todo nas costas, mas mesmo assim, não conseguem torná-lo interessante pelo que deveria ser: sua trama.
O Ano do Dragão (Year of the Dragon, 1985)- Michael Cimino, roteirista do segundo filme de Dirty Harry e diretor de O Franco Atirador, não teve muita sorte nos anos 80. Começou a década dirigindo o filme que praticamente levou a United Artists à falência, O Portal do Paraíso, e em 85, para a MGM, realizou este O Ano do Dragão, com Mickey Rourke como protagonista. A trama mostra o policial interpretado por Rourke, encarregado de cuidar da Chinatown de Nova York. Arrogante, decide iniciar uma guerra com a máfia chinesa e acaba atingindo mais do que gostaria. Apesar do ritmo lento, o filme vale por quesitos técnicos como fotografia e direção de arte, que dão ao longa uma atmosfera típica do cinema policial dos anos 50 (com destaque para o figurino do personagem principal). Outro ponto positivo é a caracterização de Rourke, um verdadeiro anti-herói, que toma atitudes às vezes detestáveis para atingir seus objetivos, que, como deixa transparecer, existem por mero orgulho de ser o policial mais condecorado da cidade.
Horas de Desespero (Desperate Hours, 1990) - Ainda do diretor Michael Cimino, essa refilmagem do clássico com Humpfrey Bogart tem Mickey Rourke novamente no papel central. O diretor tinha o ator em grande estima e o considerava perfeito para interpretar o personagem outrora vivido por Bogart. Na trama, um criminoso prestes a ser condenado, foge no meio do julgamento auxiliado por sua advogada, que também é sua amante. Ao se reunir com o irmão parceiro de crimes, inicia sua fuga, que os leva até a casa de um advogado e sua esposa, interpretados por Anthony Hopkins e Mimi Rodgers, fazendo ambos e seus filhos de refém. Sem entrar no mérito de qual versão da história é melhor, o filme de Cimino cria uma tensão crescente, graças a Rourke, que começa como um sequestrador gentil para, aos poucos, se revelar um verdadeiro sociopata. O diretor mostra muita competência também na sequência inicial, que apresenta a namorada do criminoso. A trilha, feita para evocar filmes dos anos 40 e 50, ajuda no ritmo e o suspense psicológico que só aumenta durante a projeção ainda divide espaço com uma espécie de estudo de personagens, que passa por Rourke e chega até a estranha relação entre Hopkins e Rodgers. Infelizmente, o longa sofre um pouco no último ato, com um desfecho um tanto mirabolante. Pesa também a agente do FBI designada para o caso. A atriz Lindsay Crouse não consegue imprimir nenhum tipo de empatia com o espectador, o que atrapalha ainda mais os últimos momentos do filme.