Crítica: A Fuga

A-Fuga-poster"Suspense acaba, inusitadamente, tornando-se uma comedia."

O novo trabalho do cineasta austríaco Stefan Ruzowitzky, ‘A Fuga’, demorou pra ser lançado aqui no Brasil, já disponível, inclusive, em home-vídeo, nos Estados Unidos, desde o final do ano passado. Um erro gravíssimo que vem sendo cometido pelas distribuidoras, já que devido à atual facilidade da internet, qualquer um pode ter acesso à obra, através de downloads. Sendo irrefutavelmente algo prejudicial em sua bilheteria, como aconteceu com o recente ‘A Viagem’, dos irmãos Wachowski, um fracasso em nosso circuito nacional.

Selecionado no prestigiado festival de Tribeca, em 2012, ‘A Fuga’ chega sem muito alarde, na semana posterior ao Oscar. Uma curiosidade interessante, já que o diretor foi premiado, em 2008, na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, pelo germano-austríaco ‘Os Falsários’. Mas esta nova investida de Ruzowitzky, que conta com um bom elenco formado por Eric Bana, Olivia Wilde, Kris Kristofferson, Sissy Spacek e Charlie Hunnam, está muito longe disso. Sequer consegue cumprir sua função de ser um discreto suspense, que prenda atenção da plateia.

Tudo se passa numa pequena cidade canadense, e traz a história de Addison (Eric Bana) e Liza (Olivia Wilde), dois irmãos especializados em roubos, que utilizam sua malícia, engenhosidade e sensualidade para aplicarem seus golpes. E, logo após roubarem um cassino, eles correm em direção à fronteira, tentando evitar uma perigosa nevasca que se aproxima. Um acidente acontece, e os dois precisam se separar. É aí que entra o personagem Jay (Charlie Hunnam), um ex-boxeador que acaba de sair da prisão para encontrar sua mãe (Sissy Spacek) e seu pai (Kris Kristofferson) durante as festas de fim de ano. Ao mesmo tempo, a polícia local procura pelos fugitivos que deixam corpos como rastro. E, dentro dessa corporação, surge mais um conflito familiar entre pai (xerife) e filha (policial), sobre um passado mal esclarecido.

Percebe-se que, claramente, o longa tinha potencial pra crescer e tornar-se um apropriado suspense, com um texto extremamente ramificado, podendo até trazer controvertes perspicazes nos tópicos abordados. Mas é ratificando o ditado que um mau roteirista ou diretor pode estragar uma boa história, que esse título existe. (mal) Escrito pelo estreante roteirista Zach Dean, o conto possui graves problemas na resolução de varias passagens, nas ações e decisões dos seus personagens - que beiram o surrealismo, onde não cabe – e, principalmente, no incremento da sua trama. Algo que a direção também corrobora.

Citarei aqui dois momentos que me chamaram atenção pela capacidade e ousadia de serem colocados em tela:

  1.  Logo após sair da prisão, o personagem Jay, que devido a uma ilegalidade, numa luta de Boxe, foi condenado sozinho, que se sabe lá porque ou o que aconteceu, decidiu ir até a academia de um sujeito que supostamente era seu empresário, pra cobrar um dinheiro. Ali acontece uma discussão, onde os dois se esbofeteiam e o rapaz acaba matando, acidentalmente, o dono do local. Saindo de lá, pela porta da frente, como se nada tivesse acontecido. E, completando a maluquice, tal fato é simplesmente sacado e esquecido na trama. Sem mesmo servir como referência psicológica para que mais tarde o personagem mudasse seu rumo, em relação ao caso.
  2. Depois do “perigoso bandido” Addison ter aprontado varias canastríces - como numa luta hilária com um chefe índio, no intuito de roubar um veículo, o mesmo perde o seu dedo mindinho, beirando o thrash; ainda banca o herói salvando uma família atormentada por um “cruel padrasto”, que deixa sua mulher e bebê, do lado de fora da casa, pra morrerem de frio. Nessa cena, o ator Eric Bana dividiu com uma menina diálogos que, sem duvidas, são os piores de sua carreira. -, o sujeito invade a casa e faz de refém a família de Jay e, após ameaçar a mãe do rapaz com uma espingarda calibre 12, minutos depois, a mesma se oferece para ajudar o assassino a enfaixar sua perna, ferida numa troca de tiros com a polícia. E, mais tarde, ceia e conversa tranquilamente ao lado de toda família reunida, e (PASMEM!) uma policial que estava de passagem - exatamente a que havia atirado nele.

Com uma narrativa nada orgânica que torna-se enfadonha em seu andamento, a direção de Stefan Ruzowitzky falha em vários aspectos. Sendo o principal deles no desenvolvimento dos seus intrépidos personagens. Que agem de modo estranho, pra não dizer bizarro, deixando o espectador sem entender suas intenções. Se arriscando também em diversos estilos que vão do gore ao melodrama, todos integralmente carentes de apelo artístico. Até mesmo as atuações de Wilde e Bana são vergonhosamente caricatas.

A fotografia de Shane Hurlbut (O Exterminador do Futuro – A Salvação) talvez seja o grande acerto dessa fita. Através de lentes azuladas e frias, o cinematógrafo consegue dar um aspecto gélido ao local, tornando verossímil o clima nevado. E fazendo alusão a possível personalidade das pessoas que figuram o cast. O que não acontece na trilha sonora de Marco Beltrami (As Sessões), pouco inspiradora e serve apenas para criar o suspense. Porém, não obtém existo, visto que algumas de suas composições não combinam com a estética fílmica.

De um modo geral, ‘A Fuga’ é um filme detentor de uma história heterogênea, com uma gama de personagens adventícios, mas que são infelizmente mal desenvolvidos, devido os seus comandantes tomarem decisões equivocadas. Os tornando desinteressantes e fazendo com que o espectador ache tudo isso um monte de bobagem. O que é uma pena, já que é fulgente a potencialidade da obra, que acaba se tornando vazia e passando despercebida, entre as varias produções do gênero.

Comente pelo Facebook

Comentários

Comente pelo Facebook

Comentários

Deixe uma resposta