Crítica: Sob a Pele

188237.jpg-r_640_600-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxxO belo e o estranho

Eis aqui uma obra que podemos chamar de curiosa, principalmente sendo distribuída em grande circuito. Chegando ao conhecimento popular por expor a inédita nudez de Scarlett Johansson (Ela), Sob a Pele é um ser estranho em sua linguagem, mas direto no que se propõe examinar e apontar. Não é um estudo de personagem, tampouco a simples história de um ser alienígena, mas sim um profundo mergulho no perfil do humano e suas várias faces. É ousado e desafiador e, desde o primeiro plano, nos faz analisar detalhes à procura de respostas, que raramente são entregues, sem que nunca soe masturbatório nas ideias.

Livremente baseado no livro homônimo do holandês Michel Faber, essa ficção científica dirigida por Jonathan Glazer, que há anos havia dirigido o regular Reencarnação (2004), acompanha uma estranha figura que vaga por um pacato vilarejo escocês – algumas das cenas lembram Electroma (2006) -, conquistando e abduzindo indivíduos sem nome, através de sua bela forma humana, que ganha o nome de Laura (Johansson), no escopo que vai além do seu principal ideal contado ao fim. O interesse da criatura torna-se cada vez mais amplo, quando em vários momentos a vemos observar atentamente a rotina e comportamento dos cidadãos residentes.

Numa espécie de ritual de acasalamento, Laura captura suas vítimas investindo na principal fraqueza do homem: o desejo da carne. Conhecendo de perto o comportamento masculino, que mesmo tendo trejeitos diferentes, caminham numa só direção: volúpia. Quando perguntados se estão livres, isso em diferentes horários e situações, as respostas são sempre diretas e despreocupadas. O sexo parece estar acima de qualquer coisa. No entanto, ao se deparar com um sujeito verdadeiro e de forte personalidade, algo provavelmente decorrente de sua má formação física – vivido aqui por Adam Pearson, homem que realmente possui Neurofibromatose -, a personagem enfim se sente tocada e consegue enxergar algo que vai além do apodrecer.

Assim, não realizando o que pretendia, decide vagar sozinha em busca de respostas. Numa dessas andanças, a estranha mulher conhece alguém que lhe mostra a bondade e um maior carinho, mas que no fim das contas também quer algo em troca. Sua odisseia pelo ecce homo é encerrada na revelação da nossa face mais cruel, que pode ser encarada como a latente e impiedosa maldade humana, ou mesmo a rejeição pelo diferente.

A fita também é visualmente interessante, sendo detentora de imagens plásticas e quase hipnotizantes – por muito assemelhar-se a 2001 - Uma Odisséia no Espaço (1968) -, vemos a obscura fotografia de Daniel Landin captar os mínimos pontos reluzentes, e quando necessário, destaca, com intensidade, os planos de forte iluminação. Bem auxiliados pela industrial trilha sonora assinada por Mica Levi, que busca diferentes efeitos harmônicos, dos quais não estamos acostumados a ouvir. A direção de Jonathan Glazer tem certa influência de David Lynch (Cidade dos Sonhos), mas não se permite exagerar, pois, ainda que seja experimental, é completamente natural a ponto de ser perfeitamente compreendida. Ainda que algumas tomadas possam parecer prolixas, suas funções narrativas são claras e pontuais. Bem como a escalação de Scarlett Johansson foi precisa e quase que fundamental, já que esta é hoje vista como uma das mais belas e charmosas mulheres, nada poderia ser mais fascinante do que ela, em relação aos conceitos de beleza estética feminina.

Vejo em Sob a Pele um cinema visual e visceral, que fala e confronta seu público através de imagens que juntas tornam-se uma obra interessante, do ponto vista estético, e analítica, quando se fala em conteúdo. Não é um filme fácil, precisa realmente de maior atenção, principalmente por suas sutilezas e referências, que muito dizem sobre, e, sendo você fisgado por essa atmosfera, certamente o título será marcante cinematograficamente.

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