Capitão Fantástico (2016, direção e roteiro de Matt Ross), acima de tudo, é um filme franco com o espectador. Explico. Para quem já está ambientado com o cinema indie, certamente perceberá que ele possui toda pompa de um: seja no uso das cores da fotografia e até mesmo nas roupas das personagens, a trilha sonora e versões alteradas de músicas famosas, personagens que parecem ser maiores que a própria vida, uma jornada narrativa ligeiramente contida e, ainda assim, homérica e detentora de momentos catárticos que fazem com que nos identifiquemos emocionalmente com os percalços das derrotas e as vibrações das vitórias de cada um que passa pela tela.
Aliás, desde o trailer lançado ainda no primeiro semestre do ano, Capitão Fantástico "assumia-se" como o indie movie da vez/do ano, como antes foram outras pequenas grandes produções como A Lula e a Baleia (2005), Pequena Miss Sunshine (2006), Juno (2007), Indomável Sonhadora (2012), The Spetacular Now (2013) e outros mais. Lembremos que indie, de uns bons anos para cá, perfilou para si uma característica muito mais estética na elaboração de sua mise-en-scène do que financeira por falta de investimento em sua produção ou baixo orçamento. Portanto, eis a motivação para citar estes filmes acima e a razão de encaixe de Captain Fantastic no rol destes.
Além de indie, Capitão Fantástico é um protótipo de road-movie — os famosos filmes de estrada, de paisagens insólitas, de personagens interessantes que surgem e somem para que outros apareçam, de (re/des)cobrimento(s), etc.
Capitão Fantástico também é, vejam só, um filme de esquerda socialista (Marx e seu materialismo dialético são até citados). Algo fácil de se perceber na maneira como as personagens vivem e traduzem suas esperanças para o mundo que as cercam, e que eles habitam da maneira mais respeitosa possível no que tange ao seu comprometimento com um lema implícito de suas personas, onde viver mais, para eles, é viver com menos — para assim viver melhor.
Há ao menos uma passagem que deverá estar dentre as mais belas cenas do cinema em 2016, pouco antes do final do filme. Uma passagem curta, mas eficiente ao amarrar narrativamente o filme, dando-lhe ainda um espaço lúdico onde se mesclam um belo cenário paradisíaco, uma fotografia de plano aberto estonteante e uma canção por muitos de nós conhecida, mas em uma encantadora nova roupagem.
Sem apelar para insígnias fáceis que classificam dois dos personagens principais enquanto heroi e vilão, Viggo Mortensen e Frank Langella são ambos antagonistas um do outro, tendo suas ações camufladas pelo bom storytelling narrativo que dá um jeito de sempre apontar os erros do "heroi" e momentos doces do "vilão".
Outro destaque no campo de atuação é George Mackay, que interpreta Bo, o filho mais velho da família fantástica. Mackay já tinha conseguido se destacar em 2016 como sidekick de James Franco na minissérie 11.22.63, baseada numa obra de Stephen King.
Se o escopo de ambientação de Capitão Fantástico é reduzido geograficamente, narrativamente não podemos dizer o mesmo. É um filme que toca o espectador não por exibir um impossível 'way of life', mas por demonstrar que a nossa maneira de viver já esgotou a nós e ao mundo. Para os tempos atuais, é um filme não apenas adequado, mas necessário.
Puxa, difícil classificar ou adjetivar este longa, pois neste localiza-se do início ao fim um novo formato de se criar filhos, que, como sabemos, não há fórmulas para tanto. Fui criado para ir à União Soviética estudar em Leningrado, estudei russo e ouvia música de lá e ao mesmo tempo admirava os inventores norteamericanos. E eu eduquei, junto à minha ex, nosso filho numa nova sistemática: ele não via Rede Globo, não tomava refrigerantes, assistia só Tv Cultura e ouvia música erudita. Por mais que isto tivesse tido muitas críticas, resultou num ser estudado, com medalhas às dezenas e viagens pelo mundo e ao seu modo feliz. O pai no filme – interpretado magistralmente – e seus filhos – também muitíssimo atuantes – conseguiram um feito peculiar ao fugir ao socialmente estabelecido – mesmo que vejamos ainda ônibus para deslocamento ou compras em supermercado. Que ótimo, não havia nesta nova ordem celulares, pouco estudo ou visão estagnada das coisas: tudo foi profundamente revolvido! E o diretor ainda, de quebra, nos instiga a visualizar os problemas de se optar por tudo ao que se propõe. Uma ode libertária aos veganos, naturalistas, hippies e anarquistas de plantão! Obra ótima para ser vista e sentida.
Pois achei a trilha sonora fraca, preguiçosa, e a versão do Guns ficou totalmente sem propósito e bizarra.