Filmes sobre a Segunda Guerra são, para o público mundial, o equivalente ao que filmes sobre ditadura são para os brasileiros: apesar de uma fonte inesgotável de histórias fantásticas, chegam às telas carregados de um pré-conceito devido ao desgaste do tema. Sendo assim, é uma agradável surpresa que um longa que traga a temática do Nazismo, ainda consiga manter sua narrativa (batida) interessante e envolvente.
Na trama, passada em Berlim e com início em 1933, o professor de literatura John Halder (Mortensen) escreveu um livro falando sobre eutanásia. Tal livro chama a atenção do crescente partido, e John é convocado para redigir artigos para o Terceiro Reich a favor do tema – algo que seria usado posteriormente para justificar a política de eliminar os deficientes e doentes. Ainda que contrário à política de Adolf Hitler, Halder aceita o emprego, sem perceber que, aos poucos, passa a pensar e agir cada vez mais como um nazista – o que compromete e ameaça sua amizade com o judeu Maurice Israel Glückstein (Isaacs).
Escrito pelo inexperiente John Wrathall, com base na peça de C.P. Taylor, o roteiro acerta ao focar-se na amizade de Halder e Glückstein, mantendo o crescimento do hitlerismo em segundo plano. E nisso a direção do brasileiro Vicente Amorim (O Caminho das Nuvens) também merece destaque, ao mostrar de maneira sutil a aceitação pública ao partido: desde a discórdia em relação à queima de livros e a posterior aceitação desse fato; passando pelas pichações nas paredes; e o crescimento do pensamento popular de que, algo que “faz tantas pessoas felizes, não pode ser ruim”.
Porém, Vicente peca ao criar, no primeiro ato, sequências que beiram ao caricatural: como as cenas que mostram o protagonista em casa com a família. Além disso, as alucinações do herói – que vê pessoas cantando no meio da rua quando atinge certo nível de stress – não são convincentes e acabam causando estranhamento. Ainda que a conclusão dessa “subtrama” das alucinações seja bastante interessante, ela acaba destoando do restante da narrativa e torna-se desnecessária.
Ainda assim, o pior defeito do filme reside em sua montagem. Primeiramente assumindo uma história contada em flashbacks – que começa com John sendo convocado, e volta no tempo para mostrar a vida do autor enquanto escrevia o livro – tal escolha até funcionaria bem, caso não fosse abandonada logo em seguida ao decidirem adotar uma montagem “clássica”. Mais do que isso, o trabalho de John Wilson (Billy Elliot) ainda sacrifica um dos momentos mais dramáticos do longa, em uma cena envolvendo a mãe do protagonista que é interrompida por um corte seco utilizado de forma prematura, impedindo que o público se emocione com ela.
Entretanto, emoção é o que não falta na atuação sempre carismática de Viggo Mortensen (O Senhor dos Anéis) – que demonstra um misto de ingenuidade e ganância. Sabendo da imponência do ator, Amorim explora ao máximo seu protagonista, utilizando-o em praticamente toda projeção e, ainda deixando espaço para Jason Isaacs (o Lucius Malfoy de Harry Potter) chamar atenção ao abandonar por um momento a sua áurea de eterno vilão. Ao final, Um Homem Bom mostra-se um belo exemplo de como até mesmo um tema desgastado no cinema ainda tem muita história pra contar. Não é nenhum O Pianista ou A Queda, mas sua principal qualidade reside no fato de nunca tentou ser.
Comente pelo Facebook
Comentários
Comente pelo Facebook
Comentários