Crítica: As Tartarugas Ninja

ninjaturtles-posterApesar do conceito absurdo, Tartarugas Ninja tem potencial para ótimas histórias. Quem já leu alguma coisa das HQs clássicas de Kevin Eastman e Peter Laird ou assistiu à boa série animada de 2003 pode confirmar isso. Infelizmente, o novo longa, produzido por Michael Bay e dirigido por Jonathan Liebesman, desperdiça qualquer chance de se destacar e trazer os personagens para os novos tempos de forma minimamente interessante.

Escrito por Josh Appelbaum, André Nemec e Evan Daugherty, logo nos primeiros minutos, As Tartarugas Ninja demonstra sinais de um roteiro preguiçoso e desinteressado em manter qualquer tipo de sutileza. Em uma narração do mestre Splinter (voz de Tony Shalhoub) é explicado ao espectador aquele universo que o acompanhará pelos próximos 103 minutos e surge algo como "Nova Iorque sofre a ameaça do Clã do Pé, chamado assim porque pisa nas boas pessoas desta cidade". É pura exposição para explicar o que não faz muita diferença. E se esse tempo é gasto para uma coisa insignificante, imagine como serão as explicações que realmente importam.

O problemático texto desperdiça também seus personagens principais, desta vez quase coadjuvantes de seu próprio filme, já que toda a trama é centrada no ponto de vista de April O'Neil (Megan Fox). Assim, os quelônios Leonardo, Rafael, Michelangelo e Donatello (Johnny Knoxville, Alan Ritchson, Noel Fisher e Jeremy Howard) jamais são desenvolvidos bem o bastante para que suas personalidades, tão distintas em qualquer uma de suas encarnações prévias, fiquem claras. Na verdade, os três roteiristas não se importam com isso, pois escrevem as Tartarugas da mesma forma, usando como muleta o recurso visual. O que reforça os traços de personalidade desta vez é a forma como elas se vestem e não como agem, o que não faz o menor sentido. No fim, as quatro parecem ser versões ligeiramente diferentes do mesmo personagem, neste caso Michelangelo, o adolescente festeiro e brincalhão do grupo. Não teria tanto problema (a animação dos anos 80 chegava perto disso às vezes) se ele não beirasse o insuportável, fazendo piadinhas a cada segundo, soltando flatulência sem motivo aparente ("É o pepperoni!") e ultrapassando qualquer limite do alívio cômico.

Para se distanciar das outras adaptações e se firmar como algo diferente, o roteiro de As Tartarugas Ninja muda certos aspectos da origem dos personagens, ligando o acidente que os transformaram à infância de April. Apesar de ser um recurso clichê para que tudo esteja conectado, isso não seria problema se Appelbaum, Nemec e Daugherty tivessem criado alguma explicação palpável para cobrir os furos que surgem dessa decisão. O Mestre Splinter é o que mais sofre neste aspecto. No original ele era o rato de estimação de um ninja e observando seu dono treinar, adquiriu conhecimento de artes marciais e de sua filosofia. Aqui, como era um rato de laboratório, seu conhecimento vem de um livro velho sobre Ninjutsu que encontra nos esgotos. Fica difícil aceitar, desta forma, que Splinter dê nomes japoneses ao que ele considera um "espírito da justiça" ou que saiba algo sobre filosofia, uma vez que o livro cobria apenas golpes e movimentos. Fica prejudicado também, o conflito existente entre o mestre das Tartarugas e Destruidor (Tohoru Masamune). Em todas as versões anteriores era vingança, mas como a origem desta vez foi alterada, parece ser uma rusga existente simplesmente para dar continuidade à história. Eles são inimigos e pronto. Ao mexer em algo que não precisava, o filme parece não confiar no que está estabelecido há 30 anos em diversas mídias, criando furos desnecessários. Não há problema em mudar, desde que seja feito com cuidado para que os conflitos da trama não contradigam o que foi alterado.

O diretor faz o que pode com o que tem em mãos e, se não consegue minimizar o desastre que é o texto, cria ao menos boas sequências de ação, apesar da insistência da câmera de mão, que em certos momentos impede o espectador de entender alguma coisa que está acontecendo. Liebesman falha ao dirigir o elenco, principalmente Megan Fox. Se a moça tem suas limitações, o cineasta não sabe identificá-las para corrigir a personalidade caricata que a atriz dá a sua April. Há momentos de vergonha alheia como os que a jornalista tenta explicar para sua chefe, vivida por Whoopi Goldberg, suas teorias ou quando descobre a verdade sobre as Tartarugas revirando documentos antigos de sua infância. Will Arnett vive um Vernon Fenwick tão exagerado quanto qualquer um dos quelônios, fazendo surgir a pergunta sobre sua utilidade para o roteiro, uma vez que o espaço para a comédia já estava preenchido pelos quatro personagens principais. Além disso, o repórter cinematográfico que interpreta é provavelmente o pior jornalista de Nova Iorque, já que seu instinto nunca é o de correr atrás da notícia, nem quando ela vem em sua direção, como na sequência em que uma multidão sai do metrô e ele não demonstra a menor curiosidade sobre o motivo daquilo.

Uma boa adição ao elenco é William Fichtner, que tem tradição ao dar vida a personagens ridículos e ainda se destacar. Aqui isso não ocorre e seu Eric Sacks é apenas mais um capanga ganancioso do Destruidor. Apenas no clímax (extremamente familiar para quem assistiu O Espetacular Homem-Aranha, pra dizer o mínimo) há algum momento para destaque, mesmo que seu discurso entre em conflito com um dos pontos da trama: a morte do pai de April. A impressão é que alguma alteração foi feita no roteiro e esqueceram de mudar seu diálogo com a personagem de Fox. O Destruidor tem um design ameaçador o suficiente para agradar às crianças, mas suas motivações são rasas e desinteressantes. Incomoda também que durante a batalha final tudo seja em CGI, o que distancia o espectador daquele momento. Não há a preocupação nem mesmo de destacar os olhos do vilão, uma vez que sua máscara cobre todo seu rosto.

Falho em sua concepção e em sua condução, As Tartarugas Ninja, no entanto, já é um sucesso de público, comprovando o potencial mercadológico da franquia. Infelizmente seus realizadores não acreditam em seu potencial narrativo e brincam com a inteligência do espectador, criando um comercial gigante de action figures em que os personagens realmente se comportam como aquelas crianças que aparecem brincando em propagandas do tipo. Talvez essa seja uma boa explicação. É um filme feito por quem tem mais saudosismo dos brinquedos do que das histórias contadas nos desenhos animados, nas HQs ou até mesmo nos filmes anteriores.

Alexandre Luiz

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2 comments

  1. Avatar
    Claudio R 17 agosto, 2014 at 20:37 Responder

    Após assistir ao novo filme das Tartarugas Ninjas senti uma grande saudade dos anos 90, quando existia bons desenhos animados e filmes fiéis a esses desenhos. Esse remake dos quatro irmãos mutantes me decepcionou. Mostrou-se um filme apelativo, com heróis com aparência de um "incrível Hulk " em miniatura, um Destruidor com armadura de Megatron dos transformres, piadas infantis e Megan Fox, totalmente caricata, tomando conta do desastre do filme.

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