Por Erick Silva
Filmes de terror, de um modo geral, acabaram ficando “presos” em duas searas distintas no cinema atual. Há aquelas produções mais, digamos, “autorais”, que possuem a péssima definição de pós-terror (termo sem muito sentido), e que abordam um horror mais sutil, mas não menos aterrador. E, há aqueles projetos feitos a toque de caixa, com todos os clichês que o cinema de gênero pode comprar.
O que isso tem a ver com O Grito? Na verdade, muito, já que o filme acaba sendo um tanto desconexo justamente por querer abraçar demais esses dois mundos. Quer ser uma mistura tanto daquele tipo de terror mais subjetivo, quanto daquele que mais expositivo e comercial. Com isso, acaba não tendo identidade.
Pra se ter uma ideia, logo nos dois primeiros minutos de projeção, já temos, de cara, um jump scare daqueles bem óbvios, e que (convenhamos) já não assusta mais ninguém. A trama, então, segue para outro núcleo, com outros personagens, e com o passar do tempo, percebemos que ela vai e vem no tempo, contando histórias que, uma hora, irão se intercalar.
Mesmo sendo um recurso batido em diversos filmes por aí, quando bem usado, pode render um resultado que envolva o espectador. Não é o caso deste O Grito. Pois, chega um momento em que o filme já está a 15 minutos do final, e esse recurso de vai e vem no tempo continua sendo usado, o que acaba deixando a “narrativa principal” cansativa.
Inclusive, em se tratando de personagens, poucos deles nesta versão de 2020 se salvam. Os principais, por exemplo, (os detetives Goodman e Muldoom) acabam sendo inexpressivos, com esta última cometendo várias daquelas atitudes típicas, que estamos cansados de ver.
Talvez o melhor núcleo (e o mais pesado também) seja o do corretor de imóveis Peter Spencer, cujo desfecho tem, sim, o seu impacto. Já a história da senhora Faith Matheson e de seu marido, mesmo sendo trágica, carece de melhor desenvolvimento.
Enquanto isso, somos bombardeados por todas aquelas mesmices que 90% dos filmes de terror atuais insistem que são aterrorizantes, quando, na verdade, são bem chatas. De criaturas que aparecem do nada a diálogos bastante expositivos, quase tudo aqui não tem sutileza ou carisma pra se sustentar.
E, mesmo com bons atores no elenco, as interpretações, salvo raras exceções, parecem estar no piloto automático. Um dos que se saem melhor é John Cho, justamente o que interpreta Peter Spencer (o corretor de imóveis mencionado anteriormente). Até mesmo a carismática Lin Shaye (da cinessérie Sobrenatural) não consegue fazer muito por aqui.
No quesito “novidade”, há mais de gore do que na maioria dos filmes pipoca do gênero, é verdade, mas isso se torna um recurso barato, já que não é bem utilizado. Não chega a ter o exagero, por exemplo, da refilmagem de A Morte do Demônio, mas, ainda assim, é uma violência vazia, sem o impacto necessário.
O diretor Nicolas Pesce, o mesmo do interessante Os Olhos da Minha Mãe, parece não tentar se esforçar para contornar os clichês mais irritantes do terror moderno, filmando tudo de maneira previsível. Lembrando ainda que ele também escreveu o roteiro.
Esse O Grito acaba sendo um filme (perdão o trocadilho) sem alma. Quer agradar a vários tipos de público, mas, acaba não agradando ninguém. Caso a produção tivesse uns 40 minutos a mais para poder desenvolver melhor certas tramas, e evitar ao máximo as armadilhas narrativas do gênero, talvez ela tivesse sido uma experiência bem melhor. Do jeito que ficou, contudo, o filme não é ruim, mas é facilmente esquecível.