Desejos supremos. Se tem uma coisa que sempre saltou aos olhos na curta vida de American Horror Story, é a capacidade que seus roteiristas possuem, de criar uma consistente mitologia com pouco tempo de tela da temporada em questão. Coven até agora, tinha começado mais lenta, explicitando pausadamente as nuances de suas personagens, trazendo o oposto do que vimos na brilhante introdução de Asylum e lembrando mais as escolhas iniciais presentes no debute da Murder House. Felizmente, The Replacements acerta em cheio quando escolhe Fiona para conduzir o perfil mitológico da história, explicando não só os motivos por detrás da trama da “juventude eterna” (criticada cedo demais por alguns), como também abrindo portas para o sedutor universo que é o próprio passado da Academia de bruxas. Porém, o que me deixou apreensivo durante o episódio – e que surgiu como outra herança do primeiro ano -, foram os excessos caricatos de Ryan Murphy, adepto confesso da prática do shock value mesmo quando esta periga diminuir o escopo da trama contada.
Retornando a 1971, mais precisamente ao dia em que Fiona tomou posse do seu lugar como Suprema no clã, abre-se um teaser que trás a presença de outra líder, a Suprema Anna Leigh Leighton. De uma forma um tanto quanto brutal, descobrimos que a troca de Supremas não é nem um pouco auspiciosa, pois sempre que uma bruxa com os Sete Dons surge, ela passa a sugar toda a energia vital da bruxa que a precedeu. Mesmo com este destino macabro, o ainda misterioso Conselho parece ter as ferramentas necessárias para realizar a troca de posições sem que a vida da Suprema mais velha seja destruída, mas já nesta época, Fiona não estava tão disposta a seguir as regras da Academia. O embate entre ela e Anna Leigh é a primeira estrofe de um conjunto de rimas que surgiu durante o episódio. Tudo a partir daqui foi conduzido pelos desejos mais variados e pelos fins mais sombrios para enfim alcança-los, tendo Fiona, Madison, e numa jogada de entrelinhas, a própria Nan, como fio condutor da trama central.
Não sei se foi só eu que notei, mas o desenvolvimento de Queenie e Zoe, pareciam freios mal dados na história de tão destoantes que foram os seus plots. A primeira, por exemplo, rendeu duas cenas interessantes com LaLaurie (divertidíssima ao desmoronar quando soube que um negro era o atual presidente dos Estados Unidos), que infelizmente se perderam logo após a equivocada sequência envolvendo o Minotauro. Não conhecemos Queenie bem o suficiente, para entender o seu sofrimento por não ser amada e convenhamos, faltou sentido ali. Zoe sofreu por um motivo parecido, mas com chances maiores de remediação. Sua história com Kyle continua impressiva e apesar de muitos reclamarem do Evan Peters, eu acho que o ator vem mandando muito bem nos acessos que lhe descrevem como um monstro e nos tristes olhares que despende para Zoe, remetendo diretamente a sua origem inspirada no conto de Mary Shelley. O problema aqui foi o choque pelo choque que a incestuosa relação entre Kyle e sua mãe trouxe. Claro que ainda é cedo para julgar alguma coisa, porém é justo esta possibilidade de mais explicações que torna a incômoda situação da família Spencer, mais aprazível que os desejos de Queenie.
Eu já havia mencionado a questão das duplas de bruxas e foi arrepiante notar que mesmo utilizada num jogo de câmeras ela se fez presente em todo o episódio. Estou falando da consulta de Fiona e Cordelia. Alfonso Gomez-Rejon (já sabem que nunca vou parar de elogiar o cara, né?) sempre tem um dedo na estética visual da temporada e as câmeras mais angulosas, tornando os recintos que deveriam ser espaçosos em locais claustrofóbicos é a pegada da vez. Basta notar que as tristes notícias recebidas por mãe e filha sobre os seus respectivos futuros são conduzidas num travelling ressonante que se completam indistintamente, arrepiando pela penosa reação das duas após o diagnóstico dos médicos. Da mesma forma, o tal travelling, retorna no momento em que Cordelia vai pedir ajuda a Marie Laveau, e a bruxa passa a explicar o feitiço de fertilidade (alguém mais se lembrou da concepção montada por Polanski em O Bebê de Rosemary?). É este apuro técnico que engrandece AHS mesmo em suas horas mais problemáticas.
Chegamos então ao que realmente me animou no episódio. A caminhada de Madison e Nan para receber o novo vizinho, entregou uma peça-chave do quebra-cabeça sobre a nova Suprema. Muitos (inclusive a própria Fiona) cantaram a bola de que Madison seria a substituta, pois na discussão entre ela e a beata Joan Ramsey, a bruxinha telecinética mostra o dom da piromancia. Claro que inúmeras outras semelhanças entre Madison e Fiona pareceram entregar o jogo. Porém, a informação dada por Anna Leigh de que até cinco dons seriam possíveis para uma bruxa florescida, torna a indolente decisão de Fiona no maior erro que ela poderia ter cometido. O monólogo da dança logo no início do episódio entrega que Nan tem outro dom além da clarividência. Um dom que pelo que foi mostrado até aqui, aparenta ser exclusividade da Suprema, falo da habilidade de conquista, ou vocês acham coincidência Nan dizer que consegue encontros o tempo todo e são os garotos que vão atrás dela para tal? Isto também explicaria o fato de Luke, não ter nem dado bola para Madison vestida de femme-fatale.
Abrindo mão de uma personagem incrível logo no começo de sua história, Coven também mostra em sua sequência final, que não está para brincadeiras e que Fiona é capaz de ir mais longe do que qualquer um para manter o seu trono. Até quando ela conseguirá sair impune, ainda não dá para saber. O que podemos notar, é que mais e mais, a egocêntrica noção de plenitude que ela sustenta, vai atraindo inimigos poderosíssimos. Agora sim o clã está ameaçado, não por qualquer um, mas pelos tristes erros de sua desejosa Suprema.
P.S.: Spalding não deve durar muito, mesmo não podendo falar. Guardar segredos de uma Suprema inconsequente não é uma boa escolha.
P.S.2: Misty e sua solidão foi bem triste. Torcendo para que Zoe cumpra suas promessas e volte para um jantar com a bruxa.
P.S.3: Marie Laveau no tablet! Quem não riu? São estas liberdades criativas que divertem. Não referências macabras a possíveis cenas de zoofilia.
Adoro seus textos
Oww Tainan, obrigado pelo elogio! *_*
Otimo texto! Eu tb desconfio que a Madison não seria a próxima suprema, mas que ela tem sim 5 poderes e quem sabe o da necromancia? Afinal foi ela quem fez o feitiço que ressuscitou o garoto…e assim como a Misty, a Madison pode aparecer vivinha e buscando vingança? Mas se ela não morreu, seria interessante ela ser mesmo a próxima suprema… sei lá, são só algumas das várias teorias malucas que eu tenho.
Boa teoria Mariana, mas eu ainda acho que o lance da Necromancia veio mais da Zoe do que propriamente da Madison, o Kyle mesmo só despertou quando a Zoe deu o beijo nele e foi nesta hora que a Misty se sentiu atraída para o necrotério. Mesmo assim, a Madison ainda tem uns 4 dons. Eu vou estar apostando na Nan por enquanto, e acredito que quando o Conselho der realmente as caras na série, vamos saber mais sobre quais dons são necessários para se determinar uma nova Suprema. Assim espero. Valeu pelo comentário, de verdade.