Veja como clássico O Mágico de Oz influiu na filmografia de David Lynch e na de John Waters também
É comum entre os aficionados por cinema considera que O Mágico de Oz é a obra mais bonita da história do cinema. Cinéfilos, estudiosos e especialistas costumam falar isso e não é à toa, já que o longa de 1939 traz para a tela colorida um musical absurdo e lúdico, que traduz muito bem o ambiente fantástico de L. Frank Baum.
A obra é influente até hoje, não à toa Wicked e Wicked Parte Dois são grandes sucessos do cinema mainstream, mas a influência do filme que a MGM entregou vai além até do que se considera cinema fantástico e infantil, invadindo o onírico e impressionante cinema do mestre David Lynch.

Nesse artigo buscaremos falar brevemente da influência de O Mágico de Oz sobre o cinema do criador de obras como Eraserhead, Homem Elefante, Twin Peaks e Coração Selvagem.
Também falaremos brevemente sobre a obsessão de outro cineasta com a Bruxa Má do Oeste.
Um pouco sobre Lynch
David Lynch é um dos diretores mais elogiados do cinema norte-americano, com filmes cujo tom é poético e onírico, recaindo em atmosferas cuja compreensão é diferenciada.
O diretor jamais gostou de falar sobre quais são as intenções ao fazer seus filmes, sempre foi avesso a explicar as formas como sua arte se desenvolve, cresce e é tornada pública.
Era arredio a falar sobre as próprias interpretações para o que se costumava chamar de surrealismo típico, fosse em seus filmes ou em suas séries.
Curiosamente ele amava falar das referências que sua filmografia fazia a mitologia de Baum. Ele sempre considerou um referencial cultural a obra que era O Mágico de Oz, sobretudo o filme que Victor Fleming dirigiu.
Além das questões temáticas, como o uso de humor ácido como válvula de escape em momentos tensos, o apelo ao absurdo e a dupla identidade de personagens/atores em mundos distintos.
Isso se vê muito facilmente nos filmes e derivados, Coração Selvagem - certamente o mais reverencial ao mito de Dorothy Gale - e em Twin Peaks sobra humor pesado, que ajuda a destravar os dramas suburbanos propostos.
O apelo ao absurdo está em Erasearhead e Homem Elefante e o uso de identidades duplas estava com Laura Palmer e sua prima Maddy Ferguson, no primeiro tomo de Twin Peaks, além dos doppelgangers em Twin Peaks: Return.
Também se nota um apelo ao fantástico em Veludo Azul e um convite a um mundo diferenciado no sensacional Cidade dos Sonhos.
Sapatos e o documentário
Uma questão pontual e bem óbvia dessa obsessão mora na inserção constante de sapatos vermelhos nos personagens lynchianos.

Dorothy utilizava sapatos prateados nos livros, mas Fleming e sua equipe mudaram para sapatinhos de rubi, a fim de aproveitar as cores vibrantes que o Technicolor era capaz de produzir.
Da sua maneira, Lynch enfiava personagens femininas, que propiciavam bons planos detalhes nos pés.
Além das referências óbvias, há um estudo publicado em vídeo que é bastante curioso. Trata-se de Lynch/Oz, filme que explora a simbiose entre O Mágico de Oz e o cinema do realizador.
No filme dirigido por Alexandre O. Phillippe o documentário se debruça em como esse conto de fadas feito na América ajudou a estabelecer o surrealismo no modo de contar histórias de Lynch.
Palco e o verde
O filme inicia curioso, com um palco colorido, onde surge uma fumaça verde, em atenção a Bruxa Má do Oeste e a personagem que recebeu o nome de Elphaba em Wicked.

Após um clipping de filmes do diretor, se compara O Mágico de Oz e A Felicidade Não se Compra, pegando carona no fato de ambos terem sido fracassos no cinema, que foram resgatados em reprises televisivas.
A grande ideia do documentário é mostrar como Lynch gostava de levar o público a enxergar além da superfície, por isso suas temáticas eram universais, mas carentes de maiores explicações, apelando para o especulativo, hipnótico e claro, o onírico.
É por isso que ele não gostava de explicar, segundo o documentário, uma vez que isso tirava a agência do público.
O espectador já é um personagem passivo nessa relação, então exibir as engrenagens de suas máquinas seria péssimo, pois revelaria os segredos sem o esforço do público para alcançar isso.
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O lado escuro e o lado claro
O documentário é bastante rico, vale até uma análise mais aprofundada em um artigo à parte. Destacamos um ponto desse, que tem a ver com a filiação da obra.
Ora, O Mágico de Oz é conhecido por ter um lado sombrio, tanto que a vilã é atualmente uma das figuras heroicas do cinema musical recente - e foi assim também no teatro grandioso da Broadway - mas Lynch escolheu justamente o oposto, para demarcar em seus filmes.
Não há como achar que o cineasta gosta de apelar ao otimismo ou a positividade, já que, normalmente, ele exibe em seus fotogramas um mundo sem conforto, triste, bucólico e até depressivo. A parte que ele "copia" Baum e Fleming é justamente a parcela colorida, divertida e animada.
No aviso inicial do filme da MGM, se louva a jovialidade de coração e a gentileza.
Não é à toa que Dorothy valoriza o local onde mora, repetindo a máxima de que "não há lugar como nosso lar".
Isso está presente em Twin Peaks e nos filmes de David. Todos os personagens, por mais estranhos e pitorescos que sejam, buscam uma normalidade, um lugar seguro, ou seja, um lar bom para retornar.

Dessa forma, não é só Dorothy que quer se aventurar e voltar para casa, mas também Dale Cooper, que é um agente federal dos EUA, em uma cidade pequena tomada por medo, que quer restabelecer o lado correto da vida, para enfim voltar para casa, para o seu esconderijo, onde estaria seguro.
Bonustrack: John Waters e Oz
Vale destacar também a proximidade e fascínio que O Mágico de Oz provocou em John Waters.
O autor conhecido como Papa do Trash é assumidamente gay e dedicou seu trabalho cinematográfico a exemplificar os diversos espectros do que forma a sigla LGBTQIA +.
John Waters tinha verdadeira fascinação pela Bruxa Má da Oeste e a partir dela, começou a desenvolver uma obsessão por figuras semelhantes, como a madrasta de Cinderela, Capitão Gancho em Peter Pan e a garotinha maléfica em A Tara Maldita.
Tal qual Lynch, Waters é um diretor de filmes excêntricos e que merecem análises por si só. Um dia nos debruçaremos sobre elas, embora já tenhamos falado de Mamãe é de Morte.
Possivelmente é em Female Troubles a maior referência a Oz, na personagem de Divine, a contumaz parceira de Waters em seus filmes.

Aqui se troca as vestes pretas da Bruxa por um vestido de onça, bizarro e pesado, que cai bem em Divine, mas a fala para as "mocinhas" dos filmes é a mesma, se comparando as crianças a pequenos abortos.
JW era menos sutil que Lynch, tanto que apelou sim para o lado mais escuro dos romances de Baum, mas ainda assim se nota um fascínio pela cor do filme de Fleming, além de um louvor para uma arte mais pujante, do final dos anos 1930 e começo dos 1940, em detrimento do conservadorismo tosco de 1950.
Esse ódio aos retrógados anos cinquenta é comum entre os dois realizadores, aliás. Ambos são fruto da rebeldia que seria demarcada também pelo surgimento do Rock´n Roll e pelo cinema de ambos.
A parte positiva em obras transgressoras como Pink Flamingos e Clube dos Pervertidos, tem tudo a ver com a visão abrangente sobre sexualidade que o Mágico de Oz faz.
Isso se vê até nos filmes mais inocentes de Waters, como Polyester, que poderia facilmente se passar no Kansas de Dorothy ou em Pecker: O Preço da Fama, que explora o lúdico mundo de um fotógrafo encantado com um novo mundo.
Oz e o LGBT
É curioso que hajam boatos sobre uma nova versão de O Mágico de Oz com personagens assumidamente gays, uma vez que é difícil enxergar algum dos quatro protagonistas longe de um dos espectros da teoria queer.
Se a Hollywood conservadora, piegas e cafona não enxerga assim, Lynch e Waters, sabiam de todas essas questões e cada um à sua forma e é salutar como uma obra infantil consegue influir tanto em dois tipos de cinema completamente avessos a inocência típica dessa fase da vida.
Em breve retornamos, com mais explorações ligadas ao livro de Baum e ao filme clássico.
Especial O Mágico de Oz e Wicked
Artigos:
O guia para O Mágico de Oz e Wicked, Parte Um: Os capítulos de Frank L. Baum e os 40 livros famosos de Oz
O guia para O Magico de Oz e Wicked, Parte Dois: Os filmes de Oz, até o clássico de 1939
O guia para O Magico de Oz e Wicked, Parte Três: A influência da mitologia de Oz no cinema de David Lynch
O guia para O Magico de Oz e Wicked, Parte Quatro: Os livros de The Wicked
Crítica:
O Mundo Fantástico de Oz, por Filipe Pereira
Oz: Mágico e Poderoso, por Wilker Medeiros
Podcast:
Alerta Vermelho 34: O Mágico de Oz







This is a fascinating analysis of how The Wizard of Oz continues to influence cinema far beyond its original genre. The connection to filmmakers like David Lynch and John Waters really shows how deeply the film’s dreamlike imagery and surreal tone have shaped modern visual storytelling. It’s impressive how a 1939 musical can still inspire such bold, unconventional cinema today. Drawing parallels across different creative fields like this even reminds me of how unexpected influences can impact things like gaming performance, where atmosphere and imagination play a huge role.