Mesmo com uma história rasa e personagens pouco cativantes, o novo filme de Spielberg consegue ser uma boa diversão
Steven Spielberg já virou uma verdadeira instituição entre o público cinéfilo, especificamente, entre os mais nerds. Também pudera, pois, ele foi responsável por praticamente dar vida aos blockbusters, lá na década de 70, com Tubarão, e continuou nessa jornada com filmes memoráveis, como Indiana Jones e o Templo da Perdição e Parque dos Dinossauros.
Nos últimos anos, porém, ele vinha se firmando mais como um diretor “sério”, visitando o mundo da fantasia só de vez em quando (como nos apenas simpáticos As Aventuras de Tintim e Meu Gigante Amigo). Foi, então, que surgiu a oportunidade do diretor voltar aos tempos áureos nesse tipo de universo com a adaptação de um livro recente muito popular, e que ainda faz diversas homenagens à cultura pop como um todo.
E, de fato, a empreitada funcionou (em termos).
Não há como negar que Spielberg sabe, como poucos, imprimir um forte senso de aventura em suas obras, e a experiência na direção se comprova aqui. São mais de duas horas que correm de maneira bastante fluida, empolgando o espectador em muitos momentos, e trazendo uma pitada de reflexão em outros.
Porém, a “cereja do bolo” está mesmo em homenagear a cultura pop em suas mais diversas formas. A história de um jogo de realidade virtual criado por um solitário idealista e apaixonado por tecnologia faz menção clara a Steve Jobs.
Mas, não só: a partir do momento em que essa realidade virtual é “povoada” por diversos “avatares” que as pessoas podem escolher, temos aqui a aparição de alguns personagens icônicos, como o robô de Gigante de Ferro, ou até mesmo uma das protagonistas pilotando a moto da animação Akira.
O desafio proposto pelo dono do jogo é a desculpa perfeita para termos um contraste entre a realidade que as pessoas vivem (muitas vezes, dura e cruel), com a ficção proporcionada por uma vida dentro do computador. E, é aí que reside o grande defeito de Jogador Nº 1.
Ao contrário de Minority Report, onde o mesmo Spielberg soube explorar bem a premissa de um futuro dominado por uma tecnologia fascinante, aqui, o bom argumento dá lugar a pinceladas muito rasas envolvendo certas questões sociais, e que mereciam ser melhor exploradas.
Claro que estamos falando de um típico blockbuster, e certos assuntos não precisam de um enorme aprofundamento nesse tipo de filme, porém, se a premissa está lá, pronta pra ser trabalhada, por que não utilizá-la de uma forma que vá além do óbvio?
Vemos, por exemplo, que existem castas sociais muito bem delimitadas nesse novo mundo, pessoas utilizando “avatares” bem diferentes delas na vida real (o que denota a preocupação exacerbada com a questão da aparência) e um regime de notória escravidão, pois quem fica em dívida com a empresa dona do jogo, precisa trabalhar como se estivesse em uma prisão.
Porém, tudo isso é exposto de maneira bem clichê e pouco impactante na tela (o primeiro filme da franquia Jogos Vorazes, também um blockbuster, foi bem mais eficiente nesse sentido), mostrando tudo quase que de maneira formulaica, hermética.
Só que, além da história e da construção desse universo serem passadas pra gente de uma forma um tanto óbvia demais, os personagens também não são marcantes e carismáticos o suficiente. As motivações pessoais de alguns até convencem, mas, no geral, quase não nos importamos com o destino deles, o que, para uma aventura, não é nada bom.
Porém, não há como negar que, mesmo com uma trama um tanto pobre e previsível e com personagens sem sal, enquanto o filme se desenrola, ficamos grudados na tela o tempo todo, principalmente, devido aos espetaculares efeitos visuais, que dispensam comentários.
Há também, claro, a divertida tentativa em encontrar todos os “easter eggs” presentes na trama, alguns bem evidentes, outros, não. Um dos mais legais é, sem dúvida, a homenagem ao clássico do terror O Iluminado, que, por sinal, é um dos filmes preferidos de Spielberg. Vale também destacar algumas menções bem rápidas a O Exterminador do Futuro 2 e a Parque dos Dinossauros (numa espécie de “auto-zoação” do próprio Spielberg).
Mas, tirando toda a diversão relacionada às homenagens com a cultura pop, e aos efeitos especiais realmente fascinantes, infelizmente, não temos aqui uma história suficientemente forte, e, tão pouco, personagens que vão ficar em nossa memória, como, ironicamente, os que são homenageados aqui ficaram na nossa mente até os dias de hoje.
Jogador Nº 1 é a “aventura da semana” um pouco acima da média, e um deleite para nós, nerds de plantão. No entanto, não vai além disso.
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