
Sangue de Irmãos é um filme de drama e ação lançado em 1968. Essa é uma obra da Paramount Pictures lida com assuntos espinhosos, relacionados ao crime organizado e que foi um grande fracasso, tão fracassado que quase inviabilizou um grande clássico do cinema.
Longa de Martin Ritt, tem roteiro de Lewis John Carlino e é produzido por seu ator principal, Kirk Douglas.
A história trada de dois irmãos, que herdaram a liderança de uma organização criminosa de seu pai.
O caçula acaba de voltar para casa depois do serviço militar no Vietnã, mas ao invés de seguir a própria vontade, acaba cedendo a tradição familiar, sendo obrigado a viver o contrário, já que é envolvido em uma rede de crimes e intrigas.
Acaba sendo lentamente atraído de volta para aquele mundo e com o tempo, ele entra em rota de colisão com o irmão mais velho, desenvolvendo assim uma série de problemas terríveis.
Dito assim, essa história parece demais a parte que cabe a Michael Corleone no início do livro O Chefão (The Godfather) de Mario Puzo e obviamente, com o filme O Poderoso Chefão.
É inegável que há muitos elementos em comum nas duas obras que a Paramount fez.
A péssima recepção
Como é bem sabido, quando este foi lançado, não foi muito bem nas bilheterias.
Esse foi um dos motivos para que os estúdios relutasse em fazer mais histórias de crime organizado, incluindo até o filme dirigido por Francis Ford Coppola, lançado quatro anos depois.
Parte do fracasso foi atribuído à noção de que Kirk Douglas e Alex Cord não conseguiriam retratar de maneira confiável a estética física e o temperamento singular dos sicilianos.
Já Douglas pensava diferente, até gostava do fato de não parecer um "carcamano".
Ele imaginou que seria uma oportunidade de estender o leque de tipos de papéis em sua carreira, até insistiu para ele mesmo produzisse o filme sozinho.
Curiosamente, quatro anos depois, Marlon Brando alcançaria o prêmio que Douglas buscava, já que venceu o prêmio da academia por meio de Don Vito Corleone de O Poderoso Chefão, enquanto Douglas só recebeu críticas negativas pela obra.
Produção estadunidense, a obra estreou primeiro no Canadá, em dezembro de 1968, em Ontario. Passou em premiere em Los Angeles, no natal de 1968.
Na Áustria chegou em 1969, também passou em Nova York em 16 de janeiro de 1969, na França em 31 de janeiro de 1969.
O título original do longa é The Brotherhood. Teve como nome de trabalho The Hoods.
No Uruguai se chama Los hermanos sicilianos e Mafia, na Brasil também foi chamado de A Irmandade.
Na Áustria é Auftrag Mord, no Canadá e França é Les frères siciliens, na Dinamarca é Mafia-brødrene, na Finlândia é Mafiaveljekset, enquanto na Itália é La fratellanza, em Portugal é Dois Irmãos Sicilianos.

O filme foi gravado em setembro de 1967, com filmagens em Manhattan, em Nova York, no Filmways Studios - 246 East 127th Street, no East Harlem, além de cenas em Palermo, na Sicília, em Godrano e Punta Raisi.
Os estúdio foram a Brotherhood Company, com distribuição da Paramount Pictures, a Paramount British Pictures lançou o longa no Reino Unido enquanto a Paramount Filmes fez a distribuição em Portugal.
Quem Fez:
Martin Ritt dirigiu A Mulher do Próximo, O Mercador de Almas, O Indomado, O Espião que Saiu do Frio, Norma Rae.
Lewis John Carlino escreveu O Segundo Rosto, Assassino a Preço Fixo, Crazy Joe, Ressurreição, Primeiro Verão de Amor, dirigiu O Marinheiro que Caiu em Desgraça com o Mar, O Grande Santini: O Dom da Fúria e Uma Questão de Classe.
Douglas atuou em dezenas de sucessos, é lembrado por Glória Feita de Sangue e Spartacus, ambos com Stanley Kubrick, além de Gigantes em Luta, Exterminação 2000 e Nimitz: De Volta ao Inferno.
Foi um artista muito prolífico, com dezenas de créditos de atuação. Teve uma vida longa, vivendo até os 103 anos.

Ele produziu alguns filmes, como Glória Feita de Sangue (ainda que não tenha sido creditado como) a série Os Vikings, Árvore da Solidão e O Farol do Fim do Mundo, foi produtor executivo em A Lei do Oeste, Vikings: os Conquistadores (sem crédito também) e Spartacus
Também foi diretor em obras como As Aventuras de um Velhaco e Ambição Acima da Lei.
Narrativa
A história se inicia em um passeio de carro, onde Vince Gianetta está.
Seu veículo passa por lugares turísticos Itália, mas especificamente em Palermo.
O carro passeia por diversos cenários, como se estivesse em uma viagem tipo tour, uma andança turística pelo país italiano, faz isso até começar a se aproximar de uma localidade interiorana e isolada, onde está o seu irmão mais velho Frank Ginetta.
Vincent é Alex Cord, ator conhecido por A Última Diligência e Águia de Fogo. Já seu irmão primogênito é o personagem de Douglas.
Quando Vince anda pelo terreno arenoso da Sicília, é salvo graças a interferência de seu parente, que ordena os seus homens para que o sujeito não seja alvejado pelos bandidos locais.
O encontro, na casa da família
Os parentes se recolhem a um lugar particular, em uma casa antiga.
No lugar, a esposa de Frank, Ida (Irene Papas) indaga o marido sobre o motivo do irmão estar ali. Ela parece ser a única personagem a enxergar o óbvio.

Ao longo do filme fica claro que ele está ali por um motivo, provavelmente ligado ao seu trabalho criminoso.
Essa parte é mostrado apenas o lado bom da visita. Não há mais indícios de que haveria uma trama intrincada e de traição, ao contrário, tudo parece bem óbvio, fugindo de qualquer caráter duplo.
A violência
Nos filmes de máfia dos anos 1930 e 40 havia uma certa limitação com relação a demonstrações da violência.
Seja em Alma no Lodo, O Último Gângster ou O Destino de um Gângster não demonstrações claras sobre a violência que ocorria nas ruas dos Estados Unidos, causada especialmente por filhos da pátria italiana.
Fosse a época que fosse a constante era a violência e truculência, mas havia sempre uma sinalização de suavizar a agressividade.
Aqui se pode mostrar isso, inclusive ocorre uma cena disruptora logo no início, onde bandidos pegam um sujeito, batem e depois amarram ele na rua. Essa cena é filmada de maneira distante, com a câmera em uma distância considerável.
O tom da sequência prima por um caráter impessoal, não fica claro se é essa a intenção do realizador, mas é a impressão que fica.
No entanto, esse caráter distante muda drasticamente, logo depois. O sujeito morto é colocado no chão, abrem a sua boca e colocam um pinto (um filhote de galinha) em sua boca.
Nesse ponto, há um close em seu rosto, já desacordado e machucado.
O Casamento
Não demora para que a trama retorne ao passado, em uma sequência que ocorre no casamento do jovem Vincent, justo com Emma Bertolo (Susan Strasberg) a herdeira de um império criminoso, que origem napolitana.
Ou seja, essa não é uma relação matrimonial qualquer, mas sim um casamento que se assemelha aos acordos pré-arranjados, típicos dos séculos passados, onde famílias poderosas juntavam seus filhos, para aumentar os laços de poder.
Aqui é uma questão estratégica, que reúne um siciliano e uma napolitana.
Curiosamente, na festa em si quase não se utiliza uma palavra em italiano, nem em siciliano, pelo contrário, até falam Mazel Tov, que é um cumprimento judeu, que em hebraico, significa "boa sorte".
A caracterização porca
Os produtores não estavam muito preocupados em representar bem como é a família italiana típica. Vendo em perspectiva, esse momento pode ter causado em Mario Puzo e Coppola a atenção para não representar mal o casamento da filha do Don.
É sabido que ambos os roteiristas de O Poderoso Chefão, insistiram para que a cena inaugural do filme fosse grandiosa e pomposa.
Dessa forma, o casamento de Connie tem uma longa duração, com muitos extras, muitos figurantes e muita música italiana, além da distribuição de muitos pratos típicos da cozinha do país.
Nesse Sangue de Irmãos, o que se vê é o inverso, não há cuidado para bem representar um povo estrangeiro. São apenas os estereótipos que diferenciam um papel do outro.
O regresso da guerra
Antes do matrimônio, Vinnie é mostrado como um veterano do conflito do Vietnã.
Ele lutou como mero alistado no país asiático, é um estadunidense médio, um homem com orgulho de sua pátria, que brada América o tempo inteiro.
Há momentos onde ele até briga com o irmão, que insiste em colocar palavras italianas nas conversas.
A união de Vinnie tem a ver com o pai da noiva, que é Dominick Bertolo (Luther Adler) um chefe da máfia, que lembra o irmão do noivo, Frank.
No casamento há gente prestando homenagem, outros criminosos regionais como os líderes da máfia Egan (Murray Hamilton), Rotherman (Val Avery) e Levin (Alan Hewitt), que são os equivalentes a Frank e Dominick, cada um em sua "família" específica.
Contradição entre irmãos:
A diferença básica entre Vince e o Michael Corleone de Al Pacino é que, apesar de ambos os protagonistas serem veteranos de guerras, com capacidade de pensamento crítico, estudo e traquejo, o personagem desse filme não quer ir para Boston e não pretende trabalhar em qualquer evento ou negócio longe.
Vicent está decidido em trabalhar com o irmão.
A princípio, Frank fica reticente. Imagina que será um desperdício, mas depois fica feliz, diz que será uma honra trabalhar em família. Os dois se reúnem em torno do mesmo objetivo, o que bate de frente com a vontade da recém esposa de Vince.
Os conflitos com Emma
Emma diz para ele se afastar. Seu marido finge que estará com Fran somente por um tempo, mas ela percebe que é uma mentira, sabe que ele quer isso também.
Sua atitude de reprovação resulta nela falando que não quer saber de nada. É curioso, já que em qualquer outra história de crime organizado esse tipo de discussão sequer existiria.
A ideia de preservar cônjuges é antiga, justamente para não correr o risco da pessoa ser pega, interrogada ou torturada.
Em qualquer obra sobre a Máfia, seja nos EUA, na Itália ou em outro lugar, é comum que as esposas não saibam das ações do marido. É essa a mentalidade que Vince tenta empregar.
O ramo dos Ginetta
Não fica muito clara qual é a atuação criminosa dos Ginetta. Não se fala e nem é mostrado como eles mantém a própria família.
Em alguns filmes que abordam a temática mafiosa, se mostra os personagens bandidos como anti-heróis e nesses até se entende esconder os crimes, afinal, os personagens são feitos para parecerem simpáticos.
Não é o caso aqui, Frank e Vince são pessoas falhas, flertam até com a condição de vilania, sendo da mesma estirpe de tantos outros filmes de Máfia antigos, como Inimigo Público, Alma no Lodo ou Scarface: A Vergonha de uma Nação ou O Último Gangster.

Sobre a linguagem:
Nas cenas da Itália, os personagens se negavam em falar em italiano ou siciliano, mas uma vez que estão nos Estados Unidos, Frank fala meia dúzia de palavras no idioma latino e isso é o suficiente para que os irmãos briguem.
Curioso que isso ocorra aqui, já que boa parte das críticas ao filme moravam exatamente no fato de Kirk Douglas não parecer nem um pouco um italiano típico.
O irmão mais novo acha errado se comunicar desse jeito, já que eles são americanos.
Frank por sua vez é mais tradicionalista, relembra que no passado, era comum que houvessem infiltrados italianos em sindicatos, juizados e afins.
Por isso, acha bom demarcar território, não esquecendo sua língua mãe. O que o roteiro tenta emplacar é que a ideia dele é a de preservar a própria cultura, mas o texto é raso e não consegue ser claro nisso.
A reação do personagem é exagerada, a discussão é artificial. Não há impacto emocional, nem quando cenas gritantes ocorrem, como o momento em que um senhor idoso vai cuspir no morto, justamente no momento do seu enterro.
A reunião de cúpula e as caricaturas
Uma questão que incomoda é o modo como os "padrinhos" são retratados aqui.
Os chefes da Máfia são mostrados como senhores caquéticos e enrugados, homens que tentam disfarçar sua velhice e feiura com ternos de linho, óleo no cabelo o chapéus.
Denunciam que Dominick Bertolo entregou alguns homens da família. Dessa forma, ele deveria morrer.
O velho Don Peppino (Eduardo Cianelli) dá a Frank um papel, uma ordem de matar o sujeito e beija os seus lábios, mas o personagem de Douglas ignora isso, afinal, o sujeito é sogro do seu irmão.
Esse seria o motivo de Vincent ter sido enviado para a Sicília, embora se fale pouco sobre isso na trama. Curioso como o texto é expositivo em diversos momentos, mas nesse, não, não ficando claro como Vince foi convencido a ir com intenções malignas junto ao irmão.
Os momentos derradeiros:
Os instantes finais incluem uma discussão áspera dos irmãos, a respeito de como se deveria conduzir os negócios, com Frank sendo nervoso, não sabendo se impor sem gritar ou agredir, enquanto Vince até tenta se valorizar a própria presença e voz, mas de maneira nada convincente.
O caçula acaba recebendo um golpe na face, dado por seu irmão, após o mesmo ameaçar tomar as rédeas da situação.
Entre tramoias, traições familiares, obediência e rebeldia , o filme termina sua última meia hora, mostrando atos de violência, em cenas comedidas e tímidas.
A partir daqui falaremos das curvas finais, com spoilers, sobre esses instantes.
O aviso está dado.

Vince e Frank enfim se reencontram, agora em lados opostos.
Fica claro qual é a intenção do caçula. Ele foi para a Itália com uma missão, já que seria a única pessoa que poderia se aproximar de Frank.
A reação do primogênito é inesperada. Ele topa se entregar como sacrifício, pensa mais no fraterno do que em si, o que é curioso, já que ambos são filhos de um mafioso, com Francesco sendo ainda mais orgulho que Vincenzo de suas origens.
Ele tem amor pela tradição siciliana e a forma como ele se "auto" imola faz pensar que o seu intento era suicida desde o início. Pode sobrar nele a vontade de não viver mais e a escolha por ser um criminoso tão violento pode revelar sim uma forma de correr riscos deliberadamente, se pondo como alvo da morte sempre.
Frank termina beijando Vince, aceitando sua sina, dizendo que tudo ficará bem, se comparando ao seu pai, que ser foi mostrado.
É inegável que esse roteiro é uma tentativa de replicar o conto bíblico de Caim e Abel, em uma versão gângster, mas fugindo de qualquer iconografia comum a esse tipo de filme.
Esse talvez seja o único argumento feliz e inteligente de Sangue de Irmão, que resulta uma obra com potencial, mas que jamais alcança o ápice de sua condição, nem minimamente. Vale assistir pelo esforço de Douglas e por algumas das temáticas, que sugerem muita coisa, mas desenvolve quase nada.