Um Balde de Sangue : Um libelo do cinema B que reúne Roger Corman e Dick Miller

Um Balde de Sangue : Um libelo do cinema B que reúne Roger Corman e Dick MillerUm Balde de Sangue é um filme curioso da filmografia do mestre do cinema B, Roger Corman. Lançado em 1959, é comumente confundido com outras obras do realizador, é lembrado por ser protagonizado por Dick Miller, contumaz parceiro do realizador.

A história foca na vida e obra de Walter Paisley, um garçom de um bar retrô, que tenta impressionar uma colega de trabalho com obras de arte feitas por ele próprio, manufaturando essas de uma forma um tanto macabra.

Aos poucos, ele traz esculturas para o bar frequentado por artistas beatniks chamado The Yellow Door, onde o mesmo trabalha, mas essas tais obras tem uma origem funestra.

Fica bem evidente que o sujeito não tem intenções malignas, mas rapidamente a cousa sai do seu controle e ele passa a cometer atos maléficos bizarros, em uma rotina irônica e bizarra, típica dos filmes que Corman entregava nos anos 1950.

O desejo do personagem de ser elogiado e adulado o inebria e vai conduzindo a história para um lado pitoresco, sendo assim bastante mortal na feitura da sua arte.

Dirigido por Roger Corman, o longa foi rodado sem cores, tal qual a maioria desses episódios iniciais de sua filmografia. Ele foi escrito pelo contumaz parceiro do cineasta Charles B. Griffith. Corman produz e são produtores executivos não creditados Samuel Z. Arkoff e James H. Nicholson que aqui, aparecem com crédito de "presents".

Esse foi um dos primeiros filmes de terror já feitos, especialmente se levar em conta a definição de Terror como filmes amedrontadores e sem ação espiritual, como as obras de assassinos em série, como Giallo e Slasher Movies. Há quem considere ele uma espécie de slasher não muito sério, bem-humorado e quase cômico, embora não tenha tantas piadas.

Ele estreou em outubro de 1959 nos Estados Unidos, em dezembro de 1960 no Peru. No México em 61, Alemanha Ocidental e Áustria em 1962.

O filme se originou de uma ideia da American-International Pictures, que abordou Corman para dirigir um filme de terror para eles, mas deu a ele um orçamento pequeno e uma programação de gravação extremamente limitada.

Corman aceitou o desafio, mas não estava interessado em conduzir um filme de terror tradicional, então ele e Griffith criaram o conceito de criar uma comédia de humor negro. Os dois desenvolveram a ideia e o esboço básico do filme em um dia, depois de passar alguns dias pesquisando, em cafés na Sunset Strip para fazer "pesquisas" sobre os personagens beatnik que criariam para este filme.

O título provisório do filme era The Living Dead, mas acabou sendo A Bucket of Blood.

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Na Argentina é Un Cubo de Sangue, em outros países de língua espanhola, também pode ser encontrado como El Falso Escultor, Una Galleda de Sang e Un Cubo de Sangre. No idioma francês, pode ser encontrado como Un Seau de Sang e Un baquet de Sang, em italiano é Un Secchio di Sangue. Se chama O Balde de Sangue em Portugal.

O filme foi rodado em cinco dias com um orçamento de apenas US$ 50.000. Foi rodado na Califórnia, entre Los Angeles, Venice e Venice Beach.

O estúdio que financiou Corman foi a Alta Vista Productions, com distribuição da American International Pictures.

Corman dirigiu Ameaça Espacial, A Ilha do Pavor, Os Reencarnados, Guerra dos Satélites, e diversos outros antes desse Um Balde de Sangue. Depois conduziu Solar Maldito, Loja dos Horrores, O Poço e o Pêndulo, Solar Maldito todos filmes no âmbito do terror/horror, depois trouxe as obras sobre motoqueiros Os Anjos Selvagens e Anjos do Inferno.

Anos depois, seria produtor em diversas obras, como Demência 13, Capone, o Gângster, Corrida da Morte: Ano 2000, Carnossauro etc.

Griffith escreveu Ameaça Espacial, Os Reencarnados, Mulher Sem Rumo, A Besta da Caverna Assombrada.

Arkoff fez muitos filmes, mas é lembrado especialmente por Reptilicus, Terror em Amityville, Vestida Para Matar e Q- A Serpente Alada. Já Nicholson participou de filmes como Pânico no Ano Zero, Boneca Explosivas, Frankenstein Contra o Mundo e A Máquina de Bikini.

Embora Dick Miller seja um ator bastante reconhecível, já que apareceu em mais de 100 créditos de cinema, esse é um dos únicos três filmes em que ele teve um papel principal, sendo os outros Rock All Night de 1957 e Guerra dos Satélites, de 1958.

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Ele fez A Mulher de Oklahoma e a série Os Intocáveis. É bastante lembrado por participações em filmes mais famosos, como Gremlins, O Exterminador do Futuro, Os Demônios da Noite e Pequenos Guerreiros.

Esse Um Balde de Sangue ficou tão marcado na carreira do ator que eventualmente se repetia o nome dele em outros papéis. Ele interpretou outros quatro personagens chamados Walter Paisley, em Hollywood Boulevard de 1976, no filme de lobisomem Grito de Horror de Joe Dante - que aliás, vivia empregando o artista - em No Limite da Realidade de 1983 e em Robôs Assassinos de 1986.

Na época do filme, se falava que o ator estava insatisfeito com o impacto do baixo orçamento no filme. Ele achava que a obra tinha um grande potencial, até para se tornar um clássico, gostou do roteiro e das atuações, mas sentiu que a falta de orçamento enfraqueceu os melhores momentos do filme, especialmente a conclusão, que poderia ser mais impactante, caso houvesse dinheiro para efeitos especiais.

Uma das artes de pôster resume parte da trama. O material de divulgação original é acompanhado de uma série de histórias em quadrinhos que sugeriam a parte macabra do script.

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Os cenários desse longa foram reaproveitados em A Loja dos Horrores, obra que Corman faria no ano seguinte, em 1960. Eles já haviam sido utilizados em The Diary of a High School Bride de Burt Topper, também de 1959.

Na época do lançamento, havia uma promoção nos anúncios da seção de filmes do jornal que ofertava uma entrada gratuita se a pessoa levasse um balde de sangue para a administração dos cinemas, na bilheteria dos mesmos. Isso era obviamente uma piada, não houve registro de que alguém levou.

A narrativa começa em um cômodo, estilo bar ou restaurante. Um homem barbudo, Sr. Maxwell H. Brock, personagem de Julian Burton recita uma poesia, enquanto Walter Paisley recolhe peças de louças pela mesa.

O público em torno de Maxwell riu, provavelmente sem que isso estivesse no roteiro. Burton chegou no local elegante, de smoking, mas sem sapatos. Calçava sandálias e isso fez o elenco e figurantes rirem.

Isso poderia ser encarado como uma piada, mas na verdade Julian Burton estava com os pés inchados, justamente por usar chinelos constantemente e não tinha escolha a não ser usá-los nessa cena.

O poema dito por Maxwell, Life is a Bum, foi escrito pelo interprete.

Burton tomou cuidado para que parecesse de fato um texto que emulasse a arte beatnik. Ele aparece ao lado de uma banda de jazz, que continha pessoas que ficariam conhecidas.

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Na banda há um 0 guitarrista e cantor) da boate Alex Hassilev, que logo formaria o popular trio folk The Limeliters com Louis Gottlieb e Glenn Yarbrough.

O personagem de Dick Miller faz o trabalho meio distraído, parece até incomodado com o monólogo poético.

O lugar é frequentado por artistas, boêmios e também por gente suspeita, como Lacroix (Ed Nelson), um homem de chapéu, que lembra o visual de um mafioso, que sai do bar para fazer um telefonema suspeito.

Walter é tratado com desdém no trabalho. As pessoas desprezam a sua sensibilidade artística, sabem que ele trabalha em uma forma de trabalho manual não usual, mas não só não entendem o homem como caçoam dele, tratando ele como digno de desprezo.

Em casa ele é interpelado pela vizinha, a sra. Swickert (Myrtle Vail) que afirma que ele está pálido. Ele vai então para o seu apartamento, ansioso por abrir um pacote que chegou.

A trilha sonora é bem utilizada, Fred Katz fez temas legais, ajudando a construir a aura de mistério com o sumiço do gatinho dele, Frankie. O homem abre o tal embrulho que acabou de chegar.

Nela há uma espécie de massa de modelar, grande e difícil de manejar. O protagonista tenta manipular ela e vai se irritando. Quando ouve o miado de Frankie, acredita que ele está por dentro da parede.

Ao invés de limpar suas mãos, guardar o gesso para tentar liberar o animal, ele pega o primeiro objeto que vê, uma faca afiada e coloca na parede. Acaba escorregando, atravessando a camada de cimento, acertando algo, que faz parar o miado imediatamente.

Depois disso ele consegue abrir a parede com muita facilidade, fazendo um buraco no reboco, liberando enfim o corpo do animal. Era só ele ter batido com calma, que liberaria o bichinho... ele fica choroso, obviamente.

Walter aparece depois, com uma escultura de gato, chamada Dead Cat, assim, encanta Carla, a personagem de Barboura Mourris que acha a escultura muito bonita. O empregado até vende ela para Leonard, personagem de Antony Carbone, o dono do The Yellow Door.

O texto faz acreditar que ele simplesmente engessou o cadáver do felino e isso obviamente se prova como realidade.

Carbone passou o filme inteiro mancando e andando com uma bengala. Considerando o histórico de Roger Corman como diretor, que não se preocupava muito com o bem-estar do elenco, boa parte dos fãs cogitava que ele se machucou na gravação e seguiu assim, mas na verdade ele estava perfeitamente saudável.

Ele apenas decidiu mancar porque sentiu que isso tornaria seu personagem mais interessante.

Brock elogia a arte de Walter, faz com que todos que estão no bar ovacionem ele.

Considerando que a arte é bem feia, a conclusão que se chega é que essa reação é na verdade uma piada com a cabeça vazia de algumas pessoas que analisam a arte. Aqui, no caso, o alvo são os beatniks.

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Essa é também uma crítica ao modo tosco que gente pomposa tem de tratar a vida, encarando qualquer manifestação minimamente diferente como se fosse um libelo simbólico singularíssimo, quando na verdade, é apenas uma tentativa de disfarçar um erro, um assassinato.

Tudo gira em torno da necessidade de Walter em agradar sua amiga e musa inspiradora, Carla.

Com o tempo, Walter acaba caindo em ciladas que o destino prega, enfim matando um rapaz, acidentalmente. Nesse ponto, a trama fica bem parecida com o mote de A Loja dos Horrores, filme que Corman faria um ano depois, cujo papel central poderia ter sido de Dick Miller caso ele mesmo não decidisse recusar, já que achava Seymour Krelboin parecido demais com Walter.

As obras eram frequentemente confundidas, especialmente antes do tempo de reprises ou a disponibilização de filmes no streaming, já que ambas obras incluíam Dick Miller, sendo um papel secundário no caso do segundo. Também escalaram Myrtle Vail como uma senhora, tinham a mesma trilha sonora excêntrica de jazz e apresentavam um protagonista estúpido que alcança uma fama repentina e acaba matando pessoas e a si mesmo para prolongar sua fama e para esconder seus crimes.

Leonard e Carla vão até a casa de Walter ver sua nova obra, o rapaz de bengala quase desmaia já que descobriu o Frankie na escultura Gato Morto. Assim ele chegou a óbvia conclusão de que teria alguém ali dentro, ou seja, havia um cadáver humano.

Alguns dias depois, Walter aparece com uma boina, fumando um cigarro fino e longo, de bengala. Passa a se vestir como um idiota esnobe, pode ser mal pago, mas rapidamente vira um homem exibicionista e vaidoso.

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Com o tempo o personagem passa a fabricar matéria prima para a sua arte, até mata uma moça que prometeu posar para ele, no caso, Alice, de Judy Bamber. O olhar dele muda, ao ver ela se despindo, isso faz perguntar se a ideia era associar isso a uma tara ou se é a mera transformação dele em um vilão bastante literal, já que antes ele era um homem ingênuo e agora mata para ter algum prazer.

Não há nudez, obviamente, afinal, esse filme é parte do cinema pré-1960, mas mesmo nesse conservadorismo, se nota a predileção de Corman em exibir as curvas dos belos corpos femininos.

Ele é complexo, de alguma forma, mas como esse é um filme do fim dos anos cinquenta, era esperado que houvesse uma lição de moral para cima do personagem, que é desmascarado publicamente, pouco antes do filme terminar.

No final, há uma exibição das obras e Leonard, que suspeitava de tudo, dá de ombros e permite tudo ocorrer sem freio.

Dessa forma, ele acaba fazendo uma espécie de "museu de carne", exibindo várias peças de arte, lembrando o ideal de Museu de Cera e até o futuro Armadilha Para Turistas, embora seja bem diferente em abordagem de ambos.

A trama termina perturbadora, graças as vozes que chamam Walter ao seu fim e melancólico, em um último crime. O desfecho é pesado, faz perguntar como ele seria encarado atualmente, ainda mais diante da polêmica que permeou Sorria e Boogeyman: Seu Medo é Real. Para a época, o final foi considera bastante agressivo.

Ainda há um comentário engraçado e irônico, sobre essa ser O Homem Enforcado, a última e melhor obra de arte dele. Uma manifestação criativa homicida, que termina com o fim do malvado homem. É bem poético.

Um Balde de Sangue se localiza no cinema de terror, embora seja bem sutil ao introduzir o seu teor macabro. Funciona graças a ironia fina do seu texto e a entrega de Miller, que consegue variar bem entre estilos de atuação. É trágico, dramático, mambembe e curioso, um espécime exótico da filmografia de Corman, que anteveria boa parte dos temas que o produtor e diretor abordaria em sua carreira.

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