Balada Para Niños Muertos é um documentário de Jorge Navas a respeito de Andrés Caicedo, uma figura artística bem peculiar do cenário artístico colombiano, escritor e roteirista especializado na temática do horror, que se suicidou aos 25 anos.
O filme está na programação do Cinefantasy 13 e é bastante curioso por mergulhar na frustração dele, que ainda jovem, adaptou contos e poesias de H.P. Lovecraft para roteiros cinematográficos, tentando inclusive vender essas adaptações para o produtor Roger Corman alguns anos antes de falecer.
Navas faz um estudo bem aprofundado, mostra com sua câmera trechos dos filmes que adaptaram os scripts de Caicedo, especialmente com Luis Ospina, além de registrar um baú repleto de páginas, escritas a mão, de críticas, crônicas e rascunhos de roteiros.
O longa faz uma investigação familiar sobre Andrés, conversa com a irmã dele, Rosario Caicedo, que diz que havia uma relação obsessiva entre ele e sua mãe.
Os dois viviam brigando, ao passo que também se idolatravam mutuamente. A comparação que a parente faz é que havia ali uma relação edipiana, e que isso era verificado na obra do escritor.
Também se fala a respeito do trauma de ter perdido Francisco, seu irmão mais novo, que morreu quando Andrés tinha apenas 7 anos, de hidrocefalia. Com o tempo, ele tornou a dor da perda do irmão em arte, inserindo parte dos seus sentimentos de dor no roteiro de A Prole Inominável, de 1971.
Consumir Balada Para Niños Muertos causa uma curiosidade quase automática em buscar para assistir cada filme ou livro que teve participação de Andrés, especialmente Purasangre, de Luis Ospina 1982.
O diretor, que inclusive dá boa parte das entrevistas no filme, disse que Andrés descreveu para ele um texto (jamais mostrado oficialmente) onde havia uma cena com um senhor de engenho usando o sangue dos seus trabalhadores negros, sendo uma sanguessuga literalmente.
Isso o inspirou a fazer cenas dentro de Purasangre, já que sabia que o texto, se é que existiu de fato, jamais seria filmado. O que se percebe é que, por mais que sua narrativa tivesse bons predicados, havia muita coisa ou inacabada ou apenas pensada da parte do escritor.
Caicedo era um sujeito bastante metódico, melancólico e fechado, se julgava inteligente mas incompreendido e certamente isso ajudou ele a acreditar que o suicídio era uma boa via, já que assim, driblaria o acaso e dissabor da falta de escolha na morte natural.
O filme consegue ser prodigioso no sentimental, apontando para essa questão de modo com ternura, sem moralismos baratos, se louva a arte e a carreira do sujeito, não há muito espaço para julgar o homem.
Em sua carta de suicídio ele pede para ser cremado, para não ser devorado por vermes, destino para ele pior do que viver triste. A frase famosa dele, "Premeditar a própria morte é o único modo de vencê-la", era bizarramente repetida desde que era novo.
Uma antiga empregada doméstica da família Caicedo afirma que desde sempre Andrés anunciava que viveria somente até os 25 anos, fato que faz com que seu suicídio seja ainda mais carregado de tragédia.
Navas faz um filme bastante simples, que passa pelas muitas dificuldades amorosas do biografado, especialmente no trato com as mulheres, nas suas andanças pelos cinemas e cineclubes de Cali, e até pela tentativa dele de se lançar no mercado cinematográfico dos Estados Unidos com um inglês bastante tacanho, incapaz de traduzir para outra língua as suas ideias nonsenses.
A história é, de todo modo bastante fascinante, faz o público olhar para Caicedo como o pequeno Andrés olhava para a coleção de filmes do Drácula, com brilho nos olhos, valorizando as peculiaridades e características pitorescas do protagonista, trazendo aos aficionados por histórias de assombração, um pouco da intimidade de uma figura tão proeminente, e que poderia ter sido tão mais do que foi, um personagem digno de apreciação mesmo que tenha sido interrompido em sua jornada rumo ao estrelato.
Ficha Técnica
BALADA PARA NIÑOS MUERTOS | A BALLAD FOR DEAD CHILDREN
Documentário | Horror, Gótico Tropical | 80’ | Cor, P&B | 16 anos | 2020 | Colômbia
Direção: Jorge Navas
Roteiro: Sebastian Hernandez
Elenco: Rosario Caicedo, Luis Ospina, Sandro Romero Rey, Eduardo Carvajal, Patricia Restrepo, Guillermo Lemos, Ramiro Arbelaez, Oscar Campo.
Com uma fascinante coleção de material de arquivo e os testemunhos de familiares e amigos, o filme mergulha-nos na brilhante obra de Andrés Caicedo e na sua permanente ansiedade como ser humano. Uma homenagem a um homem que foi sua obra. Uma viagem emocionante através de uma obra que foi seu autor.