O Insaciável Marquês de Sade é um filme B que mistura elementos de drama, erotismo e comédia. Essa é uma cinebiografia a respeito de Louis Alphonse Donatien de Sade o vulgo Marquês de Sade e é conhecida por ter um conteúdo sexual explícito, além de ter sido extraoficialmente dirigido pelo mestre do cinema B Roger Corman.
Essa é uma produção teuto-estadunidense lançada em 1969, teve como diretor oficial Cy Endfield e é estrelado por Keir Dullea, o David de 2001: Uma Odisséia do Espaço e John Huston. Tem um elenco potente, que é completado por Senta Berger e Lilli Palmer e também é lembrado por ter sido roteirizado pelo escritor Richard Matheson.
Essa é uma história ficcional sobre um personagem real, que já foi retratado em diversas obras.
O Marquês de Sade foi um político nobre, filósofo e escritor francês cujo viés, segundo consta, era revolucionário. No entanto ele é mais lembrado por sua fama libertina, presente em seus romances, contos, peças de teatro, diálogos e tratados políticos, além de de ser um entusiasta do erotismo, tão aficionado pelo tema que estendia isso a sua rotina amorosa e sentimental.
Sade teve algumas de suas obras adaptadas para o cinema, como as célebres A Idade do Ouro de Luis Buñuel, no ano 1930, também Salò ou os 120 Dias de Sodoma, adaptado por Pier Paolo Pasolini em 1975 e o filme de terror nipo-tcheco-eslovaco Insanidade de 2006 dirigido por Jan Švankmajer, com base em histórias de Edgar Allan Poe e do nobre.
A direção é de Cy Endfield, que em algum ponto da produção, foi demitido. A realização então ficou por conta de Roger Corman, que não foi creditado, Gordon Hessler também conduziu algumas cenas, igualmente sem crédito. O roteiro foi escrito por Matheson e Peter Berg, baseado de maneira não oficial na biografia de Gilbert Lély.
Samuel Z. Arkoff e James H. Nicholson foram os produtores. Os produtores executivos foram Artur Brauner e Louis M. Heyward. Pat Green foi o produtor associado.
O título original é De Sade nos Estados Unidos ou Die Liebesabenteuer des Marquis na Alemanha Ocidental. Em francês é conhecido como Le divin marquis, na Dinamarca De Sade - den sexglade og sadistiske De Sade. Em Portugal é chamado O Marquês de Sade.
A obra foi rodada outubro de 1968, na Alemanha no Bavaria Studios, Bavariafilmplatz 7, em Geiselgasteig - Grünwald. Também filmaram em Berlim, no CCC-Atelier, em Spandau.
Essa é uma produção da American International Pictures (AIP) da Central Cinema Company Film (CCC) e Trans-Continental Filmproduktion. A distribuição nos EUA foi da AIP, da Columbia Film-Verleih na Alemanha e da Globo Vídeo em VHS no Brasil.
Michael Reeves, entusiasmado com o sucesso de O Caçador de Bruxas (Witchfinder General) foi convidado para dirigir o filme, mas acabou não sendo contratado, perdendo a vaga para Cy Endfield, que por sua vez, dirigiu Álbum Misterioso, Na Rota do Inferno, Porto de Fúrias e Zulu.
Corman dirigiu por essa época Túmulo Sinistro, Os Anjos Selvagens, A Grande Cilada e Arrojo nas Pistas onde também não foi creditado, Target: Harry sob o pseudônimo Henry Neill, também Os 5 de Chicago.
Hessler fez O Ataúde do Morto-Vivo, Grite, Grite Outra Vez!, O Uivo da Bruxa, Os Crimes Hediondos da Rua Morgue e A Sombra de um Ninja.
Richard Matheson é mais lembrado por ter escrito o livro Eu Sou a Lenda e episódios de Jornada nas Estrelas: A Série Clássica, mas escreveu roteiros, como o script de O Corvo de Roger Corman, também redigiu Farsa Trágica, Fanatismo Macabro e As Bodas de Satã.
Peter Berg escreveu Acorrentados pelo Pecado e episódios de Menschen und Mächte. Gilbert Lély escreveu apenas esse.
Samuel Z. Arkoff tem mais de 200 créditos de produção, entre eles Reptilicus, Pânico Ano Zero, Terror em Amityville e Vestida Para Matar.
James H. Nicholson produziu A Máquina de Fazer Bikini, foi produtor executivo em O Abominável Dr. Phibes, Bonecas Explosivas, Os Crimes Hediondos da Rua Morgue, Blacula, o Vampiro Negro e A Casa da Noite Eterna.
Dullea fez David e Lisa, um ano antes desse, fez 2001: Uma Odisséia no Espaço. Depois esteve nos filmes B O Cérebro do Mal e Black Christmas: A Noite do Terror, seus últimos trabalhos foram em Fahrenheit 451 de 2018, além das séries Hunters e Halo.
Huston fez A Bíblia...No Início, O Tesouro da Sierra Madre e O Segredo das Joias. Dirigiu Freud: Além da Alma, Sangue Selvagem, Fuga Para a Vitória e Annie. Nesse filme ele ainda trabalhou como consultor dos produtores depois que Cy Endfield saiu do projeto.
A narrativa começa com o De Sade, de Dullea, cavalgando pela neve, até chegar a porta de um lugar, onde pessoas abrem fogo contra ele, que dá meia volta e foge, para não ser alvejado. Depois disso, entra uma abertura, que anima cenas de quadros antigos, afrescos.
Os cenários cenográficos são bem-feitinhos, lembram os do início de carreira de Roger Corman, os contos góticos que ele fazia adaptando Edgar Allan Poe, só que em versão ainda mais baratas, que ficam mais evidentes que são assim graças aos remasters recentes, a alta definição demonstra que eles eram pobres.
Ele vai até um teatro conversar com seu tio Abbé de Sade, que é o personagem feito por John Huston. O cenário onde ele encontra o tio e abade lembra o interior de um castelo, mas é na verdade a nave de um grande teatro. Lá Abbé o convence a ficar para assistir a um espetáculo que lhe foi preparado.
A peça é uma paródia de eventos reais e familiares a ele, no caso, a rotina dos pais do Marquês, que discutiam com pessoas da família Montreuil sobre o possível casamento de seu filho com uma das moças da família.
Ou seja, era o presente dele se encontrando com o passado de uma forma lúdica e criativa. Isso seguiria até o fim da exibição.
Sua postura é altiva, aparência bela, olhos azuis, cabelos lisos e castanho, lembra até o Super-Homem de Christopher Reeve, que só estrearia quase dez anos depois, em 1978.
Ele aceita se casar com a filha de uma família nobre, mira em Annie (Senta Berger) mas não percebe que propõem outra, acaba assinando contrato por Renée Montreuil, de Anna Massey. Ele pensa em recusar então, mas isso deixa toda a família ultrajada.
Ele não tem escolha, mesmo amando a cunhada, mesmo transando com outras tantas, ele aceita casar com Renée, sob pena também de ser preso.
A esposa se entrega a ele, virgem, aguarda o toque do marido, mas ele não se aproxima, ao contrário, são mostradas cenas dele com várias outras mulheres, em um cômodo idêntico a esse, sob uma luz vermelha onde ele se delicia com elas de maneira luxuriosa.
Não há nada muito agressivo no sentido sexual, muito menos há cenas hardcore, no máximo há pessoas se beijando, misturando carícias com comidas. Não ocorrem manifestações sexuais tão fora do usual quanto pode se esperar e a produção é tímida inclusive com nudez.
Nem mesmo o Marquês aparece pelado, há seminudez, até as prostitutas estão mais vestidas que despidas, mostrando alguma carne. É bom lembrar que até os anos 1950 e 60, no cinema norte-americano, era proibido inclusive menção a sexo, que dirá nudez explícita. Apesar da obra se passar no final da década, ainda há resquícios desse código de conduta.
Tudo segue até que o Louis faz algo na casa que gera dor em uma das moças. Aqui ele deixa claro que esse é o motivo do prazer dele, motivo de sua natureza, até poetiza a sensação que tem.
Sempre que ocorre algo importante ele volta ao teatro, com o abade/tio. Não fica claro se esses momentos são literais ou se aquela é uma dimensão diferente, que conecta linhas do tempo distintos, ou se a narrativa é dele se lembrando desses trechos, enquanto Huston discute com o personagem de Dullea.
Os momentos de danças aristocráticas e eventos sociais são qualquer nota, meras interações sociais, que tentam exalar alguma normalidade social nesse cenário caótico e podre dos nobres, mas observar o protagonista flertando com mulheres, para atraí-las até o seu intuito sexual é algo que vale a pena ver.
Ele é convincente, portanto, é sedutor, em todos os sentidos.
As filmagens são quase todas no teatro, uma das poucas exceções é justamente quando Louis demonstra para a plateia como o seu tio o iniciou nessa vida de dor e prazer, mandando uma menina chicotear ele, no estábulo.
A relação entre Abbe e Louis faz perguntar se não há aqui um pouco de Tiberio com Calígula. Parece ter havido uma inspiração da parte da equipe de produção do filme de 1979, que não se identifica se foi idealizado pelo roteirista original Gore Vidal ou pelo diretor Tinto Brass.
Em certo ponto do filme, é exibida uma cena de orgia, no meio do teatro, tudo é motivo para colocar pessoas, especialmente mulheres, em trajes reveladores, com nudez aparente ou quase isso.
As cenas em que Sade chicoteia as mulheres acabam recebendo um tratamento de cor diferente, com a fotografia ficando vermelha. Tenta-se cobrir a imagem da câmera, especialmente com Rose, da alemã Uta Levka. Fica a sensação de que tudo isso que ele faz é apenas uma tentativa de compensar o fato dele não ter com a sua amada adora, sem qualquer garantia de que tendo Anne, ele seria plenamente feliz ou minimamente satisfeito.
O amor que ele busca é apenas uma idealização. Possivelmente o que o preenche é justamente a libertinagem, mas ele ou não tem a total ciência sobre essa conclusão ou se nega a assumir de maneira corajosa que essa sim é a sua natureza.
Nos cenários e figurinos se percebe uma preferência por tonalidades de vermelho. Essa é a cor da paixão, da pulsão, mas é universalmente utilizada no cinema para evocar perigo. Aqui ela serve para preencher a tela, possivelmente para evitar que houvesse problemas de exibição por países estrangeiros.
Vale lembrar que a classificação indicativa estava engatinhando em 1969, seria instaurada justamente após A Noite dos Mortos Vivos de George A. Romero, que permitiu a crianças e jovens verem pessoas canibalizando outras pessoas.
Em um ponto se revela o motivo de tudo se passar em um teatro. Louie escreveu uma ópera, mas só aborda o tema de maneira direta quando conversa com Anne, justo quando a mesma avisa a ele que está indo embora.
O segredo aparentemente é mostrado ao público já que ele se enxerga à vontade com sua amada. Fosse qualquer outro personagem a revelação provavelmente não ocorreria. Dessa fora ele fica triste, até tenta demover ela da ideia de partir, mas ela sobe uma capa com capuz na cabeça, se vira para ele e some, simbolicamente desaparece, como havia de ter feito com o próprio na realidade.
O momento é poético, faz pensar também que tudo o que ocorreu, a vazão a sexualidade mais "avançada" e não normativa é uma tentativa de alcançar o impossível, de preencher o vazio do personagem de não conseguir ter com a mulher que ele tanto quis e tanto amou.
Lilli Palmer, a interprete de Mme. de Montreuil tem um desempenho curioso, já que sua personagem age de uma forma mais formal, altiva e mandona, mas parece esconder algo, um desejo sexual, possivelmente. Ela até brilha um pouco, mas na maior parte dos momentos, o seu personagem é atonal, não passa de uma matrona, uma mulher que vive dando ordens mas é incapaz de não se mostrar como alguém sensual e sexual, mas que não tem êxito.
Ela flerta com a condição de ter com Louis, mas nada faz, lamenta por Annie e por Renée, lamenta o envolvimento de suas parentes com ele, a desgraça de sua família. É uma pessoa frustrada, inclusive sexualmente. Seria frígida?
A sequência do julgamento é dos momentos mais teatrais da produção, é seguida da algazarra que destruiu móveis e objetos cênicos.
No final ainda é mostrado ele largado, isolado e decadente, já muito velho.
A maquiagem do Marquês idoso é curiosa, já que quem interpretou o personagem foi Robert Dullea, o pai do ator principal. Dullea não quis fazer uma cena onde estaria com tanta maquiagem pesada, por isso sugeriu escalar seu pai, cujas falas foram dubladas pelo filho, evidentemente.
Sade está em um convento e é tratado como um velho qualquer, um sujeito que em suas confissões não parece mais do quem mentiroso, um mitomaníaco envelhecido, que gosta de contar vantagens. Ele foi condenado a viver seus últimos dias como um anônimo, como uma pessoa qualquer, relegado a insignificância.
Dessa forma, entre as versões da história, essa acaba sendo uma das menos memoráveis, conta com atuações muito boas e acaba sendo desbravadora pelos temas que aborda.
O Insaciável Marquês de Sade é um filme curioso, irregular, mas singular. Carece de uma identidade estabelecida, sendo difícil identificar qual é o seu autor real, já que passaram por ele três diretores. Acaba prevendo a fórmula de vários filmes biográficos e épicos com foco em violência e erotismo, estabelecendo assim uma nova moda.
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