
O Trem do Terror é um filme de horror canadense dos anos 1980, que se vale da estética e dos clichês do cinema slasher. Longa protagonizado por Jamie Lee Curtis, é lembrado também por ter o mágico David Copperfield em seu elenco. Seu maior reconhecimento, no entanto, é relacionado ao fato de ser ambientado em um veículo sobre trilhos e também graças ao seu icônico pôster, que mostra um assassino com a máscara baseada na aparência de um comediante famoso.
Com a trama celebrando o feriado de fim do ano, durante o réveillon, esse é um Filme de Matança que também cai na categoria Canuxploitation, que eram filmes de terror canadenses de baixo orçamento.
Esse obviamente foi na esteira de Halloween: A Noite do Terror, tanto que traz a sua scream queen como protagonista - em uma versão bem semelhante a Laurie Strode, excluindo claro o corte de cabelo - também as fantasias típicas do Dia das Bruxa, além de se passar em uma data festiva.
Há quem defenda que essa é uma obra "complicada" e até preconceituosa em termos narrativo, já que o seu matador possui uma origem e caracterização infame, mas há quem defenda que esse representa bem uma classe normalmente excluída do cinema e da cultura pop em geral.
Estreia e detalhes narrativos
Foi lançado no mesmo ano que Sexta-Feira 13, estreando poucos meses após - um foi em maio, enquanto esse chegou em outubro - e de sua forma, reúne elementos de filmes de assassino mascarado enquanto a fórmula ainda se solidificava.
Aqui se vê uma punição moralista a pessoas que transam, se drogam e bebem, há a figura da moça sem defeitos que sobrevive, punição a piadista e sanguinolência da parte de um assassino, que além de ser homicida, é também um personagem perturbado mentalmente.

A trama se passa em duas linhas temporais, com a maior parte da exploração ocorrendo três anos depois da primeira.
No primeiro tomo da história, é mostrada uma brincadeira que acabou de forma gritada e traumatizante, envolvendo seis estudantes universitários, que no futuro, acabam se tornando alvo de um assassino, justo na festa da virada, a bordo de um trem em movimento.
Dirigido por Roger Spottiswoode, o filme foi escrito por T.Y. Drake e Judith Rascoe, com argumento de Daniel Grodnik (esses dois últimos, não são creditados como tal) além de ter sido produzido por Harold Greenberg. Tem Lamar Card e Grodnik como produtores executivos.
Ideia retirada de um sonho
A ideia inicial para o filme surgiu de um sonho que Daniel Grodnik teve.
Em um final de semana, ele assistiu a Halloween de 1978 e O Expresso de Chicago de 1976, era tarde da noite e ele adormeceu. Quando acordou, disse a esposa: "O que você acha de colocar Halloween em um trem?" ela respondeu que a ideia era terrível, não ficando claro se ela achou que a ideia não era boa ou se a proposta era aterradora, com mais chances dela ter falado no segundo sentido.
De qualquer forma ele anotou em um pedaço de papel, em sua mesa de cabeceira, a palavra Terrible Train, de manhã, ele mudou o título para Terror Train, escreveu 22 páginas de rascunho, fez um acordo com a empresa Astral, do produtor Sandy Howard naquele mesmo dia, às 3 horas da tarde.
O filme começou a ser filmado apenas 4 meses após esse momento citado.
Curiosamente, em 1980, outra obra de terror em um meio de transporte foi lançada, que era O Navio Assassino e essa também envolvia Sandy Howard e Harold Greenberg na produção.
Essa é uma obra trash, que como o nome deixa claro, é um filme de terror ambientado em uma embarcação marinha.
O Trem do Terror estreou no Brasil na mesma época em que chegou aos Estados Unidos, em 3 de outubro de 1980, ou seja, no mesmo mês do Dia das Bruxas (há quem defenda que o filme era para se passar no halloween).
Em seu país de origem estreou depois, chegando aos cinemas canadenses no dia 10 de outubro desse mesmo ano.
O título original é Terror Train, mas também pode ser visto em países de língua inglesa como Train of Terror. Na Argentina é El tren del terror, na Bélgica é Het monster in de trein ou Le Monstre du train. Na parte francesa do Canadá, podia ser encontrado como o nome Le train de la terreur, na Dinamarca Massakren i nattoget.
Na Alemanha Ocidental é chamado Monster im Nachtexpress que se traduz como Monstro no Trem Expresso Noturno. Em Portugal é O Regresso do Comboio do Terror.

As filmagens ocorreram entre novembro e dezembro de 1979 e o cronograma se atrasou em meio dia.
Por conta disso, Sandy Howard queria arrancar cinco páginas do roteiro, segundo palavras de Spottiswoode. A partir daí começou a boataria de que egos em conflito atrapalharam a produção do filme, já que, supostamente, haviam diferenças criativas entre o produtor Howard e o diretor.
Isso talvez explique o fato de que Howard não tem crédito nenhum no filme. Harold Greenberg resolveu a disputa e veio ao resgate dessa questão financeira, empenhando um cheque de US$ 25.000 para cobrir o estouro.
A obra foi filmada em Montréal, Quebec, Canadá, também houveram cenas em Claremont, New Hampshire.
Filmagens a bordo do trem
As primeiras quatro das cinco semanas de filmagem ocorreram a bordo da locomotiva dentro de um armazém em Montreal.
A quinta semana foi usada para as filmagens externas. Para isso a locomotiva foi aquecida e retirada do local, especialmente nas filmagens de sequências com momentos cobertos de neve, afinal, poderia derreter a neve.
No lugar utilizaram um trem parado. As cenas filmados na província canadense de Quebec, também houve um grave problema com temperaturas baixas durante a rodagem.
Ironicamente, o próximo filme de Lee Curtis foi Jogos de Estrada, ambientado e filmado em condições bem opostas, nas secas, quentes e empoeiradas Planícies de Nullabor, na Austrália.
A produção rezou pela neve
A neve foi um elemento essencial da história para algumas das filmagens externas do filme.
A revista Movie News de Austrália relatou que os membros da equipe de produção estavam rezando por neve, já que era um elemento importante no roteiro e difícil de replica. Eis que vários centímetros de neve caíram durante a primeira noite de filmagens externas.
Pessoas no set brincaram que isso ocorreu graças a ação do "mago" David Copperfield.
A obra foi feita pela Astral Bellevue Pathé e Triple T Productions, distribuída pela Astral Films no Canadá, enquanto nos EUA foi lançado pela Twentieth Century Fox. A Twentieth Century Fox Film Company lançou no Reino Unido.
Quem Fez
Roger Spottiswoode estreou nesse, mas anos depois estourou como realizador e cineasta, se tornando responsável por alguns filmes blockbuster.
Seus trabalhos mais lembrados são 007: O Amanhã Nunca Morre, O 6º Dia, Ripley no Limite e Órfãos da Guerra. Ele foi produtor associado em Soldados da Morte, produtor executivo em Baby, o Segredo da Lenda Perdida.
Paul Lynch, de Baile de Formatura e Amanhecer Violento, foi abordado para dirigir este filme, mas recusou.
Spottiswoode também foi o montador de vários filmes antes deste, incluindo três do mestre Sam Peckinpah. Trabalhou em Sob o Domínio do Medo, Os Implacáveis e Billy the Kid. Ele também prestou serviços diversos no setor de montagem, como assistente de edição entre outras funçoes. Filmes onde fez funções do tipo incluem Funeral em Berlim, O Leão no Inverno e À Procura do Meu Homem.
T.Y. Drake escreveu argumentos para a série The Psychiatrist e para o filme The Keeper, também escreveu episódios de MacGyver: Profissão Perigo e a Feiticeira.
Daniel Grodnik escreveu Sem Aviso, Fora de Controle (também sem crédito) foi o criador do telefilme Estrela do Norte, produziu 1969: O Ano que Mudou Nossas Vidas, Fúria Cega e Férias Frustradas de Natal e Energia Pura. Foi produtor executivo em Max: Fidelidade Assassina,
Harold Greenberg produziu O Navio Assassino, foi produtor executivo em Maria e José, uma História de Fé, Porky's 2: O Dia Seguinte e Pygmalion.
Judith Rascoe escreveu Road Movie, Retrato de um Artista quando Jovem, Soldados da Morte, depois Amor sem Fim e Um Amor em Chinatown. Foi editora de história História de um Massacre e Repórteres de Guerra.
A fama de Jamie Lee Curtis
Quando este filme estava pronto para ser lançado, a atriz Jamie Lee Curtis já havia conquistado alguma fama, especialmente no setor de terror.

Ela teve aparições em filmes de horror frequentemente, começando pelas obras de John Carpenter, como Halloween e A Bruma Assassina, também no já citado Baile de Formatura e esse O Trem do Terror.
Esses todos ocorreram em menos de dois anos, entre 78 e 1980, no ano seguinte, ainda ocorreria Halloween 2: O Pesadelo Continua, que marcou o fim de um ciclo dela como rainha do grito, ao menos por enquanto, já que voltaria em H20: Halloween 20 Anos Depois e outros acréscimos em fitas de terror.
Sobre a personagem que fez, a atriz disse que Alana era diferenciada, por "precisar" ser vulnerável até certo ponto da trama, para que o público se identificasse com ela e torça por sua sobrevivência, ao passo que também precisaria ter uma enorme força interior para superar o mal que a persegue. Para ela, essa final girl é a mais forte e mais definida que ela fez.
Refilmagens:
Apesar de essa ser uma obra de baixo orçamento e pouco lembrada, houveram dois remakes, primeiro com Train, filme estadunidense de Gideon Raff lançado em 2008, além de Terror Train, um Tubi Original canadense, lançado em 2022 e dirigido por Phillipe Gagnon, que inclusive, teve uma sequência, Terror Train 2, lançado no mesmo ano.

O trem
O trem usado no filme é do modelo Canadian Pacific Railway No. 1293, ainda era uma locomotiva operacional em fevereiro de 2002.
A marca e o modelo eram de um trem de excursão da Canadian Locomotive Company construído em junho de 1948, que foi alugado para a produção de um museu de trens a vapor, a Steamtown Foundation, em Vermont, na região da Nova Inglaterra, nos Estados Unidos.
O trem foi pintado de preto com listras prateadas para o filme, junto com seus cinco vagões Steamtown que foram usados com a locomotiva.
Spottiswoode disse que o transporte dos vagões de Vermont para Montreal ocorreu sob trilhos. Os vagões foram montados, obtiveram um passe e os enviaram tal qual um trem comum, sem grandes problemas.
Segundo ele, foram cinco semanas de preparação e levaram duas semanas para encontrar esses trens, selecionar os vagões e obter permissão. O trem levou cerca de três ou quatro dias para chegar até o set.
Apesar de não ser muito longe, ele teve que passar pela alfândega. Ainda segundo o diretor, havia uma equipe trabalhando no trem enquanto viajava para Montreal.

O número da locomotiva era 1881, mas foi renumerado para o filme, aparecendo nº 1293. Dois vagões tinham nome, no caso, Rascoe's Folly e Wickman's Wake.
A movimentação do trem e as filmagens noturnas
O trem foi balançado para frente e para trás em uma plataforma dentro de um armazém, para simular a locomoção real do veículo. A fumaça foi simulada queimando uma combinação de carvão e incenso de igreja.
Quase todas as filmagens no trem tiveram que ser programadas para a noite, já que os arredores do armazém de Montreal que abrigava o trem eram muito barulhentos durante o dia.
As filmagens começavam às 18h e continuavam até as primeiras horas da manhã.
O filme foi filmado a bordo de vagões de trem reais que foram convertidos para a produção para permitir espaço para os equipamentos de câmera. Devido a essa falta de espaço, um carrinho especial foi construído para as câmeras.
Em alguns dias, o frio foi tão intenso que uma câmera simplesmente congelou.
O diretor de fotografia John Alcott criou um método único de iluminação. Ele fez toda uma nova ligação elétrica, refez e reinstalou toda a parte elétrica ao seu modo, montou dimmers individuais nas partes externas dos vagões, utilizou uma variedade de lâmpadas com diferentes potências, controlando elas com os dimmers (dispositivos utilizados para variar a intensidade de uma corrente elétrica média em uma carga) externos.
Alcott conseguiu iluminar o cenário de uma maneira muito rápida e eficiente. Às vezes, também usava luzes médicas e pen torchs, pequenos materiais médicos, capazes de gerar luz, que foram utilizados aqui para iluminar manualmente os rostos dos atores.
A arte de capa e o apelo junto a crítica
A maioria dos pôsteres mostra o assassino no traje de Groucho Marx, mas no filme este traje é usado apenas quando o assassino embarca no trem e é abandonado quando a duração atinge a marca de 25 minutos.
Essa é uma das muitas faces que o homicida usa, não é a única, dessa forma, ele se diferencia bastante de Jason Voorhees e Michael Myers, que normalmente, usavam uma única máscara.
Em boa parte do material de publicidade, se relatou que a atriz principal Jamie Lee Curtis tinha 21 anos de idade, embora não faça qualquer diferença, já que ela não aparece fazendo qualquer ação proibida para menores de idade.
Esse longa-metragem está incluído na lista de "Mais Odiados" do crítico de cinema Roger Ebert. Atualmente, não há muitos defensores do filme, nem mesmo da parte da crítica especializada em cinema B e de horror.
Narrativa
A trama inicia em um ambiente de estudo, supostamente, na verdade, ocorre em uma faculdade, em uma farra de final de ano que lembra as festas de colégio, de ensino médio, embora mire uma faixa pouco mais velha que meros estudantes de high school.
Essa é uma festividade da fraternidade universitária Sigma, Phi, Omega, Hei onde os jovens gritam bastante, em meio a uma bagunça generalizada, típica de fim de período letivo.
O prólogo inicia mostrando uma fogueira na faculdade, que por acaso, foi a última cena a ser filmada, adicionada durante a pós-produção, cerca de um mês após o término das filmagens principais, como uma ligação com as origens do personagem Kenny Hampson, que seria introduzido nesse ponto.
Esse então é mais um filme de garotos jovens, bebendo, se drogando, querendo curtir à noite. A maioria é absolutamente genérica, de um modo que apenas dois se destacam, o atleta Doc (Hart Bochner) um piadista, que provoca todos e é insuportável, além de Kenny, que é interpretado por Derek McKinnon - que assinava Derek MacKinnon na época - um nerd estereotipado, de aparência esquisita, óculos, que é caracterizado de maneira tão caricaturalmente feia que possui até uma corcunda, fruto de sua postura péssima.
Derek e Kenny
Durante uma entrevista em 2010, o ator Derek McKinnon disse que conseguiu esse papel por acaso.
Ele acabou indo para um teste que nem estava programado para fazer, foi acompanhar um amigo e acabou na audição. Depois de fazer o teste, ele entrou, as pessoas o viram e disseram que o amigo não era bom e Derek sim.

McKinnon tinha o seu próprio show de drag na época. Em um dia qualquer o diretor de elenco veio ao show, o viu no palco e gostou do espetáculo.
Quando ele recebeu a notícia de que passou no teste, achava que era um papel pequeno, mas os produtores anunciaram com pompa que ele assinou para o papel principal em um filme da 20th Century Fox com Jamie Lee Curtis.
Problemas do ator com o diretor
Houve atrito entre o diretor Roger Spottiswoode e Derek McKinnon durante as filmagens. Spottiswoode alegou ser resultado da inexperiência de McKinnon, que segundo ele, não era um ator de verdade.
Spottiswoode o chamava de "um travesti das ruas de Montreal" e não estava familiarizado com os conceitos de um contrato profissional de cinema, tampouco entendia conceitos básicos como chegar ao trabalho na hora certa.
Disse também que de uma forma estranha e inesperada, ele fez um bom trabalho, já que era acostumado com o mundo de teatro barato, sendo estranhamente eficaz ao se colocar nessas situações.
Kenny e Alana
Kenny tenta se aproximar de Alana Maxwell, a personagem da bela Jamie Lee Curtis. Ela topa conversar com ele e pratica com o rapaz uma pegadinha bastante maldosa, de gosto duvidoso e macabro, para dizer o mínimo, especialmente se levar em conta o seu caráter e todo o seu conjunto de atitudes posteriores.
Ela finge que ficaria com ele, colocando uma boneca no lugar, ao menos é o que parece.
Ela fica próxima da cama, mas não exatamente no colchão. Se coloca no escuro, fazendo voz de prazer, fingindo estar na cama.
A grande questão é que ali não está um boneco ou ser inanimado e sim uma pessoa, de verdade e sem vida. É um cadáver, o corpo de homem, mega estranho, com os braços decepados e partes de suas entranhas para fora.
Depois fica claro o que ocorreu, a conclusão que se tem é que Doc tem acesso a corpos no hospital onde trabalha, então pegou um cadáver, que passou batido para os funcionários do mesmo, ou isso ou ele subornou alguém do plantão.
Fosse essa uma história lógica e séria, ele certamente seria preso e despedido, a não ser que tivesse costas quentes, no entanto o roteiro não trata de mostrar quaisquer detalhes sobre isso.
O visual é legal nesse ponto, há luzes piscando enquanto Kenny sobe as escadas. Essa forma de iluminar deixa o cenário confuso, de uma forma que até ajuda a inebriar o garoto, que se assusta com o corpo, de um modo que mal liga para os maus-tratos dos colegas, entrando em choque, gritando, fazendo um escândalo, tanto que se enrosca no lençol acima da cama, roda e fica no tecido como um inseto fica em um casulo.
Nesse ponto se abusa do simbolismo, tornando a cena na óbvia representação da transformação, sob a pontual música de John Mills-Cockell, que acrescenta um bocado de drama utilizando sua trilha original, já que de fato o ator não era tão dramaticamente talentoso para segurar uma sequência dessas sozinho.
3 anos depois, a partida do trem
Ocorre uma passagem de tempo, depois se foca nos mesmos estudantes universitários, especialmente em Doc e Alana.
Os jovens se preparam para uma festa à fantasia, a bordo de um trem. Fica aqui a impressão de que isso deveria ser uma festa de halloween/dia das bruxas, mas foi modificada em cima da hora, já que tinha o protagonismo de Jamie Lee Curtis e pareceria demais com Halloween de John Carpenter.
Os personagens são todos caricaturais, exceção aos adultos, especialmente o condutor Carne (Ben Johnson) que é agradável, paciente com os jovens chatos e cuidadoso na hora de investigar os assassinatos.

O trabalho de esforço de Ben Johnson
Johnson disse uma vez que nem tinha lido o roteiro de O Trem do Terror. Ele aceitou graças ao fato de ser conduzido por Roger Spottiswoode, afirmando que tinha uma enorme admiração por seu trabalho desde os filmes de Peckinpah.
O ator achava que ele seria um ótimo diretor, mesmo iniciando nesse. Segundo relatos, Ben pediu a Spottiswoode para dar ao seu personagem o menor número possível de diálogos.
Para justificar isso, Spottiswoode contou uma anedota, onde Johnson falou que quando trabalhou com John Ford, o diretor lendário disse "Ben, quando você estiver na frente da câmera, não precisará de muitas palavras...elas podem atrapalhar".
Ford dizia também que Johnson era mais expressivo com seus gestos e com o seu rosto e menos com as suas falas. Sabendo disso, Roger acatou o pedido do ator e retirou boa parte dos seus diálogos, a fim de não truncar a participação dele.
Uma ação que não demora
Antes até da partida do trem, ocorre uma morte, Ed (Howard Busgang) que é ceifado e tem sua máscara de Grouxo Marx roubada. Enquanto ele agoniza tenta, em vão, avisar que sofreu um golpe de espada, mas não é socorrido, já que as pessoas acham que a arma branca enfiada em sua barriga é falsa.
Depois o matador assume a face do comediante e finge ser o rapaz piadista, só pelo prazer de enganar os jovens passageiros.

Essa máscara ainda tinha uma semelhança curiosa com um outro filme, que também se passa em veículo ferroviário, lembrando demais o sequestrador de trens disfarçado de Robert Shaw, do recente O Sequestro do Metrô, lançado em 1974.
O cenário fechado
Apesar do filme se passar basicamente em um ambiente, estampando também o nome do longa, a realidade é que se subaproveita o cenário do trem.
Aqui poderiam colocar mortes "temáticas", envolvendo as cabines, os espaços curtos, mas a maioria é qualquer nota, sendo simplesmente genérica.
Além disso, o compartimento do cenário favorece a demora a perceber que jovens estão caindo.
Ao invés de investir energia nesse ponto, se gasta tempo para mostrar Alana indignada com seu namorado Mo (Timothy Webber) quando descobre que a ideia de fazer uma festa no trem não foi ideia dele e sim de Doc.
Isso não faz qualquer sentido, já que a ideia ser de Mitchy não impediria Doc de fazer qualquer outra pegadinha de mal gosto, além do fato de que ela sabia o que fariam com Kerry três anos antes. Arrependida ou não, é hipocrisia tentar se isentar da culpa.
O motivo dela odiar Doc não é mostrado, explicado ou bem explorado. Também não faz sentido ela se sentir a rainha da moralidade.
A participação do ilusionista
Também chama a atenção os números de ilusionismo do personagem feito por David Copperfield, chamado também de Ken, embora nos créditos finais não haja qualquer nome para ele.
Copperfield disse uma que foi este filme que o fez desistir de se aventurar no cinema, já que a sétima arte o fazia ficar exposto demais em seus números.

O celebre ilusionista abriu uma aspa forte, de que "o filme é uma lupa para a mágica", disse que tinha que ter muito cuidadoso: "O que você vê na tela é exatamente o que os extras viram durante as filmagens."
Esse aliás foi o único papel dele como ator em cinema ou televisão. Após isso ele interpretou a si mesmo em várias oportunidades, em filmes e séries, mas não voltou a fazer outro papel dramático. Ele ficou muito irritado durante a produção, teve dificuldade em dizer suas falas e também por isso jurou que nunca mais faria outro filme.
O lamentável nessa história toda é que os seus truques eram ótimos, funcionam bem e acrescentam um certo charme a obra, é um diferencial em meio as dezenas de filmes slasher da época.
Ele ainda conseguia fazer todos os números com uma assistente, uma moça esguia, muito magra, que se tornou tão ou mais icônica quanto ele, mesmo sem ter grandes falas ou participações.

O maquinista e capitão da trama
O maquinista que Ben Johnson interpreta tem um papel fundamental na trama, para além do fato de ser a figura mais celebre do elenco.
Ele descobre um dos corpos, após mais de meia hora, com 38 minutos de exibição. Vale lembrar que essa pessoa não foi a primeira vítima, já que o primeiro a cair o fez fora do trem.
A cena é legal, o sangue no azulejo claro e na pele de crocodilo, de D-Jack (Anthony Sherwood) resulta em um bom efeito visual e o fato do homem ser discreto colabora para o suspense.
Se houvesse uma mínima construção de mistério e atmosfera, certamente ela seria bem servida, até pelo personagem de Johnson. A inexperiência do diretor é provada aqui, não há uma boa mostra do limite da emoção em se mostrar que os jovens, antes alegres e animados, agora estão sendo chacinados.
Johnson salva um pouco essa sensação. Seu personagem é quieto, calculista, um bom líder, que evita alardes e só fala das mortes quando é impossível não citar mais, já que outras pessoas descobriram.
O matador ainda brinca com a expectativa do homem velho, já que pega a fantasia de D-Jack, a limpa, se livra do corpo e limpa todo o rastro de sangue.
É inegável que ele teve muito trabalho, afinal, era um ambiente fechado, em movimento, com espaço limitado. Limpar um cômodo em um veículo assim já seria difícil, esconder um corpo é uma tarefa árdua.
Colabora para o terror a capacidade camaleônica do assassino, que sempre busca uma nova forma de se vestir, Spottiswoode ainda brinca de abafar os gritos de uma menina com o apito do trem.

Também impressiona que os jovens têm uma postura moderna em relação a formação de casais.
Não se defende qualquer quebra a monogamia, ao menos não verbalmente, mas é fato que se trocam demais os pares. Os amigos se traem mutuamente, tão intensamente que caso o público esteja pouco atento, é fácil confundir quem é namorado de quem.
O Magico se aproxima da garota final e Alana dá abertura para ele, mesmo assumindo que não acredita em mágica.
Copperfield não está mal, até brinca com as expectativas de público e personagens, mas simplesmente some da tela, sem grande alarde, depois que fala com a menina.
Em algum ponto parece até que ele fará par com Alana, uma vez que ela está irritada com seu atual namorado, que comete uma infidelidade com ela, mas isso não ocorre.
Aos poucos as pessoas tomam nota do que está ocorrendo, Alana descobre que sua melhor amiga Mitchy (Sandee Curry) morreu, depois Doc percebe que Mo, também foi mortalmente ferido.
Cada um deles entram em desespero, com a moça produzindo no público algum impacto emocional, afinal Lee Curtis é boa atriz, enquanto Doc só reforça a ideia inicial de Ed, de ser tão bufão que todos acham que o seu pedido de socorro é uma brincadeira.
Curiosamente, Doc sente mais a morte de Mo do que a sua namorada. Talvez houvesse ali um componente homoafetivo entre os dois, uma paixão secreta ou não correspondida, da parte do estudante de medicina, mas não se desenvolve muito além disso.
A partir daqui falaremos sobre as curvas finais do roteiro. Portanto, haverá spoilers. O aviso está dado.

A parábola do menino que gritava Lobo - conhecida como Pedro e o Lobo - é bem presente, uma lição moral bizarra, especialmente depois da demonstração de remorso pela qual passa Doc.
Dessa forma, quando ele tenta arrumar ajuda ao ser de fato atacado, todos ignoram ele, já que ele já testou a audiência das pessoas várias vezes.
Segundo McKinnon, essa era a sua cena favorita, já que ele matava o personagem de Hart Bochner, que o irritava muito durante as filmagens.
Os personagens são quase todos genéricos, carentes de maiores diferenças ou de características ímpares. Desse modo qualquer pessoa mais diferenciada, como a auxiliar do mágico, uma pessoa andrógena, que parece ser uma mulher trans ou crossdresser, se destaca demais.
Isso também compromete a identidade do assassino. Fica claro que deve ser Kenny Hampson, antes até de revelação que Alana faz a Doc, de que foi visitar o menino no hospital pouco tempo depois da brincadeira de mau gosto, descobrindo que ele matou alguém naquele mesmo dia.
Os momentos finais tentam ser tensos, mas falham miseravelmente, até as props de efeito prático funcionam mal, também não há muita iluminação nas cenas finais, fato que torna toda a sequência muito confusa.
Beijo cortado
Derek McKinnon disse em uma entrevista de 2010 que o roteiro original tinha menção a um beijo do seu personagem maquinista, do ator Ben Johnson durante uma cena, ainda vestido como a assistente feminina de Copperfield.
Segundo esse relato, McKinnon se recusou a fazê-lo. Disse que ficou chateado, por estar lidando com uma estrela hollywoodiana, vencedora de Oscar, que ele sequer conhecia até aquele ponto. Salientou o óbvio, que aquela era a década de 1980, não se beijava outro homem, não nessa época e não dessa forma.
Quando soube disso, Johnson o chamou para seu trailer, disse que estava bem em filmar o beijo e exigiu saber por que McKinnon não estava. Depois que eles conversaram, McKinnon concordou em fazer a cena, eles filmaram a sequência, mas depois de tudo isso, acabaram não usando.
O homem de várias faces
Derek McKinnon apareceu em onze cenas no total ao longo do filme e em cada cena, aparece usando uma máscara ou traje diferente, assim como seu personagem Kenny Hampson.
Apesar do bom desempenho do vilão, todo o mistério em torno dele é ridículo, inclusive a acusação sobre o mágico faz parecer que é uma mentira muito fácil de desbaratar
Com o tempo e com a popularização do filme se defendeu que a revelação final não possui um teor de transfobia, até pela escolha da pessoa que interpreta, mas há de se destacar que o tempo todo, Kenny usa máscaras diferentes.
Parece que ele se sente à vontade com qualquer rosto, menos com o seu, o que inclui até a revelação final.
Ainda há quem defenda que é uma pessoa não heteronormativa, traumatizada, que heroicamente mata os seus algozes, tal qual ocorreria com Angela em Acampamento Sinistro, três anos depois.
O acidente com Jamie Lee
Durante a cena final da luta, quando Jamie Lee Curtis estava sendo atacada (por um dublê que estava substituindo McKinnon) ela acabou batendo a porta da gaiola no rosto do sujeito.
A equipe de produção deveria substituir a porta por uma dobrável, mas se esqueceu, então um pedaço de metal perfurou o rosto do homem, ferindo-o. Curtis ficou tão chateada que deixou o set e não voltou por dois dias.
A revelação
Quanto a revelação, se dá (depois de muita demora e de muita enrolação, com vários momentos que poderiam ser o final) depois da óbvia revelação de Copperfield morto (mesmo que ele não tenha sido alguém ruim com Kenny) a sensação que fica é que toda a questão além de óbvio é um pouco incongruente e sem sentido.
Para não deixar ninguém sem lembrar, ainda se piscam as imagens, para demonstrar ao público as várias faces de Kenny, ou seja, se trata o espectador como se fosse imbecil.
Mesmo que a pessoa seja muito desatenta, não era realmente necessário expor tanto quem é e quem fez essa movimentação assassina. Já havia ficado claro, mesmo que Kenny tenha aparecido tão poucas vezes de cara limpa.
Trem do Terror promete mais do que entrega, mas ainda assim é uma obra que tem seu charme e personalidade. Tem como trunfo o dedicado desempenho dramático de Jamie Lee Curtis e peca justamente por não ousar tanto quanto poderia. Infelizmente é escuro demais e só contém gore nos instantes finais praticamente, mas ainda é uma boa demonstração de como os filmes de matança poderiam correr se não se tornassem meras cópias dos filmes de Jason ou Michael Myers.