O Ventre Negro da Tarântula é um filme de terror e mistério franco-italiano lançado em 1971. Localizado dentro do estilo giallo, é mais uma história sobre assassinatos, conduzido com belas e coloridas imagens, como é típico dentro do gênero de horror italiano dos anos setenta.
Seu plot é simples, mostra uma série de belas mulheres sendo mortas de maneira curiosa, já que tem em comum o mesmo método, com as vítimas ficando paralisadas, enquanto tem a barriga aberta, de maneira semelhante ao modo que as vespas negras matam tarântulas.
Regido por Paolo Cavara, é um dos vários gialli cujo nome faz referência a um animal, tendência essa que começou graças ao sucesso de O Pássaro das Plumas de Cristal que Dario Argento lançou em 1970.
Fora essa óbvia referência, há outras influências claras, até acenos, já que o assassino misterioso tem um visual clássico, de sobretudo e chapéu preto semelhante ao que é visto em Seis Mulheres Para o Assassino, de Mario Bava.
No entanto o que mais chama a atenção certamente é o elenco, formado por belíssimas atrizes e com um protagonista masculino curioso. Há nele três beldades que ou foram ou se tornariam Bond Girls, a saber Claudine Auger, que fez 007 Contra a Chantagem Atômica de 1965, Barbara Bach, que protagonizaria 007: O Espião que me Amava em 1977, além de Barbara Bouchet, que apareceu na comédia Casino Royale de 1967.
No entanto hoje o filme acaba sendo mais lembrado por outra presença no elenco, também ligada as histórias do superagente de Ian Fleming. O ator italiano Giancarlo Giannini, que faz o policial encarregado de verificar que está cometendo esses assassinatos.
Ele ficaria famoso por fazer um personagem cujo caráter é duvidoso, no caso, o elegante e charmoso René Mathis dos filmes 007: Cassino Royale e 007 Quantum of Solace em 2006 e 2008 respectivamente, na era Daniel Craig.
O Ventre Negro da Tarântula foi rodado em Roma, na Itália, se chama originalmente La tarantola dal ventre nero e tem algumas poucas variações de nomenclatura pelo mundo. Em países de língua inglesa, é conhecido como Black Belly of the Tarantula, mas pode ser encontrado também como La tarentule au ventre noir na França, Taranchura no Japão, La tarántula del vientre negro no Mexico e O Ventre Negro da Aranha em Portugal.
As companhias por trás dele são Estúdios Da. Ma. Cinematografica e Production Artistique et Cinématographique (PAC), distribuído por Cinema International Corporation (CIC) na Itália e Metro-Goldwyn-Mayer em boa parte do mundo.
Paolo Cavara era um roteirista e diretor de carreira já consolidada no início dos anos setenta. Sua produção mais conhecida certamente é a bizarra coletânea Mundo Cão lançada em 1962. Ele também fez o drama O Olho Selvagem (67) e o giallo E Tanta Paura de 1976.
O argumento ficou a cargo de Marcello Danon, profissional mais conhecido por ser produtor, tanto desse como em Aquele que Deve Morrer (57), Assassinos de Aluguel (68) e A Gaiola das Loucas.
Lucile Laks é o roteirista deste giallo, tendo entre os seus trabalhos mais lembrados Johnny, O Irresistível, onde escreveu o argumento, e claro, À Procura do Meu Homem, cujo roteiro ele assina.
A trama começa direto na ação, sem grandes preparações, mostrando corpos sem roupas, embaçados por uma superfície de vidro. A princípio esse lugar parece o de um escritório, mas é na verdade um consultório, uma sala de um spa.
A sala de massoterapia é cheia de belas mulheres, que transitam à vontade e sem pudor, andam como vieram ao mundo, embaladas pela música instrumental faceira, composta por Ennio Morricone junto a Bruno Nicolai.
Nesse ponto ainda não se nota, mas o trabalho de trilha é bem único, com vocalistas exalando o tema principal, alguns momentos sem instrumentos, à capela.
Ainda nesse início é mostrada a nudez da bela senhora Maria Zani, personagem de Barbara Bouchet que em suas primeiras falas já determina quem ela é e o que sofre. No telefone ela discute com o seu marido e o conteúdo da conversa é obviamente indiscreto.
Apesar de não se ouvir nesse trecho a voz do homem, fica claro que ele está insatisfeito, que está brigando com ela. Maria por sua vez se defende usando sua condição como álibi. Ela afirma que é uma ninfomaníaca, sendo assim, fosse o que fosse, suas atitudes estariam justificadas.
Bouchet tinha uma carreira que englobava obras de diversas temáticas. Fazia filmes de horror, de drama etc. Uma rápida leitura, nos nomes das obras que estrelava, dão a dimensão do que ela geralmente fazia, já que teve papéis em Não Cometa Atos Impuros e Em Busca do Prazer. Dentro dos filmes de horror, ela é muito lembrada por ter um papel no clássico O Segredo do Bosque dos Sonhos, do genial mestre Lúcio Fulci.
Não demora a entrar em tela o assassino misterioso, que acerta Maria depois que ela discute ferozmente com seu marido, Paolo Zani, de Silvano Tranquilli.
A ideia que o roteiro passa é que a devassidão foi a causa do infortúnio dela, mas obviamente que isso não fica patente, tendo uma resposta apenas no final.
O cenário do spa chama a atenção por ser habitado quase sempre por gente nua e embora assim seja, não é tão visitado pela câmera quanto faz parecer o início da fita. Ainda assim, um funcionário ali se destaca, o massagista interpretado por Ezio Marano, homem esse apresentado com óculos escuros grosso, que parece ser cego.
Logo entra na trama o detetive e inspetor Tellini, feito por Giannini, que ainda era jovem. A aparência dele está diferente, mas é praticamente impossível não lembrar dele fazendo Mathis nos filmes de 007 décadas depois.
O investigador fica impressionado com o modo de matar do vilão, sempre paralisando suas vítimas, diante de um espelho. O movimento consiste em enfiar um pedaço de metal semelhante a uma agulha, ele coloca no pescoço delas para que elas possam enxergar a vida indo embora a medida que sangram.
É de uma crueldade atroz, já que transforma as futuras mortas em vítimas de um voyeurismo macabro, uma vez que elas assistem o próprio fim de maneira passiva.
As mortes seguem, moças são assassinadas, quase todas têm algum pecado ligado a elas, inclusive crimes. Uma das moças, interpretada por Annabella Incontrera, tinha acusações de ser uma traficante. Ela é assassinada em uma loja de roupas, cercada de manequins, que também lembra o cenário de Seis Mulheres Para o Assassino.
O detetive encontra Paolo Zani, que acaba sendo um suspeito óbvio, já que é marido da primeira vítima. Ele quer conversar com o policial, mas acredita que pode morrer caso se entregue.
Ele tem o inspetor na mira, tem oportunidade de matá-lo mas não o faz, até pede ajuda para ser inocentado. No entanto não passa de um despiste, já que morre pouco tempo depois, em uma brutal perseguição.
Uma característica curiosa e bastante estranha do assassino são as suas mãos. Ele usa luvas marrons, cuja cor é tão esquisita que as extremidades dos membros parecem próteses de madeira, daquelas que se usa quando a pessoa perdeu a mão.
A ideia aqui passa, possivelmente, pela tentativa de desumanizar a figura homicida, tentando tornar ela um alvo de crítica maior, pintando assim o quadro de um monstro.
Filmes de terror da Itália normalmente utilizam muita nudez gratuita. Apesar de O Ventre Negro da Tarântula começar com cenas de mulheres sem roupa só volta a ter nudez de fato com quase uma hora de filme, exceção claro ao ato do homicida em abrir a camisa das vítimas, embora nem sempre apareçam partes erógenas em tela.
Após a introdução, a próxima vez que alguém aparece nu é em um cinema, na grande tela, em uma sessão onde várias pessoas da polícia estão. Tellini sai do recinto nervoso, aparentemente só ele está indignado com o que ocorre na cidade. Ela também acha de péssimo gosto se expor cenas de nudez de uma vítima em um local público, mesmo que seja só para apreciação interna da polícia.
Os assassinatos ocorrem e ninguém mais se preocupa, parece que até os agentes da lei normalizam essa questão. Quando o personagem manifesta a sua angústia ainda tem que receber a ressalva de que ele só está preocupado por conta do cerco do matador, que envolve várias pessoas do seu cotidiano.
Ele sofre um atentado, um acidente de trânsito, onde barras atravessam o vidro de seu carro. Por pouco ele não morre, mas ao sair ele não acha o motorista no caminhão a frente, demonstrando que provavelmente aquilo foi intencional.
Vale lembrar que esse filme ocorreu antes A Profecia, que é outro filme que tem um momento semelhante a esse trecho.
As mulheres sem roupa só voltam a aparecer em grande número quando o spa da cena inicial retorna a trama. O detetive retorna ao lugar, a fim de tentar arrumar pistas, lá ele entrevista e conversa com os serviçais.
Os coadjuvantes que estão nesse trecho do filme são caricatos, alguns até afetados. O texto brinca com a expectativa e com os preconceitos do público. Ele conversa com o massagista cego, até suspeita dele, mas ele retira os óculos e mostra os olhos esbranquiçados.
Fica até com vergonha, não só por não ter tido êxito, mas também por ter posado como alguém intolerante. Depois desse número, ele aceita a estranha proposta de Laura (Claudine Auger), para tentar pegar o assassino enquanto ela se coloca como isca.
A preparação da armadilha obviamente dá errado, Tellini chega depois que a moça morre, enquanto o assassino tem uma estratégia mais esperta, até irônica de certa forma, já que aproveita a movimentação do detetive para ir atrás de sua esposa Anna (Stefania Sandrelli), justamente depois da ausência dele.
O matador chega e tenta matar a moça, mas depois de uma briga, faz a vítima acordar, se não for assim ele não vai gostar, não vai ter prazer.
Esse final é bastante estranho, já que não há qualquer cerimônia em mostrar o homicida sem máscara. Há uma grande explicação no final, tal qual ocorreu com Norman Bates em Psicose, onde se fala que o tal homem foi humilhado por sua mulher no passado, graças ao fato de ser impotente.
Maria Zani provocava ele, usava a mesma terminologia e conteúdo de fala que a esposa assassinava tinha, isso despertou no sujeito sentimentos paranoicos e de ansiedade alta, que fizeram ele iniciar uma onda de assassinatos.
O Ventre Negro da Tarântula é um bom jogo de gato e rato, resultando em um filme soturno, violento, bem atuado e cheio de mensagens pesadas. É uma obra de qualidade indiscutível, um esforço grandioso de Cavara e sua equipe, resultado em um dos mais bonitos exemplares dentro do estilo.
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