Il Sesso del Diavolo é um filme de horror que mistura elementos de esoterismo, perseguição a um assassino e thriller sexual. Coprodução entre Itália e Turquia é normalmente associado dito como um Giallo, para muitos estudiosos é um psicogialli, já que reúne em si elementos do cinema noir e tem uma forma curiosa de lidar com doenças de origem mental.
Lançado em 1971, dirigido por Oscar Brazzi, foi escrito pela dupla Sergio Civinini e Paolo Giordano. Chama a atenção também a sua música e trilha original, do mestre Stelvio Cipriani.
A história acompanha um grupo de italianos que viaja para a Turquia. Entre eles há um cirurgião famoso, que está em Istambul de férias com sua mulher, com sua assistente e com um amigo próximo. O grupo fica em uma casa em Bósforo, cuja proprietária morreu misteriosamente.
Coisas estranhas começam a acontecer em meio a estadia deles. Além dos quatro, há também a presença de uma governanta, que viria a ser uma empregada da tal artista.
Em meio a isso se explora uma trama que tem elementos de espiritualidade, breves discussões sobre domínio mental, bruxaria e reencarnação, utilizando a paranoia e o medo de ficar louco como explicação lógica para a trama. É, portanto, uma obra que se aproxima do tropo que Psicose de Alfred Hitchcock pregou 11 anos antes.
Os Psicogialli eram filmes do estilo Giallo, mas possuíam alguns temperos a mais. Eram normalmente mais sensuais que o comum dentro do gênero, com assassinatos mais ligada a sedução e sexualidade e não necessariamente a um assassino mascarado misógino, embora eles possam sim ter uma verve de ódio as mulheres, algumas vezes utilizando até as vestimentas comuns aos filmes de Dario Argento, como em O Pássaro das Plumas de Cristal.
Os Psicogialli são chamados assim graças a semelhanças que tem com Psicose, mas não exatamente graças ao plot twist afinal, quase todos os gialli tem uma grande virada nos últimos momentos, mas sim por apontar uma condição insana como fonte da maldade de um assassino, fosse em série ou passional.
São parte desse segmento O Louco Desejo, Tão Doce Quanto Perversa, O Doce Corpo de Deborah, Ambiciosos Insaciáveis etc. El Sesso del Diavolo tem em comum com esse a exploração de belas mulheres como alvo da maldade, poucos assassinatos e muita ambiguidade no que toca a demonstração de quem são os vilões do filme.
O longa estreou na Itália em 26 de janeiro de 1971, mas em Milão estreou apenas em junho de 1972.
O título original da obra é Il sesso del diavolo, que significa O Sexo do Diabo em português. Também pode ser encontrado em inglês como Sex of the Devil ou Trittico.
Sobre Il trittico ou tríptico, esse é o título de uma coleção de três óperas de um ato cada, compostas por Giacomo Puccini, normalmente apresentadas em conjunto e pela ordem: Il tabarro, Suor Angelica e Gianni Schicchi.
A estreia mundial no Metropolitan Opera House de Nova Iorque em 14 de dezembro de 1918, geralmente era acompanhado de um conjunto de três pinturas unidas por uma moldura tríplice, dando o aspecto de serem uma obra só, com três gravuras formando uma única imagem. É uma criação da arte cristã católica, usada especialmente em quadros devocionais.
O longa foi filmado em 1970, em Istambul, feito pelo estúdio Chiara Film Internazionali. A distribuição na Itália foi da Indipendenti Regionali.
Brazzi dirigiu Vita segreta di una diciottenne, Intimità proibita di una giovane sposa, Il gatto di Brooklyn aspirante detective e Giro girotondo... con il sesso è bello il mondo e Champagne...e fagioli.
É mais conhecido por ser produtor, em A Casa Intolerante, Viva a Itália, a minissérie Coralba, foi produtor não creditado em Fantasmas de Biquini e em Madre Teresa de Calcutá: Um Exemplo de Vida. Foi produtor associado em Uma Rosa para Todos e produtor executivo em A China Está Próxima.
Sua dupla de escritores Civinini e Giordano escreveram apenas esse filme em suas carreiras, ao menos é o que é a eles creditado.
Cipriani foi compositor em vários westerns spaghetti, como Bounty Killer, O Pistoleiro Mercenário e O Forasteiro Silencioso, também no filme de corrida Le Mans - Atalho para o Inferno e nos dramas de horror e suspense Anônimo Veneziano, Mansão da Morte de Mario Bava e A Morte Caminha de Salto Alto de Luciano Ercoli.
A trama começa animada pela música de Cipriani, mostra os créditos iniciais com ações futuras, em uma espécie de resumo da trama.
As pessoas aparecem em festas, viagens de navios, exibindo especialmente o médico Andrea (Rossano Brazzi) e a modelo Barbara (Maitena Galli) em ações sem roupas, despidos, como aliás ficariam em boa parte da trama.
Esse filme não tem muito pudor em mostrar carne feminina para o espectador, ao contrário, isso é parte integrante da história, algo dramaticamente fundamental.
Os dois aparecem transando antes de sequer serem apresentados, já dando a nota de como são, de como agem diante de conflitos, sempre apelando ao torpor da sexualidade, seguindo apenas pulsões e taras, não que ser sexualmente ativo tenha a ver com algum tipo de insanidade, mas para os dois parece haver apenas a alternativa da libido para frear pensamentos ruins, conflitos e afins.
O casal dorme em camas separadas, aspecto esse comum a pares que vivem brigando, mas isso apesar de chamar a atenção do espectador, ocorre graças a um motivo de força maior, afinal, estão juntos em um quarto no navio, que não comporta uma cama de casal por falta de espaço.
A trilha sonora deste filme baseia-se fortemente em In A Gadda Da Vida' da banda Iron Butterfly - uma música que deve ter tido um impacto profundo no compositor Cipriani, já que a linha do baixo dela também pode ser ouvida brevemente em sua partitura para Mansão da Morte.
Já em Istambul, encontram o casal encontra Omar de Fikret Hakan, depois a bela Silvia (ou Sylvia) de Sylva Koscin a desconfiada e bela assistente de cirurgias de Andrea.
Omar acompanha Andrea a maior parte do tempo. Em conversas amistosas, Omar diz que o mar está escuro, preto como chumbo, enquanto Andrea diz que o mar sempre o deixou triste.
Fica a dúvida se ele fala sério ou se só está brincando com Omar, menosprezando a sua conversa despropositada.
Barbara é apresentada como uma mulher fútil, com interesses tolos e aparência linda. Foi modelo fotográfica, mas nunca posou nua, ao menos é o que diz, já que ela aparece nua diante das lentes de alguns artistas na Turquia,
Já Sylvia é mais recatada, está sempre vestida. Começa a mudar de postura se vestindo de maneira mais provocante após tomar um chá estranho, que causa nela sensações de delírios.
Nesse ponto fica a dúvida se ela estaria dopada, se tem contato com um fenômeno espiritual ou não. As explicações acontecem apenas perto do final.
Omar acha que a casa onde estão hospedados é um lugar familiar. Depois de pesquisar enfim percebe que aquele era o lar de uma pessoa conhecida dele e do público.
A mansão era o antigo lar de uma artista já finada, chamada Claudine Blanchett. A moça era uma artista plástica francesa, que fez várias pinturas, afrescos, esculturas e estátuas, algumas inclusive habitavam os jardins desse lugar.
Ele reconheceu pelas estátuas do quintal, já que nunca foi ali antes. Claudine e Omar eram conhecidos, a última vez que a viu, foi em Paris, diz também que ela morreu nessa casa, enforcada, do lado de fora, pendurada em uma árvore.
Quando conta a história ele olha para fora e vê a mulher pendurada pelo pescoço, morta.
Essa foi uma ilusão, foi uma visão sua? Mais alguém viu? Há interferência sobrenatural na trama? São questões levantadas e não respondidas.
Fora os já citados, há também uma importante personagem: a governanta da casa.
Seu nome é Fatima, personagem da veterana atriz turca Güzin Özipek, que esteve inclusive no clássico e influente Kadin Düsmani, de 1967, filme que previu os clichês dos gêneros conhecidos como Krimi e Giallo. Era casada com o também ator Aydin Tezel, que aqui, interpreta Leonid Oblomov.
Ela é das mulheres mais misteriosas e assustadoras da trama, não faz uma simples serviçal, tanto que flerta com a condição de bruxa e feiticeira esotérica. De cara, ela assusta Silvia, mas logo se mostra simpática, diz que o lugar onde ela está foi em outro momento, o quarto de sua patroa morta.
Mais tarde, ela é colocada em algumas posições bastante curiosas. Como falaremos sobre o final, falaremos a respeito de spoilers. Fica o aviso.
Entre lamurias dos outros personagens, possíveis traições e inseguranças, Fatima veste Silvia com as roupas de Claudine.
Ela fica linda, até Barbara a elogia. A partir daí Sylvia passa a não ter mais vergonha de suas próprias feições. Passa a se apresentar belíssima, em uma noite na beira da piscina.
A assistente passa por Andrea, em uma cadeira de balanço e ele faz menção de acariciar suas partes, de olhos fechados. Isso pode ser encarado como apenas um engano, mas o filme deixa pensar que ele percebeu quem era, mesmo que não esteja olhando, já que ele hesita, paralisa, fica congelado, enquanto sua esposa observa atrás.
Quando Barbara finalmente passa por ele, Andrea segura a mão dela e faz menção a começar o coito, mas ela não quer, o refuga, embora ceda a ele.
Enquanto eles se enroscam, se nota a imagem de Fatima ao fundo, em um efeito estranho, parece estar trabalhando em um feitiço, que envolve até xícaras de chá, que lembram o que seria mostrado em Corra! de Jordan Peele.
Omar e Andrea vão para a cidade, atrás de obras de Claudine, tudo que ela fez está nas mãos de Oblomoff, um senhor que fez questão de comprar tudo o que tinha na loja de um especialista turco. Os dois compram alguns rascunhos, que sobraram.
Omar diz que vai voltar para sua cidade, Ancara, mas antes da despedida, salva o amigo pegando um sujeito que jogou uma faca nele. A trama é cheia dessas confusões, as pessoas parecem estar tão ambientadas ao caos e confusão que nem sequer discutem sobre a tentativa de homicídio.
Em outro momento, Barbara diz para Omar que está cansada do marido, enquanto os dois estão sozinhos, no barco. Até há a menção a um possível adultério, mas até onde se vê, isso não chega a acontecer.
Já Andrea joga xadrez com Fatima, pouco antes de Silvia entrar na casa, bela e convidativa. Nesse ponto, ele passa enfim passa a mão por seu corpo, aproxima seus dedos do sexo dela, mas se impede de seguir. Diz ser fiel a mulher, embora flerte sempre com a traição, mas parece na verdade estar sendo impedido por algo maior, talvez sobrenatural.
Em uma noite Andrea, Silvia e Barbara vão a um bar restaurante, ver uma exibição sensual de dança do ventre. Enquanto se entretém, o homem fica cismado com um broche dourado de escorpião, que era um símbolo muito presente na arte de Blanchett.
Nesse mesmo momento, são mostradas ações de Fatima, em casa, em um como misterioso cômodo, lidando com um escorpião vivo, preso em um copo de vidro, na mesa de jogos de azar da casa. Esse é um feitiço, claramente, que interfere no cotidiano do trio, causando alvoroço até em Andrea, que sai do bar gritando, sem motivo.
O final é cheio de reviravoltas, devaneios, discussões sobre arte, sobre Oblomoff e sobre o tritico. O encanto enfim alcança o homem, fazendo ele enfim se encantar por Silvia/Claudine, que aparece vestida apenas com um véu na parte de cima do corpo, com seios quase a mostra.
Na beira da praia, ela retira o pano e se entrega a Andrea. A imagem é distorcida bizarramente, para soar onírica e termina com a mulher rindo.
Esse encontro carnal parece ter dado ideias a ele, que enfim passa a perseguir o sujeito que tentou matá-lo, entendendo enfim que é o mesmo Oblomov que comprou as artes de Claudine, aparecendo morto logo depois.
O final é em parte misterioso e em parte bem expositivo, com Fatima lamentando não ter matado o assassino de sua patroa antes (Oblomov) fazendo com que Barbara também se vista como Claudine, depois da modelo ver um pequeno escorpião.
O desfecho é misterioso, teria Barbara matado o escorpião quebrando o feitiço, fazendo Claudine ter seu espírito na velha Fatima, que resolveu se enforcar como a artista, ou teria uma das mulheres de Andrea enforcado ela? A consciência de Blanchett ainda existe? Estaria ela fragmentada no espírito da dupla de italianas e na empregada turca?
Caso o espírito estivesse sobre Fatima, explicaria o enforcamento, já que a moça se suicidou em uma vida, poderia fazer de novo, mas o roteiro é misterioso, com muita mais perguntas e poucas respostas.
Il Sesso del Diavolo é um thriller sensacional, uma baita obra de suspense, com final sensacionalista, boas atuações e uma exploração dramática sensacional. É sem dúvida alguma uma obra intrigante, que vale a pena ser apreciada, além de ter previsto tendências, enquanto o estilo do giallo ainda estava se fundamentando como um segmento de horror popular.