As Sete Vampiras é um filme nacional que mistura elementos de suspense, comédia e um pouquinho de horror. Longa-metragem de gênero, conduzido pelo mestre do terrir Ivan Cardoso, é uma produção lançada em 1986 que reúne alguns nomes bastante célebres em seu elenco.
A história parte de um mistério, que vitima o marido de uma professora de dança, moça essa que depois desse trauma, se isola em uma casa de campo. Ela é convencida a abandonar o seu retiro e reclusão quando um amigo de longa data a convida para ajudar em uma boate que ele possui. Em meio a isso começa uma estranha onda de assassinatos, cujas características variam entre o modus operandi de um assassino serial e elementos estranhos, como a drenagem de sangue dos vitimados, fato que faz suspeitar serem ataques de um vampiro.
Curiosamente, a protagonista monta um espetáculo coreográfico chamado As Sete Vampiras, ou seja, a temática é duplamente presente aqui.
A obra conta com a participação da banda João Penca & Seus Miquinhos Amestrados, do trapalhão Dedé Santana, do humorista Tião Macalé em pequenas participações. O seu elenco principal é repleto de nomes que ficariam ainda mais famosos depois do seu lançamento, falaremos logo mais sobre.
A direção é de Ivan Cardoso, a história original é dele e de R.F. Lucchetti, que assinava Rubens Francisco Lucchetti, com roteiro desse último.
A equipe criativa tem em Oscar Ramos seu diretor de arte, Carlos Egberto faz a direção da fotografia, Gilberto Santeiro montou, Júlio Medaglia fez a música, já a canção título é de autoria de Léo Jaime e do pianista Bené Nunes, ambos têm papéis consideravelmente importantes aqui.
Maria da Salete fez a produção executiva, mas é também produtora, junto a Cardoso, Antonio Avilez, Flávio Holanda, Cláudio Klabin e Mauro Taubman.
O longa teve estreia no Festival de Gramado em 1986, chegando aos cinemas comerciais em dezembro desse ano. Em Portugal estreou em fevereiro de 1987 no Fantasporto Film Festival. Também participou do finlandês Helsinki International Film Festival em 1988.
O filme tem poucas variações de nome, com a maioria sendo traduções literais como The Seven Vampires. Na Finlândia foi chamado de Seitsemän vampyyria, na Grécia é Οι επτά βρικόλακες, na Rússia era Семь вампиров.
As gravações do filme foram na cidade imperial Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro. Essa é uma obra da Embrafilme, da Skylight Cinema Foto Art e da Super 8 Produções Cinematográficas.
As vendas internacionais foram feitas via One Eyed Films em 2023. A distribuição nos Estados Unidos foi da Something Weird Video (SWV) em vídeo 1997, mas apenas para o mercado de fitas cassetes. Na Finlândia foi distribuído pela Yleisradio (YLE) em 2010.
Ivan Cardoso já tinha feito um filme sobre vampiros, no caso, o curta Nosferatu no Brasil de 1970. Também fez os curtas Sentença de Deus, O Universo de Mojica Marins e os longas O Lago Maldito, O Segredo da Múumia e Os Bons Tempos Voltam, Vamos Gozar Outra Vez.
Lucchetti escreveu muitos filmes com José Mojica Marins, entre eles, O Estranho Mundo de Zé do Caixão, Exorcismo Negro e A Estranha Hospedaria dos Prazeres. Escreveu junto a Cardoso O Segredo da Múmia e O Escorpião Escarlate.
Antonio Avilez e Mauro Taubman fizeram apenas esse, Flávio Holanda só produziu esse e foi operador de câmera em O Grande Palhaço, Cláudio Klabin produziu também À Meia Noite com Glauber Rocha,
Foram assistentes de direção José Alvarenga Jr. de diversos programas de televisão e dos filmes A Princesa Xuxa e os Trapalhões, Os Normais: O Filme e 10 Segundos Para Vencer. Sérgio Rodriguez também foi assistente e operou câmera César Elias de Boca de Ouro e Sete Gatinhos.
Salete foi produtora em A Cor do Seu Destino e Mistério no Colégio Brasil. Ela fez produção executiva em Prova de Fogo, O Beijo no Asfalto, Menino do Rio, Aventuras de um Paraíba, Memória do Cárcere, Rei do Rio, Os Trapalhões no Auto da Compadecida e O Escorpião Escarlate. Fez produção de unidade em O Que é Isso Companheiro.
No Festival de Gramado o longa recebe um prêmio do júri, também premiou a atuação Zezé Macedo, melhor cenografia para Oscar Ramos além do Prêmio Edgar Brasil de Fotografia para Carlos Egberto Silveira. No Rio-Cine Festival concorreu e ganhou os prêmios de melhor filme e melhor atriz coadjuvante, para Andréa Beltrão. Recebeu menção honrosa de fotografia, montagem e direção de arte.
A narrativa inicia com uma música engraçada e histriônica, na chegada um navio ao cais. Ali aparece uma caixa enorme, com um buraco no meio, por onde se coloca carne de 3 em 3 horas. Aqui há a participação do humorista Tião Macalé, como conferente do porto.
É o seu personagem que acha estranho o procedimento com o caixote. Claramente se faz referência a chegada do conde vampiro até o seu destino, como ocorreu na cópia alemã Nosferatu e em Drácula, o livro de Bram Stoker.
Um homem vem buscar o recipiente de madeira, Frederico Rossi, o Fred de Ariel Coelho, ator e humorista conhecido por obras como Selva Viva, Eternamente Pagu e a famosa minissérie Engraçadinha: Seus Amores e Seus Pecados. Aqui o personagem é um cientista, encarregado de cuidar dessa valiosa e rara encomenda.
Ivan Cardoso é sem vergonha, coloca Alfred Hitchcock para apresentar o filme, dubla ele para citar o nome da obra, muito provavelmente sem autorização. A dublagem aliás é do estúdio Delart, com mixagem da Álamo.
A cartela de elenco é recheada de nomes famosas, cita nomes conhecido da televisão e cinema da época, como Nuno Leal Maia, Andrea Beltrão, Nicole Puzzi, Wilson Grey, Suzana Mattos a futura companheira de Dedé Santana e Pedro Cardoso.
Também se destaca as participações especiais de Lucélia Santos, Carlo Mossy, Johnny Herbert e Tânia Bôscoli.
Fred cuida da caixa, que dentro de si guardava uma planta estranha, um objeto feito de efeitos práticos manufaturado pela Bertoni Efeitos Especiais e por Oscar Ramos.
Apesar de simples todo o conjunto imagético é bem empregado, inclusive as trucagens, que são creditadas para a Movedoll.
É bastante curioso e risível a razão de ser dessa criatura. É um vegetal que se alimenta de carne, que veio da África e que vai ser cuidado por esse personagem. As moças que acompanham Fred ficam preocupados com ele, tanto sua amiga Clarice (Mattos) quanto sua esposa Silvia (Puzzi) especialmente a segunda.
No desespero por verificar se o rapaz estava bem, Silvia acaba "ajudando" a matar ele, já que ela liga para o homem justamente no momento em que ele alimenta a planta, fazendo com que um dos tentáculos toque nele, derrubando para um tombo fatal, já que a planta atacou o homem.
É curioso que ele não tomou qualquer medida de segurança para alimentar um ser predatório, cuja matéria base da alimentação é a mesma que forma o seu corpo, mas pudera, essa devia ser a primeira vez que ele fazia isso.
Cardoso simplesmente coloca a música que Bernard Herrmann fez para Psicose na cena que Silvia dirige na chuva, para tentar ajudar Fred. Deixa claro que valoriza muito o Mestre do Suspense, Hitchcock, embora tenha total noção de que a sua obra e o seu cinema tem espíritos completamente diferentes dos dele. De modo algum parece desrespeitoso com o diretor de Um Corpo que Cai e Os Pássaros, ao contrário, é bem humorado em suas referências e reverências.
Como essa é uma produção da Embrafilme dos anos 1980, seria natural aguardar uma estética semelhante à das pornochanchadas, ainda que esse tenha alguns temperos à mais, como o apelo ao fantástico e ao mistério. Para isso, ele coloca o Luís de Carlos Mossy, tendo uma relação carnal bem forte com Clarice.
Todo o esforço do rapaz é o de distrair Clarice, especialmente depois que se sabe que Fred pereceu e que Silvia mudou muito após essa. O que o filme tenta empurrar ao público é que de fato isso ocorreu, mas não exatamente graças a perda e sim por uma mudança fisiológica...
Logo depois dessa cena, ocorre um ataque e obviamente se associa a figura da menina reclusa com esses momentos.
Uma dupla de policiais discute sobre o crime, o doutor Camargo feito por Bené Nunes é incrédulo, enquanto o jocoso Inspetor Pacheco (Colé Santana) acha que isso os assassinatos foram feitos por um vampiro.
A maioria dos personagens é introduzido sem muita apresentação, o mesmo pode se dizer do magnata Rogério, um amigo de Fred, vivido por Johnny Herbert. Ele quer ajudar Silvia. Até pede para ela o ajudar a cuidar de sua casa de show, mas ela não quer trabalhar, ainda mais em um lugar que só funciona na parte noturna do dia.
Aqui se nota que ela anda de dia, ou seja, a crença de que ela é uma morta-viva no estilo Drácula não parece ser plausível, embora algumas obras brasileiras sobre vampiros não compreendam fraqueza ao sol. A novela Vamp de Antônio Calmon, lançada em 1991 não tem essa questão.
A verdade é que o roteiro de Lucchetti brinca o tempo todo com essa questão.
Depois de breves minutos, ela aceita o trabalho, até pensa em executar lá a Dança das Sete Vampiras, que é o seu show de dança, de balé.
A obra possui alguns apelos a nudez, a primeira delas envolve Mattos e Mossy, com muito destaque para a primeira, obviamente. O conjunto de personagens não é muito profundo, a maioria se baseia em arquétipos sacanas. Eles cabem bem na proposta trazida e no formato que se apropria das chanchadas clássicas.
Levando em conta o caráter dúbio da maioria dos presentes em tela, há alguns bastante bizarros e pitorescos quando comparado ao todo, que já é estranho no geral. Nesse quesito, se destaca o Barão, personagem sexista e voluntarioso, feito pelo cantor e humorista Ivon Cury. Seu papel se resume ao envolvimento que tem com a bela Elisa Machado, personagem de Lucélia Santos.
Outra figura estranhíssima é o imitador de Fu Manchu, feito por Wilson Grey, o mesmo que protagonizou O Segredo da Múmia.
As tais sete vampiras são feitas por Lucélia Santos, que é a já citada aspirante a atriz Elisa, que sonha em ser estrela da Atlântida, Simone Carvalho como Ivete, Suzana Mattos como Clarice, além de Daniele Daumerie, Alvamar Taddei, Dedina Bernardelli e Tânia Boscoli.
Na exibição as vampiras atacam um rapaz incauto, o faz tudo e contrarregra Pedro, feito por Pedro Cardoso, que aliás, é primo do diretor. Elas são exibicionistas, mostram seus seios nus, especialmente Elisa.
Elas se esfregam no rapaz na hora dos ensaios, fazem um número bastante quente no aquecimento.
A trama segue, mostrando a série de assassinatos. As vítimas morrem quase sem sangue, com feridas no pescoço e mãos, que também não sangram, curiosamente, é como se fossem drenadas. Fica a dúvida do motivo disso acontecer, caso não haja realmente um componente fantástico no filme, já que se brinca com isso o tempo inteiro. Existe uma possibilidade de explicação, mas não se gasta tempo de tela para isso.
Ivete testemunha sobre a morte de Rogério, vai até a polícia, mas não fica satisfeita com isso. O personagem de Condé Santana segue falando que pode ser um vampiro. De todas as piadas repetitivas, essa é uma das melhores.
Nuno Leal Maia faz o detetive particular Raimundo Marlou e é apresentado da maneira mais canalha e tosca possível, lendo gibis de mistério, na mesma sala onde está a sua voluptuosa assistente Maria, de Andrea Beltrão.
Maria ajuda o investigador a tomar o depoimento de Ivete, ao fim do relato dela, eles terminam fumando vários cigarros, em um simbolismo para uma cena de sexo.
É mostrado Leo Jaime, fazendo o seu personagem Bob Rider, canta a música que coincide com o nome do filme, junto a banda João Penca e seus Miquinhos Amestrados. Essa parte funciona quase como um videoclipe no meio do filme. A música dançante é bastante conhecida, talvez até mais que o filme.
Ele dança bem, o visual e figurino lembram roqueiros antigos, variando entre o Rockabilly e o movimento do rock clássico e dançante, que permeava as discotecas brasileiras na época da Jovem Guarda.
Ivete some e o detetive toma ciência disso. A onda de matança segue, inclusive com um corpo cujos dentes caninos pontudos ficam em destaque. O cadáver é encontrado por um faxineiro, que por sua vez, é interpretado pelo trapalhão Dedé Santana.
Maria se infiltra na boate, acreditando que pode encontrar alguma pista ali. Em sua incursão, ela tem confrontos com Rina, personagem da humorista Zezé Macedo, mas aos poucos, encanta e se afeiçoa por ela, que a trata de forma tão fofa que parece uma espécie de pupila da veterana artista.
Pedro segue sendo um personagem ativo. Aparece como um voyeur onanista, que verifica Elisa se trocando. Ele é tratado como um profissional de bastidores, um homem de baixo escalão, nervoso e tarado.
Durante o decorrer do filme são enfiadas várias cartelas de tempo, quase não há passagens cronológicas sem esses avisos.
Bizarro que até os quinze minutos finais não existe uma aparição óbvia do assassino. O sujeito aparece um sujeito vestido como entidade da ópera, com máscara e capa quando se chega a 74 minutos.
A partir daqui falaremos sobre os rumos finais do final. Deixamos um aviso de spoilers.
Nesse ponto, As Sete Vampiras imita a estética de Filmes de Matança, inserindo elementos da pornochanchada, como nudez gratuita e piadas de duplo sentido
Raimundo segue tentando emular os heróis dos gibis e livros, até cita Sherlock Holmes como inspiração, mas nada consegue, é um dos tantos alívios cômicos do filme. Todo o seu desempenho é em tom de piadas, ele parece um espécime das comédias de teatro de revista, tolo, bobo, repleto de piadinhas infames.
No final são inseridos alguns tons de giallo no assassino, já que ele usa luvas negras, máscara uma peruca loira muito falsa. O matador leva Clarice, ameaça Bob Rider com uma faca, quando tem seu rosto revelado, há sangue e deformações, é claramente uma inspiração em O Fantasma Da Ópera.
O assassino é alvejado, só depois de cair, é que se revela que na verdade era Fred, que sofria com efeitos da tal planta, depois de ter contato com ela. Apesar de todo o tom engraçado, o filme acaba tendo contornos trágicos nesse desfecho, mas nada que comprometa a qualidade narrativa do mesmo.
As Sete Vampiras é uma bagunça em matéria de história, que resulta em algo curioso, bizarro e soberbo. É uma boa demonstração do cinema fluminense dos anos oitenta, que resgata um espírito extremamente gaiato, além de louvar bastante o espírito dos textos especulativos de Lucchetti e a forma expansiva e divertida de Ivan Cardoso fazer cinema.
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