O Básico do Cinema - Aquecimento Django Livre

Nesta sexta-feira estreia Django Livre, novo filme dirigido por Quentin Tarantino que, como de hábito na filmografia do cineasta, faz homenagens à diversos filmes, principalmente aos que fazem parte do gênero Western Spaghetti. Como é sempre bom conhecer o original pra se apreciar as referências, este post pretende apontar algumas obras essenciais para qualquer cinéfilo que deseja ir ao cinema conferir o novo trabalho do diretor de Pulp Fiction. Ou simplesmente, qualquer cinéfilo.

Pra começar, o mais óbvio: westerns de Sergio Leone. Os filmes do diretor italiano são referências em quase tudo que Tarantino fez até agora, mas Django Livre é um caso à parte. O trabalho mais conhecido de Leone no gênero é a Trilogia do Homem sem Nome ou Trilogia dos Dólares, tema do último Alerta Vermelho (ouça aqui) e que por isso não será comentada abaixo. Mas existe um outro western tão impactante e importante quanto os três longas estrelados por Clint Eastwood. Vamos à ele:

51KjzKZOARLEra uma vez no Oeste (1968) - Depois do épico Três Homens em Conflito, Sergio Leone até quis parar de fazer westerns, mas a Paramount lhe ofereceu um grande orçamento e a chance de trabalhar com Henry Fonda (seu ator preferido e primeira opção para o papel do Homem sem Nome) e o cineasta não resistiu. Ainda bem, pois criou uma obra-prima, não do gênero, mas do cinema em geral. Além de Fonda, Era uma vez no Oeste ainda conta com Charles Bronson e Claudia Cardinale, completando o elenco de astros da época. Bem diferente em tom, quando comparado com a Trilogia dos Dólares, o filme procura ser muito mais sério e grandioso. E consegue. Mesmo com suas longas cenas o ritmo não se perde, mostrando o domínio de Leone na direção e no mise-en-scène. O estilo do diretor evoluiu a cada filme até chegar em Era uma vez..., que de tão ambicioso parece ter sido mesmo o resultado de anos de aperfeiçoamento atrás das câmeras. A cena inicial, com quase 20 minutos de duração, é o maior exemplo do êxito cinematográfico que é esta película. Coloca o espectador dentro daquele universo e indica como será o ritmo nas 2 horas e 40 minutos que estarão por vir. Tudo isso roteirizado por Bernardo Bertolucci, Dario Argento e pelo próprio Leone e acompanhado pela magnífica trilha sonora de Ennio Morricone.

inglouriousbasterds-14Bastardos Inglórios (2009) - Tarantino se apropria do estilo narrativo de Sergio Leone em Django Livre, mas esta não é a primeira vez que isso acontece. Em sua obra anterior, o cineasta também demonstra inclinação para o mesmo tipo de tom que o italiano trazia em seus trabalhos. Já na longa sequência de abertura, cria algo semelhante ao que Leone faz em Era uma vez no Oeste. Além disso, Bastardos e Django Livre fazem parte de uma trilogia, segundo Tarantino. Uma série de filmes que pretende mostrar abusos (nazistas contra judeus no primeiro e brancos contra os negros no segundo)? Ou três longas que pretendem fazer uma revisão de fatos históricos? Uma resposta pra isso apenas quando o terceiro filme estrear, o que deve demorar. De qualquer forma, este é o ápice do aclamado diretor, que demonstra maturidade em diversos momentos. Assim como acontece com Leone, a impressão é que a filmografia de Tarantino também o levou ao êxito de Bastardos Inglórios, tornando o longa uma evolução natural de seu próprio estilo.

django66-posterDjango (1966) -  Embora falte ao filme de Sergio Corbucci, a mesma competência técnica das obras de seu compatriota Leone, Django é tão importante para o gênero Western Spaghetti quanto a Trilogia dos Dólares. E, obviamente, Tarantino mostra isso ao se apropriar do nome do protagonista em seu novo filme, além do tema musical de Luis Bacalov. Uma das coisas mais marcantes de Django é sua iconografia: o pistoleiro vestido de negro, vagando pelo árido cenário da trama, arrastando um caixão para onde quer que vá. Não tem como um personagem assim não ficar para sempre na mente do espectador. A história é simples e até lembra um pouco Por um Punhado de Dólares com o personagem principal chegando a uma cidadezinha dominada por dois grupos: o primeiro liderado por um fazendeiro e que serve como referência aos primórdios da Ku Klux Klan e o segundo formado por mexicanos exilados de seu país natal. Claro que se de um lado existe uma facção racista, o outro lado vai sofrer as consequências e Corbucci faz questão de mostrar o quão cruel pode ser a discriminação, com o vilão branco matando latinos por pura diversão. Se Leone tinha Eastwood, o outro Sergio ataca aqui com Franco Nero, que não fica devendo nada ao ator americano. Sua expressão, logo de início, já demonstra que Django não é uma pessoa para se passar a perna. A produção de Corbucci é também muito mais violenta, com cenas que chegaram a fazer a censura inglesa bani-la até o começo dos anos 90. Hoje até parecem bobas, mas para a época eram realmente pesadas (especialmente a que envolve uma orelha).

il grande silenzioO Vingador Silencioso (1968) - Há quem diga que Corbucci fez este filme como uma resposta à visão ingênua de Leone à respeito dos caçadores de recompensa, os heróis de Por Uns Dólares a Mais. Em O Vingador Silencioso, eles são tudo, menos isso. Aqui, são mostrados como impiedosos assassinos, cujo valor da recompensa importava mais do que qualquer coisa e não era empecilho para, por exemplo, tirar a vida de um procurado na frente de sua própria mãe ou esposa. E, como o vilão interpretado por Klaus Kinski diz durante a produção, era tudo dentro da lei. Esta é a obra-prima de Sergio Corbucci. A discussão que o cineasta promove acerca da influência do dinheiro na aplicação da justiça e como o capitalismo influencia diretamente na criação de pequenos criminosos (culpados de roubar para sobrevivência) tornam O Vingador Silencioso um filme muito mais complexo e de muito mais ambição que outros títulos da época. A forma como mostra as autoridades oficiais, como o Xerife recém-chegado à cidade, também toma característica de crítica reservando inclusive um desfecho nada agradável para o personagem, o único que parece realmente disposto a fazer o bem. E por falar em desfecho, Corbucci surpreende com um final que funciona como um soco no estômago do espectador, além de ser carregado de simbolismos religiosos e sociais (o cineasta teria criado o protagonista mudo como uma referência à Jesus Cristo e Che Guevara). Tarantino já admitiu que as cenas na neve em Django Livre foram fortemente inspiradas pela ambientação de O Vingador Silencioso. Além disso, um dos caçadores de recompensa tem o mesmo sobrenome do personagem vivido por Christoph Waltz na nova produção e que é, também, um caçador de recompensa.

Vale também mencionar outros títulos como Mandingo (de 1975, sobre a prática de colocar escravos para lutarem até a morte), Hannie Caulder (de 1971, que mostra uma garota em busca de vingança, aprendendo a matar com um caçador de recompensas) e Boss Nigger (uma mistura de western com blaxploitation produzida em 1975).

Alexandre Luiz

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