Pânico 4 foi bastante elogiado pela crítica geral, também foi valorizado por fãs, mas não foi tão bem de bilheteria, tanto que entrou em hiato nos cinemas. Com isso se abriu espaço na década de 2010 para que a franquia Scream ganhasse novos ares, dessa vez na televisão, em um seriado do canal MTV.
Pânico: A Série de TV teve um total de três temporadas e preferimos separar a análise por temporadas, lembrando que a primeira e segunda seguem a mesma história, enquanto a terceira é algo completamente diferente.
Essa temporada inicial foi trazida a televisão pelo trio Jill Blotevogel, Dan Dworkin e Jay Beattie, além de contar com produção executiva do mestre do horror Wes Craven.
É dito que essa história se baseia no Pânico original, mas o que de fato se percebe são semelhanças entre premissas, atualizadas para uma nova plateia.
Já no piloto há uma clara referência a saga, utilizando Bela Thorne, uma atriz já famosa em 2015, para ser a uma reprise da Casey que Drew Barrymore fez no primeiro filme.
Além de ser vítima de um brutal assassinato, ela ainda tem sua intimidade exposta, já que o serial killer registra em live o momento em que é morta. Considerando que ela se preparava para tomar um banho, esse registro se dá em uma situação de alta exposição, claramente.
A pessoa que cometeu esse ato queria não só ser violento, mas também parecia ter um motivo passional para cumprir o homicídio. Os motivos seriam desenrolados ao longo dos capítulos.
Thorne interpreta Nina, uma moça popular do colégio de Lakewood, e é descrita como a perfeita mean girl. É descrita como malvada, megera, popular e inconsequente, há quem defenda que ela era uma bully, então ter uma morte em uma banheira térmica no meio de um banho quente obviamente causa fofocas pelo colégio.
A evasão de informação na internet é um tema recorrente durante a temporada.
A localidade de Lakewood copia bem os clichês de Woodsboro. É um lugar isolado, todos se conhecem, privacidade é um artigo de luxo, portanto.
O lugar, no entanto tem uma história trágica em seu passado. Brandon James, um rapaz com deformidades físicas e mentais cansou de sofrer bullying se revoltou contra seus agressores e cometeu alguns assassinatos,
Fofocas e fatos se confundem, é dado que ele está morto, mas não se sabe ao certo se é verdade ou não. Também rolam boatos de que ele se envolveu com amorosamente com uma da moça popular da cidade, Daisy Anderson, mas tudo parece ser apenas especulação.
Dito isso, na nova trama não há um Ghostface. Possivelmente a máscara tinha direitos autorais não necessariamente ligados aos que a MTV comprou. Na época os produtores usaram outra versão. A VP do canal Mina Lefevre disse que essa seria uma versão mais obscura e evoluída da máscara, mas ainda assim seria baseada no quadro famoso de Edvard Munch, O Grito.
Para Lefevre, a máscara dos filmes era muito plástica, enquanto essa era mais orgânica. Aparentemente na pré-produção se pensou até em usar uma feita de carne. E materiais e teasers promocionais dá até para vislumbrar como seria, mas no lançamento do trailer alteraram digitalmente, dando o tom branco que ficou.
O assassino utiliza uma nova face, diferenciada, que imita a face de Brandon James. Apesar de não ser tão verborrágico quanto a mascarado anterior é dado que esse matador considera James um injustiçado.
As mortes seriam para justificar os seus atos. A mudança obviamente chocou, até por conta de ser Mike Vaughn o dublador da "Voz" agora, mas fato é que ele não deve nada a Roger L. Jackson.
Sendo a máscara uma marca famosa, é natural que houvesse reclamação, mas analisando em perspectiva, era um bom item, assustava e causava um terror emocional de fato.
Atualmente há até quem defenda essa nova versão, que recebeu dos fãs o apelido carinhoso de Brandonface.
Em Lakewood a boataria é espalhada muito facilmente e fofocas pequenas se tornam grandes dramas. É exatamente essa questão que atinge a adolescente Audrey, personagem de Bex Taylor-Klaus, que aos poucos, vai ganhando popularidade durante essa temporada.
No começo, ela é uma excluída, basicamente por se vestir de uma maneira alternativa, quase andrógena. Em meio a sua rotina comum, é vazado um vídeo dela beijando Rachel Murray, interpretada por Sosie Bacon ainda muito nova, bem antes de Sorria.
O conjunto de personagens é formado por jovens que estão no ensino médio, baseado claro em estereótipos. A trama foca especialmente em Emma Duval, personagem da insossa Willa Fitzgerad, que é a Sidney da vez. Ela é filha de Maggie (Tracy Middendorf), a legista da cidade e única pessoa que teve proximidade com Brandon no passado.
Emma foi a melhor amiga de Audrey no passado, mas atualmente eles estão meio afastadas. Além das duas amigas se destacam Noah Foster (John Karna), o nerd viciado em filmes B (é o equivalente a Randy), a popular Brooke Maddox (Carlson Young), o jogador de futebol Will Belmont (Connor Weil), seu amigo Jake (Tom Maden) e Kieran Wilcox, o filho do delegado, interpretado por Amadeus Serafini.
Os personagens tem dificuldades típicas da tenra idade, não tem personalidade muito bem formada, se envolvem em tramas românticas juvenis, sonham em ter um grande futuro. mas sequer discutem o que farão depois da escola.
São todos muito bem-nascidos, todas as famílias parecem ter dinheiro, mesmo os mais pobres. Vale lembrar que nenhum dos interpretes pode ser chamado de grande ator. O destaque maior seria para Taylor-Klaus, em menor escala há elogios também para Karna e Young. Eles têm um pouco de carisma, mesmo que o roteiro trate de sabotar eles em detrimento de Fitzgerald como centro das atenções.
O seriado tenta brilhar em cima de referências, como visto em Pânico 2, na cena em que Randy discute em sala de aula sobre os rumos do cinema de horror.
Os comentários de Noah de que o formato slasher não combina com séries é esperto e se comprova como correto, já que manter o pique das investigações e a onda de assassinatos por dez episódios de 40 minutos é complicado. Tudo tem que ser rápido e nem sempre Scream acerta nisso.
Uma boa saída poderia ser a de emular a boa cena de seriados de horror na tv americana. Fenômenos como The Walking Dead, American Horror Story, Hannnibal e Bates Motel são muito mais bem resolvidas do que essa série. Poderiam facilmente ser alvo dos comentários de Noah. Infelizmente, não são.
Isso parece dos produtores, o que denuncia um receio até de se autorreferenciar, já que o trio tem em comum trabalhos nos bastidores de AHS.
Beattie produziu AHS em 2019 e foi consultor em programas que passam pelo horror, como Criminal Minds, Revenge, Matador. Blotevogel escreveu e foi membro da produção de Shining Vale, série posterior a essa, também voltada ao horror. Já o criador Dworkin escreveu AHS, American Gigolo, foi consultor em Star Trek: Discovery e é showrunner da já cancelada The Lost Symbol.
Obviamente que nas investigações, se cogita um possível retorno de Brandon James, ainda pela fama que fez ao ter matado pessoas 20 anos antes. Essa é uma referência a onda de assassinos mascarados, que retornam do passado, como visto nos clássicos Sexta-Feira 13 Parte 2, Halloween, e nos não tão famosos (mas ótimos) Quem Matou Rosemary e Terror da Serra-Elétrica. A história de Brandon é bastante pesada. É dito que ele matou cinco jovens, depois de ser espancado na escola, quando tentou se aproximar de Daisy.
Ao longo dos episódios, é dado que Maggie Duval era Daisy, que mudou seu nome para se livrar do falatório. No entanto ela vive na mesma cidade, convivendo com as mesmas pessoas de sempre...pensou pouco nessa solução, já que ela é fisicamente igual a quem sempre foi.
O motivo dele ser maltratado obviamente foi graças a sua aparência grotesca, fato que faz ele ter algumas semelhanças com a versão adulta de Jason Vorhess, inclusive ao usar o lago e um cais como cenário de horror.
Outra boa referência foi o presente que Maggie Duval - a mãe de Emma - recebe. A mulher ganha uma caixa com um coração de verdade, tal qual foi em Dia dos Namorados Macabro, com a diferença que o filme canadense era coração de humanos e aqui é de algum animal.
O assassino foi cuidadoso, começou a seguir Emma na mesma idade em que Daisy/Maggie tinha ao se envolver com Brandon.
Mesmo que o texto não seja aprofundado, há questões pontuais, como a tendência a suicídio que jovens deprimidos tiveram nos anos 2010 e que seguem até hoje. Aqui o principal símbolo disso é Rachel, que tem cortes em seus braços frutos da automutilação, não se sabe se por vontade de morrer ou se fez isso apenas para chamar a atenção. Curiosamente a morte orquestrada pelo assassino imita um ato suicida, fazendo ela ficar pendurada, enforcada, encontrada episódios depois.
Vale destacar que os ganchos aos finais dos episódios são de fato muito bons. É fácil encarar a temporada em ritmo de maratona e foi assim que o público brasileiro encarou o programa, já que ele esteve por muito tempo disponível no catálogo da Netflix.
Ao longo da série foi introduzida Piper Shaw (Amelia Rose Blaire), uma escritora mais velha que os personagens centrais, que tinha um podcast sobre crimes reais, mas que conversava com cada um dos personagens centrais. Ela tinha uma grande afinidade com Emma e os outros.
Ela foi a Lakewood atrás da história de Brandon James e testemunhou a série de assassinatos. Por ser um elemento externo, obviamente se tornou suspeita, embora estivesse ali só para produzir seu programa sobre crimes reais.
Hoje podcasts sobre true crime são moda, em 2015 não era tanto. Mais uma vez a franquia previu comportamentos, como foi também em Pânico 4, onde se aludia aos streamers.
Um bom personagem é o chefe de polícia Clark Hudson (Jason Wiles), que por sua vez, é próximo de Maggie. Entre os adultos é o único personagem que possui nuances.
Seu comportamento é curioso, ele tem motivos para se envolver emocionalmente com os casos, mas não o faz. É estritamente profissional e tem uma conduta exemplar.
Mas a série se dedica demais em louvor a Emma, fato que faz com que o público a compare com Sidney Prescott. Ela é quase um pastiche de final girl, não possui o mesmo brilho que a outra protagonista e se permite ofuscar até pela patricinha filha do prefeito - Brooke é muito mais interessante que ela, que dirá Noah ou Audrey.
Quase todas as subplots são mais interessantes do que os rumos de sua vidinha. A trama policial de procura pelo assassino é ótima, mas até ela se curva diante dos desdobramentos no estilo Gossip Girl e Barrados no Baile.
É dito atualmente que o plano inicial era colocar Audrey não só como suspeita, mas também como cúmplice, ou possivelmente coautora dos assassinatos. Como a personagem ganhou popularidade, abriram mão disso.
Independente disso o que se vê é um assassino implacável, que usa métodos copiados de obras contemporâneas e que faz isso bem. As referências a saga Jogos Mortais são bem acertadas, brinca com as expectativas de personagens e público.
A série peca por focar demais em Emma, no retorno de parentes seus a Lakewood e até na motivação "surpresa" do vilão mascarado. Ao menos ela consegue inserir um conjunto de suspeitos grande, e ainda se investe no gore no final, inclusive com exposição das entranhas de um dos policiais, cruelmente morto graças a ação de sua amada.
Os produtores deixaram para o último bloco a revelação e se apela para um clichê bem óbvio, o que não necessariamente é um problema, já que toda saga brinca com os finais falhos das franquias de Filmes de Matança.
A conclusão da temporada é meio patética, com uma forçada de tentar estabelecer casais, que seriam sabiamente abandonados na outra temporada. Apesar da baixa qualidade textual nos primeiros capítulos, a primeira temporada de Pânico: A Série de TV acaba bem, eletrizante e tensa. Seu ritmo melhora ao longo do ano e se torna legal perto do fim e no segundo ano melhoraria ainda mais.
Comente pelo Facebook
Comentários
Comente pelo Facebook
Comentários