Creepshow - Arrepio do Medo: A união entre George Romero e Stephen King

Em 1982 o diretor George A. Romero se preparava para prosseguir em sua principal saga cinematográfica, a trilogia dos Zumbis. Enquanto não realizava O Dia dos Mortos, houve um esforço conjunto entre o cineasta e o escritor Stephen King para organizar uma série de micro histórias, sob a chancela de Creepshow, uma marca multimídia que tem lançamentos até a atualidade.

Creepshow: Arrepio do Medo enfim chegou aos cinemas, em formato de antologia, lembrando os seriados antigos que contavam histórias de arrepiar, mas sem mergulhar demais no vazio existencial e no mal espiritual. A ideia era assustar adultos e entreter adolescentes, podendo alcançar até o público infantil.

A primeiríssima história mostra Stan (Tom Atkins, de Halloween 3), um pai preocupado com a rotina do seu filho Billy. Como bom pai superprotetor dos anos 1980, ele simplesmente proíbe o rapaz de ler um gibi de terror, que carrega o mesmo nome do filme.

Aqui se percebem duas coisas bastante curiosas, primeiro, o amor de Romero por revistas em quadrinhos, já visto de certa forma na composição visual que ele fez em seus zumbis em Dawn of the Dead: O Despertar dos Mortos, seja no tom cinza quase azulado da pele dos mortos andantes ou no sangue em vermelho vivo, como era comum aos gibis italianos e franceses.

A outra é o interprete de Billy, o pequeno Joe King, nome de batismo de Joe Hill, o filho de Stephen King que escreveu o conto Telefone Preto, recentemente traduzido para o cinema por Scott Derrickson.

Creepshow - Arrepio do Medo: A união entre George Romero e Stephen King

Reza a lenda que o pequeno Joe era cuidado pelo especialista em efeitos especiais Tom Savini, contumaz parceiro de Romero, que aqui também faz uma pequena aparição.

Em entrevistas sobre o filme, o especialista em efeitos especiais afirmou que mostrava para o rapaz cenas reais de mortos, com cadáveres dilacerados em fotos de guerra. Isso impressionou tanto Joe que o fez escrever bastante sobre medo e violência explicita anos depois, herdando de seu pai o talento narrativo na exploração do horror.

As historietas que permeiam o filme seriam versões em carne e osso das páginas da Creepshow, breves explorações de fantasia especulativa, que lembram claro os quadrinhos de terror da EC Comics, mas também remetem a séries como Night Gallery e Além da Imaginação, e certamente serviu de inspiração para produções posteriores como Goosebumps e Contos da Cripta.

Creepshow - Arrepio do Medo: A união entre George Romero e Stephen King

O filme foi uma experiência tão legal para os realizadores, que King optou por adaptar para uma graphic novel ainda em julho de 1982. Publicada pela editora Penguin Plume, a revista tinha roteiro do escritor e arte do magistral Bernie Wrightson, um dos criadores e primeiro ilustrador de O Monstro do Pântano, e capa de Jack Kamen, autor da EC Comics.

O filme é bastante estilizado, exibido de uma forma engraçada e curiosa, utilizando os recortes da tela que lembram o passar de páginas de histórias em quadrinhos, além de utilizar muitas onomatopeias, como era no seriado do Batman de 1966.

Aqui, há trechos sobrepostos a outros, como os balões em gibis antigos, repletos de gore, crimes e aparições de mortos vivos.

As histórias são violentas, contém um humor ácido e sádico, debocha de gente pomposa e que se julga superior por ter posses, e não perde tempo explicando como os horrores invadem o mundo real, valorizados pelo trabalho de maquiagem de Savini e pelos efeitos de Cletus Anderson.

Há cinco segmentos, todos contando com uma música diferente, composta por John Harrison acompanhados de uma direção de fotografia de qualidade, cada uma posta de uma forma, assinada sempre por Michael Gornick, que se tornaria diretor de Creepshow 2: Show de Horrores.

A história 1 mostra uma família atacada por um zumbi familiar, já que o pai que foi assassinado anos atrás retorna a vida. Esse trecho tem uma violência considerável, com utilização de zumbis e decapitações.

A segunda é feita por um caipira com claros problemas mentais, interpretado por King, se passa em Castle Rock e lembra de leve as consequências de acidentes radiativos, incluindo referências ao caso do Césio 137 em Goiás, além de outros incidentes com substâncias toxicas que foram mal manejadas.

Creepshow - Arrepio do Medo: A união entre George Romero e Stephen King

Em algumas sequências há atores que eram ou ficariam famosos, como o caso de vingança conjugal que envolve os atores Ted Danson e Leslise Nielsen. Além da curiosidade de ver Nielsen em um papel sério e violento, há também uma boa maquiagem, com uma putrefação que certamente chocou plateias mais sensíveis.

Savini estava muitíssimo inspirado, e gostou mesmo de brincar com todas essas variáveis de terror.

A quarta história mostra um casal vivido por Adrienne Barbeau e Hal Holbrook, que vivem juntos e estão sempre brigando, enquanto no porão de sua casa uma criatura malvada é liberada e causa um apocalipse particular.

No entanto, é na história do cientista Upson Pratt (E.G. Marshall) que a paranoia e escatologia correm mais soltas, uma vez que o protagonista é um sujeito odioso, que gosta de isolamento, e mora em um bunker.

Creepshow - Arrepio do Medo: A união entre George Romero e Stephen King

Individualista que é, não sai para nada e é grosseiro com todas as pessoas que lhe prestam serviço, e a ironia do texto faz o seu lugar de segurança ser invadido por insetos imundos, por baratas, que além de infestar o seu recinto, servem também como símbolo da podridão de sua alma, capaz de atrair apenas os seres que vivem no lixo.

O roteiro de cada um desses contos foge de sutilezas, a maioria das histórias não há aprofundamento em conceitos, a ideia é chocar, e eventualmente assustar ou fazer piada com clichês do horror.

As transições entre a banda desenhada e as historinhas são bem legais, e a sacada ao final, com o pequeno Billy se vingando do pai com um boneco vodu resulta em um bom fechamento.

Creepshow é bem menos lembrado do que as obras de zumbi de Romero, inauguraria uma boa parceria de King com seu amigo e seria um palco belíssimo para o trabalho magistral de Tom Savini. Se as tramas não são tão boas, o esforço da produção é recompensado pelo visual e pelas atuações pitorescas, que fazem desse uma pérola pouco reconhecida pelo pública fã de filmes B.

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