Terrifier: o novo clássico do cinema escatológico

Terrifier: o novo clássico do cinema escatológicoTerrifier é o novo expoente do gênero conhecido como Filmes da Matança. Dirigido por Damien Leone, profissional especializado em efeitos práticos voltados para o gore, a obra expande a história do vilão conhecido como Art o Palhaço, o mesmo que protagonizou dois curtas no passado e que esteve na antologia Alls Hallows Eve em 2013.

O filme foi executado graças a um processo de financiamento coletivo na internet, depois recebeu aporte do produtor Phil Falcone, que inclusive fez uma cameo aqui.

O lançamento em festivais se deu em 2016 e no ano de 2018, chegou aos cinemas comerciais.

Como foi com o longa-metragem anterior, este também se passa no Halloween, fato que ajuda a justificar o fato de não estranhar a presença de um palhaço que usa preto e branco, e que é particularmente estranho e feio, para dizer o mínimo.

O início do longa se dá em uma televisão pequena e antiga, apresentando as imagens que tomariam a tela inteira depois da estática desse aparelho, mostrando um programa de entrevistas, apresentado pela bela Katie Maguire, que fez Sarah no filme anterior e aqui é Monica Brown.

Terrifier: o novo clássico do cinema escatológico

O show se dá de maneira sensacionalista, com uma performance da apresentadora que parece simpática e solicita, e se revela falsa na intimidade.

Nos bastidores ela desdenha da aparência deformada da entrevistada, que revida o preconceito. Essa cena dá o tom da violência extrema empregada, com a personagem que foi vítima do palhaço aparentando ter se contaminado com Art, mesmo que tenha sobrevivido.

O visual dessa personagem interpretada por Samantha Scaffidi é sensacional, e apesar de ser bem diferente de um rosto humano, há de se valorizar o trabalho da equipe de maquiagem.

Segundo ela, Art está morto, e logo a trama viaja ao passado, ao momento onde ela sofreu nas mãos do psicopata.

A fotografia de George Steuber valoriza os momentos agressivos, inclusive os que não lidam com assassinatos. A cena inicial do palhaço se pintando mostra ele escondendo feridas e deformações, escondendo suas imperfeições com a pintura monocromática que esconde David Howard Thornton.

Não demora a aparecer duas jovens, bêbadas, que vão até uma pizzaria para equilibrar a digestão. São elas Dawn (Catherine Corcoran), uma moça loira e extrovertida, e Tara (Jenna Kanell), uma morena de visual gótico.

Terrifier: o novo clássico do cinema escatológico

Ambos estão com roupas curtas, uma vez que saíram de uma festividade do dia das bruxas e é tradição que moças solteiras se vistam de maneira mais despojada. Na pizzaria de beira de estrada, a dupla encontra o palhaço, sentado sozinho, com um saco preto e em outra mesa.

Vale ressaltar que Art mudou de interprete, e Howard Thornton tem experiência como mímico, dessa forma, seu agir mudo é bastante expressivo.

O comportamento dele é tímido e quieto de início, tão tranquilo que o faz parecer pacífico, e em meio a isso, ele é importunado por Dawn, que quer tirar foto com ele para postar em suas redes sociais.

Terrifier: o novo clássico do cinema escatológico

O roteiro de Leone não é inventivo, mas tenta fazer suas críticas sociais. Aparentemente, foi Dawn quem convidou o sujeito violento a invadir sua rotina, já que de longe ele foi simpático, e depois resolveu ser violento por ter seu sossego interrompido.

É um preço alto para um simples importunar, e vira mais uma tola forma de criticar o uso da internet e redes sociais.

Apesar de ser curto - 84 minutos - o filme tem a decência de ter um roteiro que trabalha o horror aos poucos, gradativamente e de modo silencioso, emulando Art, seu personagem central.

Aos poucos se percebem as falhas de caráter do homem, quando ele exibe o seu egoísmo, uma vez que deliberadamente interdita o banheiro da Pizzaria Deer Hill, que além de ter trabalhadores que ficam ali boa parte do dia, ainda é uma das poucas opções para pessoas da estrada se aliviarem.

A primeira morte que Art pratica é fora de tela. O que se enxerga é a utilização da cabeça da vítima como luminária, trecho esse que possivelmente inspirou David Gordon Green em seu Haloween.

A chacina segue e é pontuada pela música de Paul Wiley, que brilhantemente acompanha a violência, agindo de maneira intermitente, parando quando é necessário explorar os golpes secos de faca.

Também há um cuidado com a direção de arte, e isso se percebe nos pequenos momentos, como quando Tara vai a um banheiro que é por si só um autêntico cenário de terror. É sujo, insalubre, com gosmas escuros nos mictórios, um cômodo estava sem uso há muito tempo claramente, e que não permite a ninguém se aliviar tranquilamente.

A partir do momento que as mortes começam, o roteiro abre mão de qualquer sutileza, inclusive entre personagens terciários, já que radialistas locais falam sobre o assassinato na pizzaria. Não há qualquer preocupação, pudor ou receio em alarmar a população.

Não demora e Art aparece no carro para assustar Dawn, depois vai ao prédio onde Tara está e permanece imóvel, como uma estátua viva, brincando com clichês mímicos mais uma vez.

Terrifier: o filme do bizarro palhaço Art

Art utiliza uma seringa, com um liquido dopante, reforçando esse ato como uma de suas marcas já que ele faz o mesmo movimento nos curtas.

O longa tem uma pegada meio slasher na hora de vitimar as pessoas, especialmente por punir mulheres, mas não atrela o motivo da morte a atividade sexual, mas pune a futilidade adulto-juvenil no caso de Dawn e Tara.

O estilo do filme muda consideravelmente na segunda metade, largando o lado pseudo-slasher para explorar o torture porn. A agressividade se torna ainda mais gráfica, com imagens que ficaremos devendo por incluir nudez feminina, inclusive, cortes e muito sangue, invertendo a possibilidade de fetiche do nu de uma maneira difícil de descrever além do grotesco.

As entranhas de uma personagem são expostas, seus órgãos internos caem a medida que o sujeito recorta o corpo da moça, serrada a partir da pélvis e para baixo, até o pescoço.

É violento e visceral, resultando em um novo significado para a palavra violação. Esse momento termina com uma ironia, com o palhaço se fotografando ao lado do cadáver dilacerado, invertendo a ordem do primeiro encontro dos dois personagens.

Art não faz cerimônia na hora de cometer homicídios. Em seu trabalho imundo ele usa facas, barras de ferro, até armas de fogo. Ele não pensa duas vezes antes de cometer a violência, comprometendo o clichê de assassino em série de usar somente um tipo de arma.

Além disso, ele parecer ter algum critério. Não vitima Mike (Matt McAllister), o zelador careca, só o marreta mas não de maneira fatal. Ele também não mata a moça em situação de rua de Pooya Mohseni, mas a perturba, pegando para si a boneca que a mulher insanamente julga ser sua filha.

 Terrifier: o novo clássico do cinema escatológico

Ele age de maneira curiosa, e até as regras estabelecidas por ele, são pervertidas, de acordo com seu bel prazer.

Das duas uma, ou ele manipula terceiros, para que esses irritem a ele e justifiquem uma mudança violenta e consequentemente cheguem a merecer morrer, ou simplesmente fica próximo delas e incomoda, fazendo assim com que as pessoas se contaminem pela maldada, ficando enfim merecedoras de reprimenda.

Em meio a entrada de novos personagens, como Victoria, a irmã de Tara que vai ao seu resgate, se percebe um ideal referencial de Leone, com claras homenagens a clássicos de filmes de assassino. O filme ainda pontua essa revência, dedicando a feitoria a memória de três cineastas, Wes Craven, Tobe Hooper e George A. Romero.

Art faz as vezes de Leatherface (personagem do clássico O Massacre da Serra Elétrica de 1974), se veste dos restos mortais de uma de suas vítimas, e apresenta sua face mais grotesca e grosseira. Anda rebolando, com os seios a mostra, de maneira imatura e sádica, imitando mulheres de forma bem caricata.

No entanto, a face mais assustadora dele é quando está coberto de sangue. O contraste do escarlate com a roupa e pintura em preto e branco assusta e compõe um belo quadro violento em tela.

 Terrifier: o novo clássico do cinema escatológico

Seus métodos são absolutamente cruéis, ele martela, decapita, usa corrente na pele das vítimas, esfaqueia, atira a queima roupa, arranca olhos, faz um estrago digno dos piores momentos da série O Albergue de Eli Roth.

Leone não é um grande diretor, tampouco é um exímio contador de histórias, mas ele sabe ser cruel com seus personagens, e até consegue dar algum traço de personalidade a suas vítimas. Ver o filme faz o espectador se importar um pouco com as pessoas que vão morrendo.

Já Art é tão autossuficiente e poderoso que se torna um antagonista impossível de derrotar. Ao final, ele encerra a história do único modo que poderia, se suicidando, com um tiro na cabeça, após ser interrompido do ato de comer o rosto de Vic, afinal, somente ele teria força e personalidade para matar Art.

Terrifier é simples, um esforço de Leone para dar lastro e vazão ao personagem que criou, um palco patético e agressivo para a história de um novo ícone do terror, possivelmente o último e mais novo entre os clássicos do gênero. Acerta especialmente por não se levar a sério e por ser um filme sobre violência sem compromisso com grandes mensagens, embora aluda a críticas pontuais.

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