Menos monstro, mais humano. As emblemáticas sequências dos especiais de halloween em American Horror Story são conhecidas por sempre deixarem um rastro de sangue inventivo, ou por manter explícitas as bases do pano de fundo da história, seja na apresentação da mitologia da trama como uma fonte para fins dramáticos, seja na aplicação do mais puro horror como choque e comoção. Surpreendentemente, o roteiro de Jennifer Salt consegue pôr o simbolismo de redenção representado por Edward Mordrake numa toada distante do senso piegas de humanização para justificar a tridimensionalidade dos protagonistas, mostrando assim duas das maiores figuras de Freak Show - Elsa e o palhaço - como monstros que não se aceitam como tal, mas que são capazes de comover o próprio demônio por conta das suas imperfeições externas e internas.
Sei que já tinha ficado claro que a presença de Mordrake no circo, traria à tona o passado de alguns dos freaks, porém, mesmo que tenha sido breve, gostei da forma como apresentaram a chegada de Paul e Suzi ao mundo de Elsa. American Horror Story está dando espaço para pessoas realmente especiais neste quarto ano - mais uma vez voltando ao que Tod Browning fez lá em 1932 - e a dupla Mat Fraser e Rose Siggins não deixaram a peteca cair nas cenas mais dramáticas.
A quinta visita do espectro foi à tenda da fraülein Elsa Mars. Os diálogos entre os dois personagens foram excelentes e é perceptível que Wes Bentley e Jessica Lange continuam se divertindo bastante com o sotaque teatral e os trejeitos exagerados dos seus papéis. Elsa é a estrela femme fatale que, mesmo quebrada pelo passado sombrio, não deixa de delirar com o retorno ao estrelato anunciado por Esmeralda. No entanto, Mordrake segue com o seu fantasmagórico inquérito e põe a dona do circo de encontro com a realidade que ela ainda não consegue enfrentar. A deformidade que Elsa esconde dos seus protegidos pode não ter a mesma origem da deles, porém tem um significado mais monstruoso do que qualquer outra: ela surgiu da perversidade humana.
Essa linha tênue entre quem é o homem e quem é o monstro guia Dandy e o palhaço ao centro do episódio, trazendo também Jimmy e Esmeralda como participantes especiais. É uma grata surpresa ver o roteiro costurar a trama sem conexões frágeis e saídas forçadas, levando o significado estrutural da série - o antológico moldar de histórias de horror - ao pé da letra, sem soar absurdo ou drástico. Sim, tudo continua estilizado, tudo continua repleto de referências, mas é esta a eterna rima recorrente em American Horror Story.
O passado de Elsa na Alemanha de 1932 não faz feio ou choca menos que os filmes do italiano Pier Paolo Pasolini. Vivendo como uma estrela dominatrix no submundo de Berlin, Elsa alcançou o sucesso, devotos e uma audiência num show de horror masoquista. Aqui, a fotografia de Michael Goi e a direção de arte da série executam o que já deve ser uma das sequências mais bonitas já realizadas em American Horror Story. Não deixando de ser menos impactante e incômodo, o momento em que, mais pela sugestão, conhecemos o terrível destino da fraülein ao protagonizar o início da era dos filmes snuff na Alemanha nazista.
Porém, é a expressão pesarosa de John Carroll Lynch e a história do palhaço Twisty que chega como um soco na boca do estômago. Quando Edward Mordrake faz uma súbita mudança na sua escolha final, ganhamos a chance de conhecer quem realmente é o assassino por detrás do desconcertante sorriso eterno. As respostas não são as mais fáceis de serem encaradas, e tudo é tão angustiante que comove de verdade. Lynch trabalha o tom da voz de Twisty - morosamente reduzido pela ausência do maxilar - de uma forma impressionante e, ao fim da última revelação sobre o palhaço, começamos a pensar que todo o terror começado em Jupiter foi de uma forma torta, necessário para que o pré-julgamento da cidade com relação aos freaks desaparecesse.
Corajoso por encerrar a trajetória de personagens emblemáticos e promissor por tornar o futuro da trama repleto de possibilidades curiosas, este é, sem sombra de dúvidas, o episódio chave da temporada de Freak Show. Um Dandy abraçando o legado do seu tutor é só o começo do macabro segundo ato. É a arte a favor do horror e o horror conduzindo o espetáculo. Eu não poderia estar mais hipnotizado. E vocês, como estão?
P.S.1: A última cena do Jimmy na entrada do circo foi para nos deixar de coração feliz.
P.S.2: Finn Wittrock é o meu favorito para liderar as futuras indicações de Freak Show nas premiações.
P.S.3: Então vamos lá: “I hate you! I hate you! I hate you! I hate you!...”.
Gostei muito do episódio. H.I.P Dora. Vai fazer bem mais falta que o Meep. Ainda aguardo um grande acontecimento.
Ahh, a Dora vai mesmo fazer falta!
Os grandes acontecimentos tão para chegar mais e mais.
Primeiro parágrafo destruidor e certeiro, parabéns, aliás, o texto todo soube passar exatamente o que o episódio representou pra mim. Tô bem curioso pra saber como tudo vai seguir agora.
Opa rapaz, valeu pelos elogios! =)
Eu também tô muito curioso pelos próximos episódios e principalmente pela direção que a temporada vai seguir a partir de agora. Estamos na linha do tudo pode acontecer depois dessa última hora.