Herbert West - Reanimator : O cientista louco e necromante, de H P Lovecraft

Herbert West - Reanimator : O cientista louco e necromante, de H P LovecraftAo longo dos anos, o doutor Herbert West se tornou um dos mais famosos personagens criados pelo escritor H.P. Lovecraft. Apesar do filme A Hora dos Mortos-Vivos de Stuart Gordon ser bem mais lembrado do que o texto original, a realidade é a que aventura literária chamada Herbert West: Re-Animator é tão brilhante quanto a sua versão para o cinema.

Howard Phillips Lovecraft era conhecido por seu estilo único de contar histórias, normalmente apelando para medos indizíveis, para criaturas mágicas de difícil descrição e em histórias curtas, que não permitiam que o leitor tivesse tempo de recuperar o fôlego enquanto lia. No caso desse Herbert West, as primeiras características cabem, mas a última não.

Essa obra tem um formato semelhante as noveletas, ainda que tenha a cadência de conto. Ela é dividida em seis partes curtas, variando em número de páginas de acordo com a edição.

A obra mistura de elementos típicos da ficção científica, especialmente os ligados a experiência com mortos, faz isso através do seu personagem central, que dá nome a obra e que é um cientista genial, porém, insano, sendo esse o principal fator de horror dentro da curta narrativa.

Esse Re-Animator - Reanimator ou Reanimador, dependendo da tradução - possui pequenas histórias narradas sempre pela mesma testemunha, com escrita em primeira pessoa. O contador de histórias não assume seu nome, possivelmente por vergonha das experiências que pratica e por medo de ser pego.

Escrito entre outubro de 1921 e junho de 1922, foi publicada na revista temática Weird Tales, condensada de maneira serializada em julho de 1922. A história é centrada no aluno de medicina Herbert West, da Universidade de Miskatonic, em Arkham.

West é descrito fisicamente como um homem branco, loiro, com olhos azuis e de semblante calmo, bem diferente de sua versão em carne e osso mais famosa, Jeffrey Combs, que esteve no filme de 1985, em A Noiva do Re-Animator e Re-Animator Fase Terminal.

Ele é um sujeito brilhante, um pesquisador que lembra demais o também cientista e igualmente genial Victor Frankenstein, que era o doutor protagonista de Frankenstein ou o Prometeu Moderno, clássico de Mary Shelley que inspirou Lovecraft.

Ao contrário de Victor, Herbert não tem muitos escrúpulos. Ele simplesmente usa uma fórmula científica que reanima partes orgânicas e não tem grandes apegos éticos na hora de testar o líquido reanimador.

O narrador o descreve como um monstro genial, que tem talentos fortes na mesma medida de sua ausência de caráter. Ele não é um sujeito imoral ou malvado, só parece ser obsessivo o suficiente para não ligar para convenções éticas.

Herbert West - Reanimator : O cientista louco e necromante, de H P Lovecraft

A substância não é muito detalhada na prosa, até por conta de ser algo difícil para um leigo explicar.

A parte que cabe ao narrador é que o princípio ativo dela é chamado de sub vida e tem por consequência a capacidade de reanimar as partes por onde o líquido flui.

Nesse exercício, voltam os movimentos daquilo que um dia foi vivo, mas não a consciência. O experimentado, membro ou outra parte retorna, movido puramente por extinto, até por conta de não necessitar de um cérebro. Uma cabeça até tem o centro do sistema nervoso, mas não é um organismo que sozinho pode comandar um corpo.

Dessa forma, o ser retorna como um selvagem, agressivo e violento, com as emoções e reações confusas, tal qual um recém-nascido de classe animal irracional.

A ideia de Herbert era a de burlar a morte e os seus experimentos. Para isso, ele usava a fórmula reanimadora em pequenos animais, que eram trazidos de volta a vida e retornavam indóceis. Foi daí que ele tirou a conclusão de que os revividos voltavam violentos.

A medida que avança, West queria fazer testes em pessoas, mas ele foi impedido pelo reitor da universidade, o Dr. Allan Halsey. Movido provavelmente por sua vaidade extrema - narcisismo esse que o aproximou do cinismo e da insanidade - ele decide fazer teste em humanos, ignorando a proibição, já sem qualquer escrúpulo.

Ele tenta com cadáveres antigos, depois com novos e à medida que o conto se desenrola, ele mesmo produz novos mortos, mata pessoas, a fim de provar o seu ponto, tentando justificar o tempo e energia que gastou estudando e formulando o soro.

Os contos de Lovecraft têm marcas em comum, entre elas, horrores de descrição incomensurável, no entanto, algo é fácil de descrever aqui: a personalidade e caráter do seu personagem central.

West tem em sua característica mais chamativa o fato de ser cínico e inconsequente. De certa forma, o narrador da história também é assim, embora seja mais passivo e impressionável, já que vê tudo, julga seu parceiro, mas é incapaz de modificar o curso dos fatos. É o perfeito portador de notícias, das mais malvadas aliás, já que sua historieta é repleta de tragédia, violência e agressividade.

A dupla não mede esforços para tentar utilizar tal fórmula de reanimação, e até a desculpa de que o experimento venceria a morte era balela, o que eles queriam mesmo era saciar a vontade de poder, movida por um sentimento vaidoso que se disfarçava de desbravador, mas que em suma, era tão somente uma descoberta única que alimentava o ego tanto do cientista quanto de seu auxiliar.

Herbert era arrogante, se julgava acima do bem e do mal, se considerava melhor e mais inventivo que todas as outras pessoas que faziam os estudos na universidade de Arkham. Em última analise, ele se enxergava como alguém acima do mundo inteiro.

Junto ao cinismo vem também a frieza na construção de fatores de ajuda ao intento "maligno" e a completa ausência de tabus em seus pensamentos. Os dois personagens se mudam entre as partes dos contos, se estruturam, arrumam empregos que não pagam bem, mas que dão condições, tempo e subsídios para seguir com suas cobaias, montam também um laboratório no porão, se localizam perto de um cemitério de indigentes onde cadáveres frescos ficariam.

Há de lembrar a faceta vergonhosa e racista de Lovecraft. Fica aqui o aviso ao leitor mais sensível, já que o texto faz questão de estabelecer comparações patéticas entre um homem negro e uma criatura monstruosa, a despeito até dos experimentos de West.

Esse tipo de ilação está mais presente na fala do narrador e menos na do cientista, ainda assim, não é como se Herbert não fosse ele mesmo uma pessoa preconceituosa. Todos aqui são, de alguma forma.

Lovecraft compara a fisionomia de um negro a um gorila e através do narrador, supõe que uma vítima fatal da vida era mais feia em vida do que em morte. Até West tem receio de mexer nele, fato que ajuda a comprovar a mesquinhez de alma que o escritor tem, que mal chama a pessoa de outro termo que não monstro, criatura, ser repugnante e outros termos depreciativos.

Herbert West - Reanimator : O cientista louco e necromante, de H P Lovecraft

O narrador descreve West como materialista, já que não acredita em alma, ou sobrenatural, em abismos espirituais pós morte etc. A descrição tem a ver também com o fato do cientista atribuir o trabalho da consciência meramente a fenômenos corporais e físicos, presentes nas sinapses cerebrais.

Os revividos não as tem por conta de o soro despertar apenas uma parte do sistema racional do morto, dessa forma, o reanimado é capenga. Em futuras fórmulas, West tem a ilusão de que conseguiria trazer a pessoa como era em vida, mas esse parece ser mais um devaneio de sua parte, possivelmente movido por uma força maligna espiritual, que utiliza suas mãos e cérebro justamente por ele não ter crença nenhuma.

Na parte 5, eles vão para frente de batalha, na Guerra, em Flanders no ano de 1915, que vem a ser o lugar perfeito para desenvolver experiências com recém mortos.

O narrador revela que já estava ao lado de West há 5 anos e a convivência deles foi se tornando íntima. O leitor certamente ficaria curioso por saber como é a intimidade entre eles, mas infelizmente o narrador dá poucos detalhes da interação pessoal.

Ele parece estar ali meramente para documentar o trabalho. Não é como John Watson fazia com o detetive Sherlock Holmes, ainda que haja certa admiração do escritor com o biografado, não parece ter afeto ou carinho e sim uma dependência emocional, talvez de culpa, talvez de medo.

Já na 6° parte o narrador fala do professor que foi reanimado e está confinado em um manicômio há 16 anos, sem saberem sua identidade. Esse foi o personagem que inspirou dois dos homens que aparecem no filme de Gordon, o professor Dean Halsey, de Robert Sampson, que ficou isolado em um hospital psiquiátrico, além do vilão Dr. Carl Hill de David Gale, que se torna uma cabeça zumbi no filme de 1985.

O final que Lovecraft pensa é carregado de moralidade punitivista, os construtos reanimados atacam o sujeito que os despertou do além, dando assim uma punião, jusamente ao sujeito que se julgava maior que todos, que acreditava ser uma divindade mesmo que não tivesse crença.

É dado a West um desfecho violento, mais do que merecido.

Hebert West - Reanimator é um conto criativo, repleto de elementos assustadores e junto ao clássico livro Eu Sou a Lenda de Richard Matheson, ajudaria a pavimentar a visão mais moderna dos mortos-vivos/zumbis, embora seja obviamente menos influente que o romance, especialmente na construção do que viria a ser A Noite dos Mortos-Vivos de George A. Romero.

Certamente é um dos momentos mais inspiração e maior fôlego da carreira de Lovecraft e você pode adquirir o conto aqui, em uma compilação junto a outras obras do autor, além dessa versão em quadrinhos, com texto de Luciano Saracino e ilustrações de Rodrigo López.

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