Nekromantik 2: Um segundo experimento sádico e impuro do cinema alemão

Em atenção à data festiva de 14 de fevereiro, onde se comemora o dia dos namorados no mundo inteiro -  além de ser o Dia de São Valentim - trazemos uma análise de um filme de horror que flerta com um romantismo sujo e absurdo em sua essência.

Nekromantik 2 é um experimento do cinema extremo alemão, conduzido por Jörg Buttgereit. Sua trama é nojenta e assustadora, envolve uma personagem enfermeira, chamada Monika, que rouba um cadáver de seu túmulo para estabelecer uma relação necrófila.

Do original Nekromantik 2: Die Rückkehr der Liebenden Toten (estilizado como NEKRomantik 2), essa é obviamente a sequência de Nekromantik, também dirigido por Buttgereit. Essa parte dois é escrita pelo diretor e Franz Rodenkirchen, e obviamente falaremos com spoilers sobre as curvas dramáticas dessa obra profana.

O cadáver que a personagem de Monika M. rouba é Rob, que é o personagem central do primeiro filme, que havia se suicidado. Não há muita cerimônia ou sutileza, e assim que ela chega em casa com seu novo par, ela já trata de brincar com seu dote sexual.

É bastante curioso como o personagem de Bernd Daktari Lorenz era absolutamente patético e incapaz de gerar em sua namorada o interesse por ele, ou desejo por seu corpo e alma, tanto que ela preferia utilizar um cadáver com um pedaço de metal como substituto do falo.

Quando ele mesmo se torna uma figura morta, passa a ser atraente para outras pessoas, para uma moça bonita e visualmente comum. Monika é parte do padrão de beleza, é linda, bela, e em uma primeira olhada é alguém comum, perfeitamente capaz de atrair para si outro par, alguém comum, mas o roteiro e câmera de Buttgereit trata as suas taras como algo a se aceitar, como parte de uma normalidade bizarra.

Nos primeiros momentos do filme, há uma recapitulação do primeiro filme, com cenas dessa vez sem cores, em preto e branco, fato que as deixa mais gráficas ainda.

A cena do rapto é simples, mas já deixa claro o tom de cinismo e cara de pau que esse Nekromantik 2 terá. Além dessas questões já apontadas, há um flerte bem estranho da parte da moça, que se envolve de forma romântica e também sexualmente com Mark, interpretado por Mark Reeder.

Vale lembrar que o nome dos personagens coincide com o dos atores por um motivo simples: naturalidade. Como essa é uma produção barata, a ideia é fugir o menos possível do incomum, e como a premissa do filme é estranha por si só, todo o especulativo fica por conta da ideia central, enquanto todo o resto é comum.

Sem falar que como esses são atores de cachê barato, é mais fácil pegar qualquer um e chamar a pessoa pelo próprio nome.

O sujeito trabalha como dublador, e entre os seus trabalhos, há o ofício de dar voz a produção de filmes pornográficos. A cena dele em estúdio, emulando os gritos, sussurros e gemidos de alguém em situação de coito é bizarra até de maneira isolada, mas aqui compõe somente um indício de anormalidade narrativa.

Nekromantik 2: Um segundo experimento sádico e impuro do cinema alemão

Há uma cena de sexo já no início, envolvendo Monika, e ela termina de maneira bizarra até para uma sequência de necrofilia. A personagem se sente mal, vomita e entre o líquido regurgitado, sai sangue.

Isso simboliza o óbvio fato de que transar com alguém morto é imoral e errático do ponto de vista ético, mas também demonstra que o corpo e a mente da protagonista não estavam preparados para uma relação desse tipo, e desse modo, ela coloca para fora não só o que comeu, mas também parte de suas entranhas.

O que mais assusta é que o corpo de Robert tem um aspecto engordurado, de cor acinzentada, claramente não passou pelo processo de assepsia conhecido como tanatopraxia, e aparentemente isso deixa Monika excitada.

Tanatopraxia é um conjunto de procedimentos utilizados para conservar o cadáver. Há higienização, se embalsama para cuidar da aparência do morto, a fim de prepará-lo para o velório, funeral ou cerimónia fúnebre, observando os devidos preceitos religiosos e legais.

Como ninguém reclamou isso a Robert, ele teve todos os fluídos corporais indo até a superfície de sua pele, fazendo ele ficar com um aspecto asqueroso e nojento, tão agressivo que até as flores perto do corpo morrem.

O filme tem dificuldade em decidir qual caráter abordará, em alguns pontos, parece um romance comum, com uma intimidade cheia de ternura no namoro da enfermeira com o dublador, visitando parques, praças e cinemas comuns (que passam filmes do John Waters, o papa do trash), mas logo depois a garota é mostrada desmembrando o corpo de Robert, que mesmo após tanto tempo, ainda possui muito sangue...

A sequência em si é bem-feita, o boneco é cheio de detalhes, sua anatomia sendo dilacerada produz cenas incômodas e bem filmadas, mesmo que fira toda a lógica da decomposição, mas é impossível não ficar incomodado.

A ideia é de se livrar das partes não utilizáveis em relações sexuais. Se descarta o que não presta, e ela separa algumas partes em pratos, coloca no frio, na geladeira, para conservar.

O filme ainda possui alguns momentos musicais e teatrais, outros com um grupo de amigos vendo um filme em formato documentário com pessoas dissecando uma foca pequena. Em alguns pontos, há um flerte com um cinema mais conceitual, que discorre sobre o incômodo, já que o público é sempre convidado a colocar em cheque os seus limites e até os seus preconceitos.

Monika é uma personagem com perturbações, e que provoca o espectador a pensar o que o entretém, e o que o faz ficar preso a um filme, por que se Buttgereit faz os seus filmes, é porque há gente que gosta, e essa brincadeira com sensações é algo digno de nota, afinal, não só de sensações ternas e doces a vida é feita.

Nekromantik 2 termina com uma cena bizarra de sexo, com momentos violentos, com decapitações em meio ao gozo, e outros momentos indescritíveis e ainda mais pesados de tudo o que citamos, e ainda assim nem é o mais pesado entre os produtos da filmografia do cineasta. É sem dúvida uma evolução do conceito do primeiro, uma extrapolação de limites e de extremo mau gosto, e convida a reflexão sempre que é apreciado.

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