O texto a seguir contém alguns spoilers.
Já se tornou uma espécie de constante em Arrow. Quando um episódio é muito bom, seu sucessor não compartilha da mesma qualidade, deixando a desejar em alguns aspectos. Crucible sofre deste mal, embora não seja ruim. O problema é a quantidade de buracos e soluções fáceis de roteiro, justamente em um dos pontos da temporada cujas subtramas sofrem um avanço significativo.
Começando com uma montagem paralela tola e clichê, o episódio mostra Oliver mais uma vez chegando atrasado a um evento promovido por ele mesmo. Enquanto Felicity tenta dar desculpas a Isabel Rochev sobre o atraso do playboy, a sequência é entrecortada por cenas do Arqueiro desbancando uma venda de armas. Aliás, este é o fio condutor de Crucible. O herói precisa parar um dos vilões que tomam conta do Glades desde o terremoto: O Prefeito. O antagonista da semana, infelizmente, não tem o mesmo desenvolvimento do Dollmaker em Broken Dolls, nem o carisma do Conde Vertigo da primeira temporada, mas é divertido em alguns níveis. A interpretação exagerada de Cle Bennett confere ao personagem uma característica de blaxploitation muito bem-vinda. Seja em seu esconderijo espalhafatoso (chamado de Prefeitura, obviamente) ou em sua aparição em plena luz do dia, quando promove um tiroteio vitimando várias pessoas inocentes, é notável uma presença maior do que a importância dada pelo roteiro às suas ações.
Porém, é mesmo a trama da Canário que chama toda a atenção do espectador. Mais uma vez provando que não há interesse em alongar segredos mais do que o suficiente (e isso é feito duas vezes neste episódio), logo no início o espectador é confrontado com a revelação da verdadeira identidade da nova vigilante de Starling City. Como já havia sido dito pelos produtores antes da temporada estrear, é Sara Lance, irmã de Laurel, que veste o couro negro e máscara para combater o crime na cidade. É aí que mora um dos grandes problemas deste episódio. Arrow tem pouco tempo de vida para já sustentar em sua trama, dois retcons (não conhece o termo? Veja mais aqui). O recurso é típico dos quadrinhos, e é interessante o seriado reconhecer suas origens, mas também é usual em roteiros preguiçosos. Basicamente consiste em alterar uma informação que se tem como verdade para usar essa mudança como uma revelação bombástica. Trazer personagens de volta a vida é apenas uma das funções de um retcon. E isso é problemático nesta situação pois muda de forma drástica uma das motivações que o espectador tinha como certa para a transformação de Oliver do playboy irresponsável em jovem disposto a fazer a coisa certa. Dessa forma, o flashback da ilha se conecta ao retorno de Sara, mostrando que o protagonista sabia sobre a moça ter sobrevivido ao naufrágio do Queen's Gambit. De toda forma, parece que os produtores e roteiristas tem um plano bem traçado para fazer tudo se encaixar, mas não deixa de ser uma explicação forçada. Por outro lado, ter o Arqueiro e a Canário agindo lado a lado é de fazer qualquer fã de quadrinhos pular de alegria no sofá. Com direito até a troca de armas durante o combate, a cena é um tanto prejudicada pela montagem e pela direção irregular de Eagle Eglisson, que posiciona os bandidos sempre como se estivessem esperando para apanhar, tirando o impacto dos momentos em que os vigilantes aparecem subitamente para imobilizar os vilões.
As cenas no passado foram bem interessantes, e não se conectam com a linha do tempo presente apenas quanto à revelação de que Sara está viva. Tematicamente há uma lógica contida no texto quanto ao uso do título. Crucible pode ser traduzida como uma "provação", justamente o que Oliver passou nas mãos de seus captores. Pelo visto sua tortura não foi apenas física e deve durar mais alguns episódios. E a ideia de que os corpos encontrados na caverna estão deformados talvez seja uma outra ligação, desta vez com o final do episódio, em que o Irmão Sangue aparece injetando uma droga em determinado personagem. Seriam experimentos para a criação de superseres? Todo mundo já sabe que nesta temporada, Arrow irá introduzir pessoas com poderes (e há novamente uma referência ao acelerador de partículas dos STAR Labs, que deve estar ligado à origem do Flash no futuro) e experimentos científicos sempre são uma boa explicação para esse tipo de coisa. Caso tudo isso esteja ligado, será que este novo vilão tem algum elo com Ra's Al Ghul, tal qual o Espantalho em Batman Begins (a caracterização de ambos antagonistas é bem semelhante)? A aparição de Sangue marca a outra revelação que o roteiro não tem medo de fazer. Como já previsto, Sebastian Blood não é o benfeitor que a população menos favorecida de Starling pensa. E a ascensão do político pode ser um bom ponto para o Arqueiro ter de enfrentar alguém ainda mais poderoso e influente que Malcolm Merlyn. A série precisa tratar essa trama com muito cuidado, pois há boas chances de uma certa crítica ao Sistema, algo que as HQs do Arqueiro Verde fizeram durante muito tempo. Há mil maneiras de conectar a provável falência financeira de Oliver com uma batalha pelo domínio da cidade entre o vigilante e um futuro prefeito (ou até mesmo um prefeito eleito, por que não?) e uma revolução popular, com os afetados pelo desastre do final da temporada passada, enfurecidos por terem sido enganados o tempo todo.
Enquanto tudo isso acontece, o sofrimento de Laurel parece longe de ter um fim. Apesar de clichê, fazer a moça exibir comportamento de alcoólatra até faz sentido. O sentimento de culpa pela morte de Tommy e o sequestro que quase levou a sua morte no episódio passado, parecem ter sido o estopim para fazer a moça se perder. A quem cabe a missão de salvá-la de si mesma é a pergunta. Oliver, Quentin ou Sara?
Assim, mesmo com alguns furos (o Arqueiro sabia da ligação entre a Canário e Sin, para deduzir a localização da vigilante?) e uma edição irregular, principalmente nas já citadas sequências envolvendo combates corpo a corpo, o episódio da semana dá um bom avanço em praticamente todas as subtramas desta temporada. Apenas a mãe de Oliver ficou de fora, mas sua evolução já havia sido amplamente abordada em Broken Dolls. Embora mais fraco, no entanto, consegue segurar o espectador por todos seus 40 minutos de duração, algo que também é constante em Arrow.
Excelente review como sempre Alex, também achei o episódio mais fraco do que Broken Dolls, só que novamente, ele passou voando para mim. Ia te perguntar se o Sebastian Blood era um vilão oficial da DC pois eu tinha certeza de que já tinha lido este nome, o episódio explicou por si só daí eu fui atrás do Irmão Sangue. O retcon com a Sara não foi tão ofensivo assim, pois todo mundo já suspeitava que ela não tinha morrido, o que incomodou de verdade, como você bem apontou, foi o Oliver já saber disto. Sei lá, diminuiu o peso dramático das mudanças que a gente achava que ele tinha sofrido, justo por terem batido muito nesta tecla durante a primeira temporada.
Gostei de terem mencionado o acelerador de partículas outra vez e mais ainda dos rumos misteriosos que o lance dos cadáveres deformados na ilha estão tomando. Arrow continua bem demais!!!
P.S.: A droga que o Sangue injetou parecia Vertigo.
P.S.2: Sabia que você ia fazer uma comparação com o Espantalho, ainda mais agora com a presença misteriosa do Ra’s Al Ghul. Tá fóda mesmo!
Bela review.
Mas me incomoda essa mania de traduzir "vigilante" pra… "vigilante". Aqui, nas legendas, em outros sites.
É "justiceiro"!
Vigilante, no Brasil, é o guardinha de banco. Só.
Entendo a posição, mas quando a série se refere ao Arqueiro como Vigilante (e usa a palavra como nome para o personagem), também é uma referência a um anti-herói da DC com esse mesmo nome, que no Brasil é chamado assim desde os anos 80, quando não existia mania de tradução vinda da internet.