Piranha : A melhor e mais divertida imitação de Tubarão, por Joe Dante

Piranha : A melhor e mais divertida imitação de Tubarão, por Joe DantePiranha é um filme de terror bizarro em essência. Lançado em 1978, ele tentou surfar na onda de filmes de animais assassinos no estilo Tubarão, junto a clichês de horror atômico.

Dirigido por Joe Dante, é uma produção da New World Pictures, estúdio de propriedade de Roger Corman, que assina aqui como produtor executivo. A obra que tem como produtor Jon Davison e fez um relativo sucesso, tanto que se tornou franquia, com uma sequência chamada Piranhas 2: Assassinas Voadoras (conduzida por James Cameron) e teve dois remakes, um de 1995 direto para tv e um de 2010, conhecido também como Piranha 3D - esse por sua vez teve uma sequência também, chamado Piranha 2 ou Piranha 3DD.

O roteiro ficou a cargo de John Sayles, baseado no argumento do próprio e de Richard Robinson. Toda a trama inicial não deixa dúvidas quanto a esse ser uma imitação ou rip-off de Tubarão. Na época, houve um rumor de que Steven Spielberg gostava de Piranha, tanto que considerava esse como o melhor dos filmes que roubaram a ideia de Jaws.

Fato é que o cineasta premiado e Dante se tornaram parceiros, trabalhando juntos em produções como No Limite da Realidade de em 1983 e Gremlins, de 1984.

A primeira sequência dentro do filme ajuda a demonstrar é o caráter da obra e a abordagem escolhida, já que exibe um casal pronto para nadar pelados no lago. Assim que se despem, são misteriosamente atacados, basta que estejam nus, se banhando, dando vazão ao prazer que algo os ataca, mostrando uma ideia de moralismo maléfico ao monstro da vez.

Os efeitos de maquiagem são ótimos, há um gore considerável, em um trabalho primoroso de Rob Bottin e Vincent Prentice, dupla essa que trabalhou junta em Criaturas das Profundezas, Robocop: O Policial do Futuro e Enigma do Outro Mundo.

Nas vítimas aparecem chagas e cicatrizes, causadas por algo que está fora do alcance da câmera, por uma monstruosidade difícil de compreender o tamanho ou grau nesse primeiro momento, caso o espectador nada saiba a respeito do peixe de carnívoro de dentes afiados.

Logo depois aparecem os créditos iniciais estilizados, com o nome Piranha brotando em tela para depois mergulhar na água do lago, pintando assim de vermelho o espaço.

 Piranha : A melhor e mais divertida imitação de Tubarão, por Joe Dante

A música de Pino Donaggio ajuda a fomentar o drama nos créditos iniciais. O instrumental conduzido por Natale Massara acerta ao apelar para tom graves, e faz todo o trabalho sem imitar John Williams. Há personalidade no conjunto de canções, não só na parte introdutória, mas durante toda a narrativa.

O longa tem uma estrutura semelhante à dos filmes de matança, punindo quem transa, contando com personagens genéricos e desimportantes, cujos dramas não apetecem. Aqui cada pessoa que aparece é um potencial alvo de homicídio. Há até o apelo a personagens idosos e teóricos da conspiração, que servem de profetas do Apocalipse.

Vale lembrar que a obra chegou aos cinemas em 1978, mesmo ano de Halloween: A Noite do Terror, dois anos antes de Sexta-Feira 13. Fato é que Piranha é uma espécie de "pré-Jason", tendo em comum até o cenário banhista e a paranoia de alguns personagens, que se preocupam com uma força assassina.

Diferente dos filmes de assassino, esse não possui uma mitologia para se importar, normalmente nesses filmes há um evento traumático no passado. O que mais se aproxima disso é a ganância das grandes corporações, que investem dinheiro para fazer experimentos que podem comprometer a vida das pessoas, além do pano de fundo do peixe "assassino", que serve de monstro aqui.

Piranha é a designação de um grupo de peixes carnívoros de água doce que habitam alguns rios da América do Sul. Em algumas regiões do Brasil elas servem de alimento entre as populações locais, sendo utilizada no preparo do prato sul-mato-grossense conhecido como caldo de piranha.

Como nada disso é explorado dentro do filme, Dante acaba fazendo outra bobagem estadunidense que faz troça com algo relacionado a cultura estrangeira.

Não que precise, mas a partir daqui falaremos com spoilers sobre a obra. O aviso está dado.

Piranha : A melhor e mais divertida imitação de Tubarão, por Joe Dante

São introduzidos dois personagens Paul (Bradford Dillman) e Maggie (Heather Menzies). Os dois não se conhecem, mas são unidos pelo destino, já que procuram David e Barbara, os nadadores que se aventuraram pelo lago local.

Ao procurar os amigos uma série de eventos estranhos começa a ocorrer. Eles entram em um laboratório, percebe as roupas dos amigos e puxam uma alavanca. Ao fazer isso, acabam acionando algo que não devia, tanto que são atacados por Robert Hoak (Kevin McCarthy), um sujeito de cabelos grisalhos e gancho no lugar da mão.

Seu comportamento é bizarro, ele é indócil e tem falas que podem ser resumidos a palavras de ordem ou sentenças curtas. Ele é bem articulado, um cientista e doutor que parece estar traumatizado, vociferando em um primeiro momento que os dentes eram afiados. Ele passou por algo, que é a razão inclusive dele ter perdido uma de suas mãos.

Hoak não era o único indício de que Maggie deveria ter cuidado. No porão se percebem algumas criaturas monstruosas e bizarras, seres modificados, que misturam materiais genéticos de animais diferentes. Há alguns mortos e outros vivos, fato que é curioso, uma vez que esse tipo de exploração inclui só cadáveres normalmente. Alguns são bem feitos, criaturas de pequeno porte de efeito prático, já outras são de stop motion, com um orçamento claramente de baixo investimento para essas inserções.

Fica bastante claro o deslocamento delas do resto do cenário.

Piranha : A melhor e mais divertida imitação de Tubarão, por Joe Dante

O doutor era financiado pelo governo para fazer experimentos. O lago próximo do laboratório era usado para manter alguns desses experimentos, no caso, piranhas geneticamente modificadas, armas biológicas, que tinham o tamanho maior e mais dentes, graças a mistura de DNA com o de outras criaturas. O cardume era para ter sido exterminado, jogaram veneno na água, mas algumas sobreviveram graças ao código genético mutante.

Maggie tratou de liberar elas na água aberta e pôs em perigo todos os que rondam o lugarejo, especialmente as crianças e monitores do acampamento de verão.

É dado que a história se passa no Texas, perto do lago River, mas poderia ser em qualquer cidade costeira do mundo. Dante usou como locação San Marcos, Wimberly e Seguin no Texas, além de ter feito algumas cenas na Califórnia.

Tal qual foi em Tubarão as autoridades não acreditam nas testemunhas dos atentados. Em um primeiro momento, fica dúbio, parece que pode ser só por burrice e arrogância, mas com o decorrer da trama se fortifica a possibilidade dessa atitude ter a ver com culpa e cumplicidade dos políticos locais.

Parte da desculpa envolve o fato de que não há piranhas em território estadunidense. Eles reforçam essa ideia e fingem que não estão ocorrendo mortes ali. Ainda dentro da influência em futuros filmes de assassino, parte do drama em Acampamento Sinistro é o mesmo, localizado em uma ambientação campestre, onde uma série de mortes também era ignorada pelos locais.

Para piorar a situação dos mocinhos, Paul tinha uma péssima fama: era conhecido como o bêbado da cidade, então pouco importa que ele fale sobre o acontecido e sobre a fuga dos monstros marinhos, a maioria das pessoas acham que ele ou está exagerando ou simplesmente está mentindo.

Sayles estreava como roteirista. Com os anos ficaria famoso por escrever Mercenário das Galáxias, Alligator: O Jacaré Gigante, além de repetir a dobradinha com Dante em Gritos de Horror. Já o argumentista Richard Robinson trabalhou em outras obras de animais catástrofe, como foi com A Maldição das Aranhas. Também trabalhou em Estrada do Medo.

O script é bem pensado ao menos em relação a tensão, uma vez que só libera os membros do acampamento para tomar banho passado uma hora, permitindo assim que haja um receio da parte dos personagens, pelo ataque das piranhas, acompanhado obviamente pelo público.

Piranha : A melhor e mais divertida imitação de Tubarão, por Joe Dante

Parte da expectativa trágica passa pelo fato de que os internos do acampamento são em sua maioria crianças, incluindo Suzie Grogan (Shannon Collins), uma menininha que é filha de Paul e que desde o momento em que é apresentada, diz ter medo de monstros marinhos.

As primeiras mortes na água são bastante tímidas, a violência engrossa quando atacam sr Dumont (Paul Bartel) o dono do acampamento próximo ao lago inicial, mas nesse ponto já foram passados mais de uma hora de exibição.

A sequência de ataque aos banhistas é sensacional, com tons de vermelho predominando sobre a água. Os banhistas têm ferimentos sobre a pele dos personagens. Esses efeitos chamam a atenção, são muito bem feitos.

Próximo do desfecho ocorre um evento no mínimo curioso. A dra. Mengers, que foi introduzida como alguém que aparentemente sabia de todo o causo, olha diretamente para a câmera, em um programa de televisão, garantindo que as piranhas não chegariam ao oceano, dizendo não há o que temer, não convencendo absolutamente, já que ela era parte da junta das autoridades que fizeram pouco caso.

Contra ela pesa o fato de ser interpretada por Barbara Steele, atriz britânica e veterana de fitas de terror, incluindo Black Sunday: A Máscara de Satã de Mario Bava, Calafrios de David Cronenberg e até 8 e Meio de Federico Fellini.

A sequência citada é boa, tão direta que quase resulta em uma quase quebra de quarta parede. Dante gostava de fazer acenos assim em seus filmes. Sua filmografia sempre brinca com as expectativas e mesmo quando são fantasiosas, apelam para um medo tangível. Dessa vez esse receio é sobre a não confiança que políticos passam.

Piranha surpreende por seu tom de denúncia. É um filme subestimado no teor de suas mensagens. Seu texto foi muito ofuscado pela repercussão de Tubarão. Ainda assim é uma obra bem encaixada e com efeitos práticos competentes e tom bastante divertido na abordagem geral.

 

 

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