Dia das Mães Macabro: O horror materno em um clássico da Troma

Dia das Mães Macabro: O horror materno em um clássico da TromaDia das Mães Macabro é um filme de terror que se vale de data festiva para estabelecer o seu horror, embora não seja exatamente uma história pautada na data comercial do dia das mães. Assim como tantos outros, essa é uma obra que usa os clichês de horror baseado em ação de gente agressora e desajustada, embora seu início confunda um pouco, graças claro a uma das muitas reviravoltas da trama.

Sua formula mistura diferentes tipos de subgêneros diferentes do horror, já que há elementos de filmes de matança, embora ele não seja exatamente um slasher movie, já que contemporâneo a Sexta-Feira 13 - foi lançado em dezembro de 1980, enquanto o slasher saiu em maio - a obra que popularizou os clichês do gênero, copiando claro Halloween: A Noite do Terror - mas também apresenta elementos de exploitations de caipiras macabros, tal qual em O Massacre da Serra Elétrica (e um pouco de Quadrilha dos Sádicos) além de apelar para os clichês de rape and revenge, como foi em Aniversário Macabro ou A Vingança de Jennifer.

O longa estreou em dezembro de 1980 no seu país de origem, mas no Brasil demorou a chegar, sendo lançado apenas em dezembro de 1986.

O longa também é conhecido por ser dirigido por Charles Kaufman, o irmão de Lloyd Kaufman, do estúdio Troma e também por sua estranha premissa. É uma produção independente, um filme B, de sinopse simples, que acompanha a reunião de três amigas, que viajam para o interior para matar as saudades da época em que elas podiam gastar todo o seu tempo juntas, visto que não faziam isso desde a época de escola.

Nessa reunião, o trio acaba encontrando uma família insana, dois filhos brutamontes e esquisitos, além de uma mãe mandona, idosa e sádica. Passa por uma experiência traumática, sádica e torturante, acompanhada de psicopatas que deveriam estar um hospital especializado e não soltos.

Dia das Mães Macabro: O horror materno em um clássico da Troma

Os estúdios por trás do longa foram a Troma Entertainment, a Saga Films e a Duty Productions. Foi distribuído pela United Film Distribution Company (UFDC) em seu país de origem, os Estados Unidos.

O roteiro foi escrito por Kaufman e Warren Leight, produzido pelo próprio Kaufman e por Michael Kravitz e tem como produtor executivo Alexander Beck, Lloyd Kaufman é produtor associado, assim como Michael Herz, que fez Noites Macabras de Nova York 2.

O nome original do filme é Mother's Day, em países latinos era chamado de Sangriento día de las madres. Já no Brasil teve o nome alternativo de Dominados Pelo Ódio, assim como o remake lançado em 2010. Já em Portugal é Dia da Mãe.

O longa teve locações em Winnipeg-Manitoba, no Canadá, com isso, acaba compartilhando muitos locais de filmagem com o clássico Sexta-Feira 13 de Sean S. Cunnighham e com a sua primeira sequência Sexta-Feira 13: Parte 2 de Steve Miner.

O pôster do filme é uma paródia da pintura Arranjo em Cinza e Preto nº1 ou Retrato da mãe do artista (Arrangement in Grey and Black No. 1 ou Portrait of the Artist's Mother), conhecida coloquialmente como Mãe de Whistler de autoria de James McNeill Whistler.

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Kaufman tinha pouca experiência na direção, até 1980 ele conduziu apenas Golpe em Jakarta, participou da equipe de produção de A Primeira Bimbada e O Vingador Tóxico.

Por ser irmão do dono da Troma Lloyd Kaufman, o diretor queria que seu irmão, fizesse uma ponta no filme, já que Lloyd era ator, mas o parente recusou. Essa proximidade foi o fator que fez com que o longa hoje seja veiculado a Troma, uma vez que os estúdios que fizeram ele, Duty Productions e Saga Films faliram.

Leight trabalhou em poucos filmes. Ficaria famoso por trabalhar em séries policias como Lei & Ordem: Crimes Premeditados e Chicago P.D: Distrito 21. Virou produtor executivo, inclusive dessa versão de Law and Order, também nos programas Em Terapia e Lights Out, além de Lei & Ordem: Unidade de Vítima Especiais. Beck fez Sangue de Caçador e GameStar: Die Redaktion.

O longa foi bastante achincalhado por parte da crítica, está na lista dos mais odiados do famoso crítico Roger Ebert.

O longa foi lançado sem classificação indicativa, provavelmente graças a uma manobra do diretor, que buscou evitar o estigma associado à classificação X.

O órgão responsável por classificar essas obras, a MPAA, nunca exibiu o filme, simplesmente por conta dos produtores não terem enviado o filme, já não queriam gastar nenhum de seus limitados recursos no processo de revisão de regras de exibição.

Ele não é exatamente um video nasty, mas teve proibição no Reino Unido, BBFC (British Board of Film Classification) em 1980. Permaneceu proibido no Reino Unido até 2015, quando foi lançado sem cortes com certificado para maiores de 18 anos.

A trama começa em uma estranha reunião de cunho otimista, uma palestra em ritmo de autoajuda, na Growth Opportunity (uma paródia do Erhard Seminars Training) ministrada por Ernie, personagem de Bobby Collins, que na época assinava Robert Collins.

Em meio a plateia, populares falam que sua mãe deve se orgulhar dele, mas Ernie dá de ombros.

Depois disso, o casal Charlie (Stanley Knapp) e Terry (Luisa Marcella) pegam uma carona com uma idosa, feita por Beatrice Pons ou Rose Pons. Aparentemente eles iriam fazer algum mal com a senhora, provavelmente a assaltariam, jogando-a na estrada, mas eles não tiveram tempo para isso.

Como o filme tem reviravoltas praticamente desde o início, avisamos que haverá spoilers.

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Fica a impressão de que eles vão fazer mal a ela, mas obviamente isso não ocorre. O carro enguiça e senhora sai, para arrumar o motor. Mais do que do repente entra em cena um facão, grande como uma peixeira, pela janela aberta do banco de trás e decapita Charlie de uma vez.

Logo se aproximam dois homens sujos e malvestidos atacam a moça, um deles até faz menção de estuprar a menina, mas o outro impede.

Eles são Ike, de Gary Pollard (creditado como Holden McGuire) um homem grande, brucutu, que parece ser demente, enquanto o menor e mais esperto Addley, de Michael McCleery (que assina Billy Ray McQuade) o auxilia, de maneira igualmente certeira e violenta. Eles são, obviamente, os filhos da personagem que dirigia o carro.

Depois desse preâmbulo, a trama vai até Beverly Hills, em uma festa que tenta parecer cara, mas que é visualmente óbvia. Aparecem o trio formado pela dona da festa Trina feita por Tiana Pierce, por Abbey interpretada por Nancy Hendrickson e Jackie de Deborah Luce.

Nesse local há gente agindo de maneira bastante despreocupada, bebendo e usando cocaína sem qual pudor. Não à toa haviam tantos boatos sobre não buscar classificação indicativa ao filme. O grosso dos convidados da festa de Trina eram membros da produção, assim como na cena da palestra lá atrás.

Ainda há participações especiais da família Kaufman, como o homem que cheira cocaína na mesa festa, que é o pai do diretor, além de aparecer a mãe do cineasta, como a mulher que levou um cachorro para a festa.

O roteiro é sem grandes propósitos de discussão, depois da sequência inicial gráfica demora a ocorrer algo de novo. Ele fica um bom tempo só mostrando os preparativos da viagem das meninas, com números cômicos bizarros e desnecessários, além de muitos sustos falsos.

Também se gasta tempo com a viagem de carro, das amigas, o tal Rat Pack, que enfim retornam àf convivência, depois da época de escola e da tal festinha.

Durante a viagem, elas lidam com pessoas simples, com lojistas, funcionários assalariados e de baixa renda, entre os residentes da cidade grande e os capiais que habitam a estrada rumo a Deep Barons, que é o destino final do trio de amigas.

Elas gastam o tempo em uma cabana, que fica perto de um belo lago, fumando maconha, assando marshmallows, até armam um piquenique.

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Kaufman organiza mal sua produção, utiliza a trilha de Phil Gallo e Clem Vicari Jr. de maneira atrapalhada, enfia músicas fora de sincronia com as imagens, ainda coloca flashbacks da época de escola de maneira gratuita, com transições bem pobres.

Isso tudo é passável, afinal, além de ser um exploitation barato, um filme B, ainda é uma produção com o selo Troma.

Os irmãos observam as meninas de longe, mas só as pegam depois que se passa mais de meia hora da curta duração do filme. Vale lembrar que a duração desse é menor que 90 minutos, se contar apenas o que é rodado, excluindo os créditos finais, claro.

Logo aparece a casa da família. O lugar é bem estranho, o interior todo pichado, com muitas quinquilharias, até com luzes de natal na escada.

O local que serviu de locação era uma casa real na floresta de Newton, Nova Jersey. Ninguém morou lá por 15 anos antes das filmagens. O antigo dono da casa foi assassinado e havia um boato de um cadáver foi encontrado na casa pouco antes da época de filmagens.

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Do lado de fora o tapete está imundo, mas a senhora faz questão que eles limpem os pés.

Fica claro que eles têm problemas de ordem mental, assim como a parente. Também fica claro o desejo de imitar o esquema de O Massacre da Serra Elétrica.

Eles são pessoas que deveriam estar em sob cuidados médicos especializados, são apresentados de maneira tão diferentes da estética normalista que possuem um cachorro imaginário, chamado Fifi. Visualmente, o pet consiste apenas em uma coleira suspensa.

Os irmãos têm personalidades distintas. Ike é mais grosseiro e atrapalhado, não sabe se expressar bem e é pura força física. Já Addley é mais ágil, parece sofrer de personalidades múltiplas, já que eventualmente usa uma máscara, que o faz parecer (e agir) de maneira mais cruel.

Em algum ponto da trama parece que ele não vilipendia mulheres, mas logo depois essa pecha se contradiz, já que ele arranca a blusa de Jackie a força. Provavelmente havia impedido o irmão de atacar Terry mais por demarcação territorial, para mostrar autoridade sobre o mondrongão como macho alfa que se julga e menos por uma questão ética.

Apesar de bobos, os irmãos têm conversas sobre cultura pop um bocado elaboradas.

A discussão que mais chama atenção é uma fala sobre punk e disco, afirmam que “Punk é uma merda! Disco é estúpido!", que foi uma brincadeira com um debate que estava acontecendo na época, sobre qual estilo musical era melhor ou pior.

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Charles Kaufman disse nos comentários do lançamento em mídia física do filme, que uma atriz se apaixonou por um dos atores que interpretou um dos filhos homicidas. Os dois ensaiaram um possível namoro, mas ele como diretor pediu para que eles adiassem o relacionamento, para evitar a possibilidade de não projetar a sensação de terror necessária.

Eles obedeceram.

Também nesses comentários, Kaufman disse que durante as filmagens Billy Ray McQuade estava com uma ressaca grande, depois de beber bastante na noite anterior. Ele acabou vomitando em Rose Ross e a filmagem foi adiada depois desse incidente.

Outro momento bizarro foi uma sessão de exercícios que os rapazes fizeram, com vários elementos de cenário que não são feitos para malhar, ainda colocaram uma música que imita o hino de treinamento de Rocky: Um Lutador, composto por Bill Conti, com leves diferenças, para evitar processo.

É engraçado como a música de Gallo e Vicari se encaixa na trama, algumas vezes parecendo imitar elementos de um desenho infantil. A maioria dos acertos da trilha são justamente esses, já que a música corta a tensão das sequências de violência crua, tornando-as mais engraçadas do que amedrontadoras.

A cena em que Trina e Abbey encontram o cômodo onde estão os restos mortais de vítimas dessa família é uma boa demonstração disso.

O que esse trecho - que é o mais aterrador do filme - revela é que os vilões são burros e muito mal preparados, tanto que não prendem direito suas vítimas, tampouco dão fim a algumas delas. Deixando todo o trabalho vilanesco pela metade, são desleixados até no momento de espalhar o horror.

Perto do final, a mãe grita, pedindo socorro. Inclusive, acusa Queenie de estar no meio da mata.

Esse é um dos maiores mistérios do filme, já que não há explicação de quem é essa "criatura", a quem defenda que esse seria um filho da senhora psicopata, uma monstruosidade adotada, como provavelmente eram também Ike e Addley, mas ela na verdade é uma pessoa do passado da senhora, sua irmã mais velha, de cabelos longos e hábitos violentos.

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O motivo da "mãe" usar um colar cervical seria uma briga entre ela e Queenie, no passado, que a deixou contundida, por toda a vida. Essa condição seria um dos motivos para demonstra que (provavelmente) a senhora não ser a mãe biológica dos outros vilões, mas isso é apenas sugerido, não explicitado, como foi muito bem explicado e mastigado no remake de 2010.

Há até uma breve aparição de Queenie, na mata, embora não fique claro se foi real ou não, podendo ser apenas um devaneio da parte dos personagens.

É muito estranho que a família possua tantas armadilhas elaboradas, mas não consigam executar bem nenhum dos golpes que propõe.

Ike se arma, usa uma viatura da polícia e farda, só para assustar Abbey, mas é incapaz de abater suas vítimas, nem mesmo quando sua vida depende isso. Aparentemente eles mataram gente de toda estirpe, inclusive autoridades locais, por isso tem souvenirs deles, mas não conseguem dar cabo de três jovens adultas.

Provavelmente a produção tinha acesso a esses figurinos, simplesmente colocaram no filme por achar que causaria impacto. Funcionou.

No final parece que faltou o que filmar, por isso se gasta um tempo grande mostrando as amigas passando pela mata, se sujando com excremento de urso, que só serve para mostrar os efeitos com farinha que a equipe de maquiagem fez - efeito esse que era comestível, diga-se. Era preciso esticar as gravações, para ocupar 90 minutos de duração.

No final as duas sobreviventes carregam o cadáver de uma delas (Jackie), como ela estivesse viva, tudo para que ela "testemunhe" a vingança junto a família psicopata. Pensando em perspectiva, talvez ela de fato tenha sobrevivido, afinal, é um filme de horror B, gente em situação pior sobreviveu antes...

É bizarro, Trina beija a amiga "morta" nos lábios, manda a outra colocar uma faixa na cabeça e as duas ficam agem como versões femininas de Rambo. Elas são muito hábeis, ao menos agem como se fossem, atacam os irmãos sem dó, até enfiam um martelo no meio das pernas de Addley.

A cena é sangrenta, certamente incomodará plateias mais conservadoras e sensíveis. A morte de Ike é ainda mais agressiva, sendo golpeado por uma faca elétrica, depois de ser alvejado com um aparelho de televisão na cabeça, em uma cena bem mais agressiva que a de Stu em Pânico, já que ele leva um choque dela.

Dia das Mães Macabro é uma trasheira cheia de tolices, tem atuações caricatas e mortes muito violentas, além de uma estranha surpresa no final. Sendo assim, é tudo que um fã de filme B pode querer, uma divertida exploração de clichês, que soa charmosa justamente pela tolice de sua premissa.

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