Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981

Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981Dia dos Namorados Macabro é uma produção canadense de horror que surfou na esteira dos Filmes de Matança e Slasher, e que apesar dessas influências, tinha identidade e marcas próprias. Dirigido por George Mlhalka, a produção mira no feriado de São Valentim em 14 de fevereiro o seu drama, tornando a data em um evento sangrento e repleto de mortes.

Querendo aproveitar a onda de filmes em datas festivas, os produtores John Dunning e André Link procuraram gente capaz de produzir algo violento e agressivo na data do dia dos namorados, para coincidir com as festividades tanto no Canadá quanto nos Estados Unidos.

Para isso, pegaram o argumento de Stephen A. Miller (que também produziu o longa), deram para o roteirista John Beaird - de Feliz Aniversário Para Mim (não creditado, diga-se) e Trapped - tratar o texto, e contrataram Mihalka para conduzir esse longa, que foi distribuído pela Paramount Pictures.

Infelizmente o filme não foi um sucesso comercial, muito também por conta dos cortes que rolaram por conta da MPAA- Motion Picture Association, fato que fez a duração diminuir em quase nove minutos pelo que se diz a época.

As cenas mais violentas ficaram perdidas por muito tempo, até que a Lionsgate comprou os direitos para fazer um remake em 2009, intitulado Dia dos Namorados Macabro 3D. Dessa forma as duas versões ganharam suas versões sem cortes, com os momentos mais agressivos sendo reeditados para o lançamento em home video.

Apesar de imitar elementos dos mitos de Michael Myers de Halloween, Pamela Vorhess de Sexta-Feira 13 e principalmente os vilões mascarados dos Giallo, há um cuidado maior dessa produção na crueldade do seu assassino, possivelmente até influenciando Jason nas suas versões das sequências de Sexta-Feira 13.

Toda a matança que ocorre só faz sentido por conta da localização genérica da história, em um lugarzinho isolado, que poderia facilmente ser uma cidade do interior dos Estados Unidos, Canadá ou qualquer outro país de língua inglesa.

O município de Valentines Bluff vive do extrativismo mineral, em especial graças a mina Hanniger, que serve como principal fonte de trabalho e empregos da cidadezinha.

O que se percebe é que havia uma tradição secular ali, de comemorar o dia de São Valentim com pompa e circunstância, festividade que além de ser romântica, também fazia a cidade se reunir em peso. Desde os anos 1960 isso não ocorria, graças a tragédia envolvendo Harry Warden.

Warden, interpretado por Peter Cowper, foi um minerador que ficou preso na minha Hanniger, no ano de 1960. Os supervisores tiveram pressa em sair justamente em 14 de fevereiro, e deixaram ele e mais alguns colegas na parte baixa da mina. Um vazamento de metano fez uma explosão ocorrer, soterrando a todos.

Somente Harry sobreviveu, a troca de sua insanidade. Para não morrer de inanição ele se alimentou dos restos mortais de seus companheiros, e saiu de lá com a mente completamente deturpada, principalmente graças ao fato de ter se rendido ao canibalismo.

Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981

No ano seguinte, na época do dia do santo, resolveram fazer uma outra festa, e Harry se vingou dos supervisores, matando-os de forma brutal, vestido como minerador, arrancando deles seus corações, pondo eles em caixas de bombom.

A cidade entendeu o recado, e parou de comemorar a data que provocou no sujeito essa lembrança torpe, e mesmo com Harry em uma instituição psiquiátrica, os meses de fevereiro seguiram sem festas.

Eis que já na atualidade, na década de 1980, um casal vai fazer sexo na parte baixa da mina e vestidos a caráter, mas antes que o homem pudesse usufruir da personagem interpretada pela bela Pat Hemingway, o seio da mesma é atravessado por uma picareta pendurada, justamente em uma tatuagem de coração que ela carregava no seio esquerdo.

Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981

Daqui se percebem alguns mistérios. Quem era ela? Por qual motivo ela não sente frio, já que todas as pessoas que descem ou estão vestidas com roupa de frio, ou levam cobertores? Por que ela morreu se não teve festa? Nada disso é respondido, e essa parece ser só mais uma cena de introdução sobre filmes de assassinos que não tem sentido, como dezenas de Giallo.

Um dos motivos para essa introdução estranha ter ocorrido são as intenções de Mabel, uma senhorinha interpretada por Patricia Hamilton, que em um grande ato de ingenuidade, idealiza o retorno as comemorações.

Sendo a história de Warden uma lenda urbana ou não, os preparativos causam revolta em alguém, e os homicídios voltam a ocorrer antes do fatídico sábado 14, fazendo daquela sexta-feira 13 de véspera, um dia de matança.

O prefeito Hanniger de Larry Reynolds, dono da mina e pai de um dos protagonistas, decide então proibir as festividades. A autoridade recebe o apoio de outras pessoas mais velhas e que testemunharam o massacre décadas atrás, como o bartender Happy (Jack Van Evera), sujeito que propaga o receio geral por esse retorno as festas, e que acaba caindo no clichê do idoso maluco e alarmista, tal qual o Crazy Ralph da saga Jason.

No arco dos personagens mais jovens, o foco é todo dado a TJ Hanniger, o futuro herdeiro das minas interpretado pelo inexpressivo Paul Kelman. Ele é apresentado como um alguém melancólico, que ficou bons anos fora da cidade e retornou para trabalhar.

Ao chegar ele percebe que sua ex-namorada, Sarah (Lori Hallier) está com Axel, seu melhor amigo, interpretado por Neil Affleck. Toda essa construção faz dele o perfeito candidato para a suspeição, ainda mais depois que ele sugere fazer uma festa clandestina nos subterrâneos da mina de seu pai.

Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981

Aqui se percebe uma diferença bem grande da maioria dos filmes de matança e slasher: o elenco é formado por jovens adultos, por gente que trabalha, e não por adolescentes desocupados.

Isso dá um senso maior de urgência, e ajuda a justificar a vontade das pessoas de brincar e festejar, já que o trabalho de mineração é árduo, duro e chato. Mas segue não explicando porque pessoas já de idade achariam boa a ideia de festejar em uma mina, ainda mais depois das mortes dos idosos na sexta-feira.

As cenas de violência são limitadas, como dito antes, e no release UNCUT há uma queda na qualidade da película. Isso ajuda a dar a obra um aspecto de evento proibido e escondido, sem falar que houve uma boa escolha, de mudar a cor do aspecto geral no exato momento em que as mortes ocorrem.

Isso deixa o público mais ligado e apreensivo, como se a ação do assassino fosse tão agressiva que transforma o local e os eventos em volta. Nessa outra versão o filme possui 93 minutos, três a mais que a vista nos cinemas, mas nem todas as cenas foram resgatadas.

A cena onde um casal é cortado por uma ferramenta de perfuração está perdida até hoje, e o que restou é a momento onde um dos personagens, Hollis, encontra os amigos já mortos, fato que tem seu impacto visual considerável, ou seja, a sequência em si não fez tanta falta.

Outra questão é que o assassino mata quem ele quer, não necessariamente quem transa. Mabel mesmo, parece ser morta unicamente por fazer parte da organização da festinha.

A cena em que o cadáver dela aparece é bem-feita, tem um belo trabalho de maquiagem especial de John Logan, experiente artista que fez Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida (1991) e O Sombra (1994). O manequim é bastante realista, e imita maravilhosamente a condição de decomposição de um cadáver encontrado muito tempo depois do óbito.

Também uma boa construção de naturalidade, os personagens não são caricatos, são gente comum, fora um sujeito piadista meio tosco.

Outra boa cena é o momento sangrento, onde o assassino arranca um olho de Happy com uma picareta, que resulta em um trabalho primoroso dos designers de arte de Thomas R. Burman, Ken Diaz e Tom Hoerber. Tentaram em vão replicar esse mesmo trecho na refilmagem, mas o uso largo do CGI tirou toda a força da cena.

O texto é cruel, seguindo o número de mortes de gente que claramente não quis fazer mal algum, em especial, o chefe de polícia Newby, outro personagem mais velho, interpretado por Don Francks, que recebe um forte golpe, mas não fisicamente, e sim no emocional.

Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981

Na delegacia, sem perigo de ser encontrado, ele ganha uma caixa de chocolates. A princípio ele pensa que pode ter um coração lá dentro, mas não, eram apenas bombons, que vinham com uma cartinha carinhosa, da recém morta Mabel.

Ela só queria voltar a comemorar o dia de Valentim para cortejar o velho amigo, e a mudez que segue após a percepção do mesmo é bastante sentida.

Isso lembra outro bom aspecto, que é o silêncio. A falta de som é um artifício bem trabalhado aqui e permite ao espectador se entreter com a expectativa das mortes, que vão se avolumando e não com sustos baratos.

Outro aspecto considerável é o cenário de terror. A mina de fato existe, e ajuda a tornar essa produção singular, tornando o palco numa plataforma única, onde os assassinatos funcionam como o ponto de partida dos terrores de não existir mais justamente em uma data de pleno romantismo.

A morte de Hollis (Keit Knight) assusta, com pregos saindo de uma pistola e atingindo a sua cabeça. Sua perda é bastante sentida, uma vez que a introdução do personagem é bem-feita, com ele sendo o sujeito simpático e que funcionava claramente como a liderança dos mineradores, tanto que é ele quem segura TJ e Axel quando eles começam a brigar.

O filme ainda tempera seu personagem colocando ele fora do padrão de beleza vigente, uma vez que ele era gordinho, e mesmo não sendo o suprassumo da macheza, era respeitado por todas as partes do triangulo amoroso central e pelos outros personagens que orbitavam sua presença.

O momento chocante sobre o assassino é a evidência de que ele tem poderes mágicos, já que consegue cometer homicídio, sair, se trocar e aparecer muito rápido, e ainda em um ambiente escuro e insalubre. Tirando essa forçada de barra, a produção segue bem.

Um bom ponto é o ritmo. Quase não se nota o tempo passando, já que a formula e abordagem tem como primazia o dinamismo e o desespero. O cenário fechado contribui para isso, fato que impossibilita uma fuga fácil dos personagens, assim também como o aumento do número de corpos, que preenche os poucos espaços vazios dos sobreviventes.

O visual do assassino é muito bom. A roupa escura e a máscara de gás fazem com que o sujeito consiga não ser notado como um estranho na cidade, assim como o aproxima dos vilões mascarados dos giallo, sem falar que a picareta ajuda a compor uma caracterização única e mega violenta para ele.

Dia dos Namorados Macabro: o bom e subestimado slasher canadense de 1981

Próximo do final as batalhas ficam mais desesperadoras. O conflito nos trilhos, entre os carrinhos do trem é bastante emocionante, quase tão chocante quanto a exposição dos fatos e a resolução quanto a identidade do assassino.

A construção de Warden como o causador do trauma em Axel não era evidente até então. Faltou um trabalho melhor em deixar pistas, mas ainda assim apela para um clichê do cinema de horror que é bem explorado, no caso, a Síndrome de Estocolmo, que afeta o rapaz.

Axel quer ser Warden, o vê como um igual, mesmo que ele tenha matado o seu pai, que foi um dos supervisores que abandonaram Harry. O fechamento referenciando Prelúdio Para Matar de Dario Argento casa muito bem, e mostra que os roteiristas e diretor sabiam o que estavam fazendo.

Há um gancho no final, que aliás é ótimo e desesperador, com Axel enlouquecendo, falando coisas sem sentido, convocando Harry para ficar consigo, depois que ele corta a própria mão, para "presentear" a sua amada, que mesmo quase sendo morta por ele, segue o amando, em outra demonstração do complexo de Estocolmo.

Os créditos finais ainda tocam The Ballad Of Harry Warden , canção do artista Paul Zaza, que tem letra e narra as desventuras de Warden. Como o filme não foi um sucesso, jamais ocorreu uma sequência.

O produtor John Dunning afirma que tinha um roteiro pronto para ser uma parte dois, e ele queria lançar isso nos anos 2000, inclusive com o retorno do elenco e de Mihalka, mas o projeto teria sido comprado basicamente para engavetar o script, a fim de fazer o remake, daí o projeto jamais saiu do papel.

Dia dos Namorados Macabro é um ótimo slasher, não é tão apegado aos clichês e foi resgatado de forma justa por parte dos fãs do gênero. É certeiro, sangrento em sua versão sem cortes e com qualidades indiscutivelmente palpáveis.

Avatar

Comente pelo Facebook

Comentários

Comente pelo Facebook

Comentários

Deixe uma resposta